Pensando comigo naquilo que me faz sentido. Como é complicado fazer escolhas; como é difícil saber se escolhemos o ideal e adequado para o momento. Como se torna conflitante ter que optar entre o este e o aquele; avaliar todos os elementos que cercam a situação e focar na melhor proposta parece ser uma tarefa gigantesca. E depois, quando tudo se define, toma um rumo de tranquilidade e total nonsense; como se não tivesse tirado o sono nem molestado o estado de humor. Escolhas…ah, as escolhas. E com elas, as circunstâncias!


Equipe preparada, time bem treinado, maduro, alto, rápido, muito tático, várias jogadas ensaiadas, fintas impecáveis e atletas bem lúcidos e responsáveis de seus papéis. Adversários nem sempre fortes ou à altura, em termos técnicos-táticos, mas adversários e com estes não se pode vacilar.

Geralmente nossos confrontos não duravam mais do que os três sets obrigatórios pela Federação Paulista de Voleibol. Conseguíamos passar pelos adversários com bastante velocidade e uma imposição de jogadas táticas e agressivas, que tiravam o sossego de técnicos e atletas oponentes. Na época éramos esperados pelo show que empreendíamos em quadra, atraindo a curiosidade das torcidas, pelo fato dos atletas serem novos, muito altos, muito velozes e com uma inteligência de jogo a toda prova.

Eles treinavam quatro vezes por semana e os treinamentos eram de muita agilidade e segurança. Desta forma, aliado a juventude e precisão, eram atletas preparados para o alto desempenho e atendiam àquilo que o Voleibol moderno já estava vivendo. Os adversários ainda usavam treinamento com bolas paradas, sem deslocamentos pela quadra, batendo bolas em paredões e demais coisas de séculos passados.

Nunca olhávamos nossos adversários de cima para baixo: respeito a dignidade era uma lição que eu repetia diariamente. Ensinava aos meus atletas que devemos ter atenção e respeito aos atletas que se posicionavam do ouro lado da rede, sempre, em situações favoráveis e desfavoráveis, mas que precisávamos cultivar em nós o respeito pelo vencido. Ele também tinha seus méritos, fossem os méritos que fossem. E assim, éramos respeitados e admirados; pela competência e pelo tratamento humano dado aos adversários.

Onde entra a escolha? Em dois momentos deste mesmo fato: alguns técnicos, da época, me criticaram porque eu escolhi fazer dos meus atletas homens. E eles entendiam que atletas são atletas e ponto final. Educar seria outro departamento. Mas aquela era e é minha escolha.

Outro momento era o que ensinava a não massacrar, mas permitir que o adversário fraco jogasse. Isso possibilitava dar volume de jogo e garantir um nível de amistosidade favorável ao desempenho de todos, sem, contudo facilitar o jogo; também discutível porque o espetáculo era o fato de deixar o adversário no zero, sem respirar, sem defesa, humilhado. Nunca concordei com tal atitude e sempre fui partidário de abrir possibilidades em jogos. Esta escolha me causou muitos dissabores, junto aos meus superiores, mas mantive-a até minha saída do esporte competitivo.


Numa sala de aula temos uma diversidade humana que imprime um clima de convivência nem sempre tão pacífica como dizem os manuais de pedagogia. Em primeiro lugar porque tais manuais são escritos para professores que darão aulas para pedras ou paredes. Alunos são vivos, são dinâmicos, têm emoções e sentimentos, têm inquietudes e querem mais. Os manuais não conseguem prever isto: acreditam que os alunos estejam sentados nas carteiras, acumulando conhecimentos.

Diante de uma sala qualquer, minha proposta é atender a todos, indistintamente, em especial aos menos privilegiados, aos mais perdidos, aos mais falantes e inquietos. Estes precisam de um olhar diferenciado e acolhedor, vai que ali existe um gênio revolto!!!

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Com esta escolha bem delimitada, atraio para perto de mim aqueles que se sentem excluídos dos demais olhares e dos demais zelos, ainda que todos os colegas digam que não fazem distinção entre seus alunos. Que todos são iguais (e ai começa o exercício da não democracia, pois não somos iguais). E optar por estes, diante de uma comunidade fechada a diálogos, é abrir fogo contra um exercito bem municiado.

