O projeto Sorrisoterapia de extensão universitária criado em 2016 na Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ) conta hoje com 120 participantes voluntários e realiza visitas diárias (segunda a sexta-feira) ao Hospital Universitário da Faculdade de Medicina de Jundiaí (HU) e, eventualmente, em instituições da cidade que atendem crianças, jovens e adultos que considerem a atuação do Projeto como benéfica.
Para os alunos que cuidam da organização neste ano, participar do projeto significa dedicar um tempo para colocar um nariz vermelho e se tornar o palhaço que o dia a dia não permite que você seja. Permite entrar em quartos de pessoas desconhecidas e com um simples sorriso ser o carinho e o conforto que ela precisa.
O Jundiaí Agora entrevistou a equipe de Gestão da Sorrisoterapia, formada por Brunna Saragiotto, Camila de Freitas, Júlia Riccetto, Larissa Filier, Melina Di Trani e Thaís Kojima:
Como surgiu este projeto?
O projeto é recente, fundado em 2016, pela gestão do Diretório Acadêmico e Liga da Alegria. Passou a ser um projeto de extensão para que os alunos pudessem ter um melhor aproveitamento, com mais autonomia, bem como obrigatoriedade nas atividades.
Acreditamos que o projeto seja resultado de uma concordância sobre o que a carreira médica vem se tornando de uns anos para cá, focada no diagnóstico, exames, computadores, tecnologia e pouco vínculo, empatia e solidariedade com os pacientes.
O projeto, portanto, surge para restaurar a atenção e o olhar respeitoso ao paciente e a sua situação clínica, estimulando a autocrítica e a reflexão dos alunos sobre qual tipo de médico eles gostariam de ser, além de serem atendidos.
Tem algo a ver com o Dr. Patch Adams?
Sim, a filosofia empreendida por um dos médicos pediatras mais famosos do mundo compactua inteiramente com o pilar inicial do projeto, que é a construção de uma medicina mais humanizada e focada no paciente e não apenas na doença que ele apresenta. A reflexão feita por ele influencia diretamente nas ações dos palhaços, que durante a visita, esquecem seus problemas, vivências e vida acadêmica fora do hospital e incorporam um personagem, que está ali com objetivo de trazer alegria e afeto aos pacientes acamados dos hospitais ou em situações de complexidade social, psicológica e afetiva, como também para seus acompanhantes e familiares, que muitas vezes precisam de um pouco de carinho e atenção. A partir dessas ações, os alunos conseguem incorporar ações mais solidárias e respeitosas durante o atendimento a um paciente.
O dito popular afirma: “Rir é o melhor remédio”. É possível mensurar isso?
Sim, existe um embasamento científico por trás de nossas ações. Nossas visitas trazem riso, alegria, momentos de descontração e esquecimento dos problemas ali vivenciados, mesmo que por um curto período de tempo. Pesquisas afirmam que a resposta terapêutica dos pacientes hospitalizados melhora significativamente, dando um propósito importantíssimo de nossas ações. Podemos até afirmar que não só trazem melhora física, como também numa melhora psicológica o que os ajuda a enfrentar a vivência no hospital, muitas vezes difíceis.
A maioria dos pacientes diz que os médicos mal olham para eles. Qual a dificuldade que o profissional de medicina tem de ser mais humano? Porque ao invés de ser Patch Adams ele é mais Dr. House?
A dificuldade está no cotidiano médico e a frieza que por vezes é exigida, durante a graduação. São tantos casos e vidas diferentes, mas ao mesmo tempo patologias que se encaixam, que o profissional médico passa a colocar a vida profissional como uma rotina, tanto para não se afetar com os problemas vivenciados, quanto pela exigência da rapidez e agilidade médica. Somos colocados desde o primeiro ano frente a doenças que muitas vezes são estudadas como algo isolado, e não como uma característica/condição de um ser humano.
