O outro lado da ESCALADA

ESCALADA

Depois de domingo, quando expus questões íntimas e pessoais de minha trajetória por um dos caminhos da minha vida, fui cobrado por aqueles que mais me conhecem, no sentido de que deixei algo para trás. A primeira resposta foi que não escondi nada, mas que priorizei a trajetória de formação, porém não descartava a proposta de, em mais duas etapas, montar o mosaico que completaria o todo. E farei agora: do outro lado da escalada.

Bem, estudei na PUC e, numa aula de volei, fui chamado fora da sala para conversar com uma pessoa que buscava alguém para trabalhar na região. Sai, para saber do que se tratava e em especial onde seria esta cidade e, de maneira surpreendente, soube que era Jundiaí que buscava um técnico para sua equipe principal. Foi assim que iniciei meu caminho que me levou ao inferno e ao céu, simultaneamente.

Apesar da acolhida pelo professor que me convidou, daqui de Jundiaí, todo o restante do quadro real era muito caótico: uma equipe composta por atletas de nível médio, com jogadores razoavelmente mais velhos que eu, com um passado de resultados bem favoráveis mas um presente pouco produtivo. Eram atletas que compuseram quadros da elite paulista da modalidade, mas que estavam defasados para compor um quadro de respeito, naquele momento. Era por volta dos anos 80.

O grupo de atletas tinha pouco tempo para treinar como devia e alguns deles, pela idade e pelo passado de glórias se tornaram irredutíveis e intolerantes diante de minha liderança, um moleque de 17 anos. E os ataques eram de todos os níveis, vorazes, criando uma atmosfera ruim e um relacionamento sofrível. A cada treino eu me perguntava se teria paciência para mais uma semana de trabalho; minha persistência era reforçada pelo Sidney Neto, o professor que me contatou, porque com ele eu tinha confiança e coragem para falar dos problemas da equipe.

Foram muitos meses de trabalho, muita discussão e muitas derrotas, porque os jogadores eram desrespeitosos e cada jogo tinha briga entre eles. Porém, a medida que avançava no tempo, iniciei um grupo de jovens que começou a despontar e assumir posições titulares na equipe, iniciando o desmanche, com naturalidade e fluidez, como acontece em todas as equipes esportivas. Até que os mais jovens passaram a ocupar as vagas deixadas pelos colegas que, ou não podiam treinar porque não dispunham de tempo ou abandonaram a equipe por outros motivos.

A renovação se fez e se instalou com certa naturalidade, poucos perceberam o avanço e a mídia esportiva sempre questionava a renovação. Aos poucos começamos a sobressair em nossa forte região, sempre tendo Campinas como a maior adversária na modalidade, seguida por Piracicaba e Atibaia. Entretanto meus jovens atletas eram tão impertinentes como eu e, também, acreditavam que poderíamos nos tornar a segunda força da região. Foram precisos pouco tempo e campeonatos para que superássemos Atibaia, depois Piracicaba. Restando Campinas, o terror da região, em todas as modalidades.

Nesta altura já estava em formação minha terceira turma de atletas, criada por meio de outras metodologias e outras perspectivas: já éramos respeitados por onde passávamos. Atraíamos torcida e o corpo de arbitragem da Federação Paulista de Voleibol gostava de arbitrar nossos jogos, porque nossa equipe era muito disciplinada e tinha um arsenal tático bastante dinâmico e moderno. Com estes, chego a dirigir três seleções paulistas e duas brasileiras, juvenis. Mudamos a história e cada treino era muita alegria, muita festa, éramos felizes em nossas funções. E respeitosos, uns com os outros e com nossos adversários.

Fomos embora de Jundiaí, para Rio Claro, quando iniciei meu período na UNESP. Éramos respeitados como uma das forças do interior e a equipe era muito jovem. Morávamos em 16 numa mesma casa, no centro da cidade e voltávamos para Jundiaí aos finais de semana. Lá ficamos, juntos, por seis longos anos e a equipe apenas se desfez porque meu compromisso com eles era que todos deveriam fazer uma boa faculdade, o que aconteceu: temos médicos, engenheiros, arquitetos, físicos, professores formados por boas universidades. O lema: estudar e jogar com seriedade foi seguido e possibilitou a formação de uma amizade que ainda nos aproxima em algumas datas.