Sabendo por onde caminho e caminhava (e caminharei sempre) mantive meus olhares ao todo, valorizando a parte menos querida e menos valorizada. Em troca, os avanços e as vitórias eram questão de tempo: muitos trabalhos apresentados em grandes congressos, muitos artigos bem elaborados e associação aos laboratórios acadêmicos respondiam-me que a escolha feita havia sido a melhor e que muitos seriam valorizados pela pequena atenção a mais que receberam.

Quando me perguntam porque prefiro trabalhar com alunos rebeldes, não sei ao certo a resposta, mas posso até entender que a identificação com eles é grande: também fui e sou rebelde no ato criador. Não acredito nos limites e não permito a intolerância, levando-me a ter olhares múltiplos e fala polifônica diante daquele que não olha como eu nem fala como eu; ser diferente é um dom que deve ser privilegiado.

Esta escolha sempre me leva a sair da mesmice, no ato didático. O diferente, o novo, o inusitado é um desafio a ser enfrentado e necessita apenas de ser notado e valorizado. Tal escolha faz com que eu seja obrigado a ser um diferente em cada dia; um curioso, um pesquisador, um desafiador, um inquieto e isso me dá estímulos para voltar a sala de aula, amanhã e depois e depois e depois. que venham os baderneiros e os sem estímulos e que venham com vontade porque serão minhas escolhas.

Juntos construiremos alianças de modo a demonstrar o valor e a fortaleza de nossas escolhas; tenho colhido, junto aos meus alunos diferentes, muitas vitórias e sucessos, porque eles são fantásticos e promissores. A diferença deles imprime mais cores ao meu Mundo.


Existem pessoas que são definitivamente do mal. Não conseguem ver alguém feliz e não permitem que outros estejam realizando seus sonhos; isso é muito nítido quando comento que estou terminando minha graduação em Psicologia e que em breve serei psicólogo. Ouvir isso causa espanto, em primeira reação, e indignação no resto do tempo. Já ouvi de amigos que fulano comentou e riu da minha escolha, nesta etapa de minha Vida. Riu de mim, o infeliz.

Mas escolhi a Psicologia muito antes, só não havia me predisposto a arrumar tempo para cursá-la. Acredito mesmo que sempre busquei esta formação, mas os desafios de abraçá-la foram potencializados quando percebi o benefício que Marcia Severo, minha terapeuta de Rio Claro, tinha me possibilitado: a autodescoberta foi a senha para me empenhar em saber mais.

Também me surpreende conviver com meus amigos de classe, em especial pela idade e pelos objetivos, tão diferentes. Acho estranho sonhar com sonhos semelhantes aos de jovens de dezoito ou vinte anos, tanto quanto dialogar com pessoas que leram apenas o “Pequeno Príncipe” ou assistiram “A Pequena Sereia”. Esta falta de identidade entre eu e eles faz com que eu me reveja e me reedite, pois são Mundos e Vidas ímpares que precisam ser respeitadas em seus contextos.

Minha escolha ainda me coloca diante de meus professores, alguns ex-alunos de pré-escola ou de magistério, mas que respeito no papel que vivo: ali sou aluno e eles são professores. E basta. São eles que devem e precisam me ensinar e me mostrar o caminho impresso naquela disciplina. O passado é uma referência sociocultural e humana que ambos percebemos e valorizamos. O aqui e o agora garante outra relação: eles ensinam e eu aprendo.

Nesta minha escolha eu tive muita cautela no momento da matrícula, visto escolher uma faculdade no meu bairro, próxima a minha casa: isso garantia uma certa zona de conforto, na pior das propostas. Mas, ao iniciarem-se as aulas, deparei-me com conteúdos desconhecidos, técnicas pedagógicas que não concordo, sermões que abomino, descasos que odeio. Mas era a escolha. Deveria buscar saídas e propostas que me fizessem reposicionar frente ao inesperado.

E fui andando, acelerado, da minha maneira de andar. Perdi minha mãe no primeiro bimestre do caminho, enfrentei um grave problema de saúde, no quarto bimestre, tive alguns embates com colegas, professores, coordenadores, supervisores, aprendi muito com isso tudo e cresci. Cresci ao ponto de estar quase concluindo minha formação na escolha que tanto assusta ao que sonha pequeno.