O projeto tem como propósito descaracterizar tal fenômeno, com o ideal de formar médicos mais atenciosos, comunicativos e empáticos, colocando a pessoa que está por trás da doença antes de tudo. Atuando como palhaços, nos mais diferentes casos, possibilita ao nosso futuro médico se colocar no lugar do paciente e ter assim, um olhar diferente para ele, com mais carinho e empatia.
Hoje vocês fazem parte de um projeto. Quando forem médicos, como pretendem levar essa experiência para seus consultórios, para seus pacientes?
Pretendemos implementar todos os ensinamentos que o projeto nos permite entrar em contato, nos diferenciando e levando sempre a frente o cuidado e a atenção médica aos pacientes, de uma forma menos padronizada e hierárquica, mais tranquila e sem uma postura autoritária, e sim, empática. Saber quando o paciente precisa ser ouvido, entendendo melhor o que significa para ele estar em um consultório/hospital, estar com uma doença e também o que o profissional pode fazer para ajudar nesses momentos.
Depois de enfrentar tantos casos com palhaçadas e risadas, sozinhos, em casa, nos alojamentos, chega a bater uma agonia por saber que muitos dos pacientes não sobreviverão?
Existem dois lados do moeda. Alguns palhaços, após as visitas, dizem que estão cansados e tocados pelos pacientes visitados; outros citam uma alegria frente a tanta diferença feita na vida das pessoas. No entanto, não se pode desconsiderar o fato de que ambos os lados se realizam durante as ações do projeto, com uma sensação de “quero mais”. Alguns casos são extremamente difíceis e trazem bastante infelicidade ao paciente e familiares.
Nós conseguimos identificar essas situações e sabemos da gravidade da condição. No entanto, tudo se desfaz a partir do momento que alcançamos o nosso maior objetivo, que é tirar do paciente, aquilo que ele mais precisa e que por sua situação, acaba esquecendo e guardando dentro de uma gaveta: o riso. O riso, tanto a gargalhada, quanto o simples levantar lateral dos lábios ou o brilho dos olhos, são as coisas que nós, voluntários, acabamos por levar da visita. Já dizia Antoine de Saint-Exupéry, autor de O Pequeno Príncipe: “Todas as pessoas grandes foram um dia crianças, mas poucas se lembram disso”. Mesmo que por 15 minutos, tentamos restaurar a criança interior de cada ser humano que conhecemos e nos comunicamos durante o projeto, fazendo valer todo o esforço e dedicação e suplantando tal agonia, que é, nesse pouco tempo, colocada em uma gaveta.
A morte é um fato para todos nós, com certeza não é o que queríamos, porém, nos esforçamos ao máximo para que o últimos dias do paciente sejam menos pesados e mais alegres, não só daquele indivíduo como também de seus amigos e familiares que se encontram no local. É válido lembrar que entramos nos quartos sem ter ideia do que vamos encontrar, saímos do hospital sem saber nenhum diagnóstico.
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Quais as maiores demonstrações de carinho e gratidão que já tiveram?
São inúmeras as histórias que temos para contar, pois toda visita é gratificante e podemos perceber isso sem o paciente precisar verbalizar. Um abraço aconchegante, uma risada pura e verdadeira, meio enferrujada por não ser aplicada há um bom tempo, um brilho nos olhos, uma movimentação e mudança de postura já são grandes demonstrações de carinho e da gratidão, que é com certeza, muito maior da nossa parte.
Às vezes, o carinho e a sintonia são tão grandes, que a visita de um paciente dura mais de uma hora, sem nem mesmo percebermos, acompanhada de cantoria, brincadeiras, risadas, papo jogado fora, entre outras pequenas coisas, que fazem toda a diferença no dia daquele paciente. É extremamente gratificante quando chegamos no quarto e a família e a criança se lembram de nós e só com a nossa chegada o dia delas, a partir dali, já está diferente.
Nos recebem com sorriso no rosto, fotos e muitas vezes um abraço apertado. Uma das maiores gratificações é ver um pai com sorriso no rosto acordando seu filho animado só pela presença de palhaços no quarto. Além disso, é sempre indescritível a sensação de quando pedem para voltarmos!