Eu estou feliz. Realizado por chegar onde cheguei. Arrependo-me por haver demorado a escolher a Psicologia como área de formação, mas acredito ter sido necessário este amadurecimento para optar e tocar adiante o projeto de Vida que hoje se levanta e que será abraçado. Na faculdade encontrei outros e novos amigos, pessoas diferentes das que eu já conhecia, Vidas distantes da minha mas que hoje se cruzam sem estranhamentos.

Nesta escolha pude ver o quanto já era psicólogo sem saber e o quanto havia de Mundo e de Vida para desbravar, além daqueles muros que eu conhecia das etapas anteriores. Esta escolha me trouxe os pés no chão e me facilitou a tomar outras escolhas e a seguir por caminhos que so conhecia de leitura. Foi para mudar o rumo da Vida. Escolha abençoada.


As vezes me perguntam: é aquela lá? É com aquela que você vai se acasalar? Eu olho, penso, rumino e quase respondo que não me acasalo porque não sou urso; mas por que dar importância ao sem importância? Afinal, acordo às cinco horas da madrugada para ir à UNESP e ninguém me pergunta se quero ir, ou se preciso de companhia para ir. E vou diariamente, sozinho, e volto para assistir minha aula, à noite, sem uma falta sequer.

Aqui está outra escolha: manter a Vida tal qual ela se apresenta. Questionaram-me da minha irmã negra. Mas questionaram-me velada e discretamente, em insinuações do tipo “como assim, sua irmã”; não fui adiante nem esbocei resposta, somente porque para mim é minha irmã e não tenho que explicar isto ou aquilo, visto que quem a ama sou eu e quem a considera e preza sou eu. Simples, objetivo e direto assim. Eu a escolhi e eu assumi minha escolha, sem pestanejar, desde meus quinze anos. E somos tão felizes, conversamos muito, abraçamo-nos, beijamo-nos, rezamos, confidenciamos, um branco e uma negra. Escolhidos entre si. O poder da escolha, não é.

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Mas querem saber se eu vou me casar. Só rindo porque se eu soubesse onde irei amanhã já ficaria mais sossegado. Como não sei, vivo o hoje. Se vou casar? E eu estou preocupado com este casamento? Já tenho outros, fiz outras escolhas: optei pela vida acadêmica aos vinte e três anos, mesmo sabendo que as coisas não eram excludentes, mas a escolha foi pela carreira meteórica e o intento era chegar num nível de graduação acadêmica alto, ainda novo. Escolha atingida. Com muita gratidão e reconhecimento àqueles que estiveram ao meu lado, sempre.

Neste aspecto da Vida, qualquer vacilo é suficiente para ser deixado de lado e perder espaços, portanto cada detalhe escolhido deve ser muito bem alicerçado e calibrado com as necessidades da época. Tive grandes mestres e amigos que me auxiliaram nas escolhas temáticas, nos projetos a serem desenvolvidos, aos temas a que me submeteria a falar, às agremiações a que me filiaria. Não posso dizer que passei reto e livre, pois tive muitos enroscos, muitos vacilos, mas consegui me equilibrar e abrir campo diferenciado de pesquisa: o desenvolvimento humano e as tecnologias foram adequadamente escolhidos para dar sustentação à Psicologia do Esporte presente no LEPESPE (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP).

Mas sobre o casamento? Poxa, estou bem casado comigo e com minhas escolhas, para que mais? E se tiver que escolher entre uma pessoa e a profissão, nesta altura da Vida, fico com a profissão. Foi uma escolha consciente e bem definida. Sou muito feliz com esta união estável, já tenho frutos e meus padrinhos continuam me acompanhando.

Mas, cabe uma pergunta: você que é tão preocupado com as escolhas alheias, como tem se resolvido com suas escolhas? Tem dado mais atenção a si do que com as escolhas dos amigos ou tem invejado o avanço dos outros? Analise e decida, sempre é tempo de uma escolha radical. (foto acima: psicobservatorio.wordpress.com)

 

CIRCUNSTÂNCIASAFONSO ANTONIO MACHADO

Docente e coordenador do PPG- Desenvolvimento Humano e Tecnologias da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduando em Psicologia.