Da segunda geração, que substituiu e viveu todo o tsunami inicial, ainda trago grandes amigos com quem tenho bastante contato; Moacir Carlos Regra e José Antonio Pires são dignos de meu respeito eterno, tanto pelo carinho com que nos vinculamos como pelo serviço que prestaram ao município. O mesmo afirmo com relação a Fernando Cesar Gouvea, fiel atleta e amigo, que me abria os olhos quando eu me negava a enxergar alguns cadafalsos e abismos que cercavam cada evento esportivo. Com o Fernando eu quero escrever um livro que terá o nome de “Livro Negro do Voleibol Masculino Competitivo de Jundiaí”. Tenho anotações e fotos e depoimentos que darão a ligação entre os fatos; talvez será um ‘lava alma’, diante de tantas inverdades e maldades arquitetadas, que conseguíamos desarticular. Acredito que faremos surpresa e sucesso, pois muitos detalhes apontam para um mundo perverso e absurdo, ainda a ser desvelado.

Mas estou num outro momento de minha vida. Na verdade, depois de receber todos os títulos, de haver conseguido ganhar todos os campeonatos que participávamos, deixei o Voleibol optando pela paz. O ambiente esportivo não é lá aquele paraíso que alguns dizem existir, ao contrário: é um cenário onde os tapetes ainda voam, como nos contos de infância e para se manter em pé é preciso um malabarismo politico a que nunca me sujeitei; nunca pensei que para ser técnico da equipe principal era preciso ser amigo deste ou daquele e que para sua equipe ter alguns privilégios merecidos era necessário abraçar o Satanás. Não, descobri que não precisava disso e sai de cena.

Eu me exonerei do cargo em que era concursado em nossa Prefeitura e, alguns anos depois me exonerei da faculdade onde dei aulas por longos 33 anos. Aqui, nesse espaço de tempo, cabe outro livro, com outro nome igualmente sugestivo. Por esta faculdade mantive uma passionalidade que não me deixava enxergar muita coisa. Entretanto tudo pode ser mudado, quando se tem em meta que é preciso desapegar para se transformar e, assim, saio para a carreira acadêmica numa reta ascendente e veloz.

Perguntam-me se sinto falta deste tempo passado. Sinto falta de meus alunos e da minha disponibilidade, sim. Os bons alunos continuam bons parceiros, encontramo-nos, conversamos, entendemo-nos mesmo em tempos de Covid. No mais, aprendi muito. Mas aprendi muito mesmo, em especial a cuidar mais de minhas relações interpessoaissem abandonar meus objetivos e meus limites. Mas o que é a vida senão um longo aprendizado? Dona Carmen, sábia mulher e minha mãe, dizia sempre: quando você vai abrir seus olhos e seguir atrás do que é seu? Pois ela teve tempo para me ver feliz, na minha carreira na UNESP.

Entre estas coisas, em terras de Petronilha, fui homenageado pelos meus alunos da faculdade por mais de vinte vezes, o que sinaliza minha trajetória por aquela casa de ensino. Dei aulas na UNITAU, de Psicologia do Esporte; dei aulas na UNIVAP, no mestrado em Educação onde deixei três mestres que seguem firmes seus caminhos acadêmicos e ministrei dois curso sobre Psicologia do Medo, no ITA. Fiquei dois anos lecionando na faculdade onde me formei, na FEFI da PUC e passei por seis anos no Uirapuru, lecionando Educação do Movimento. Flashes que compuseram minha trajetória e me mostraram que o dinamismo com que encaro a Vida apenas me fortaleceu e possibilitou me tornar mais resistente psicologicamente.

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O enfrentamento de problemas de saúde nunca me fragilizou nem me excluiu, porque acreditava que passaria por aquilo, também. O que me fragilizava era a natureza humana dos que seguiam ao meu lado: assuntos para os dois livros, porque cada capítulo dará muitos detalhes e muito esforço para concluir, uma vez que são coisas que pouco me satisfazem. Mas são partes significativas de minha Vida e não pretendo levar comigo, sem dar conhecimento, porque existem coisas que até eu duvido que vivi. Cresci muito, aprendi muito, aprendi a ressignificar muitas coisas que se tornaram essenciais em minhas atuais escolhas. Talvez, um dia, quando estiver fora daqui, possa dizer que tudo foi imprescindível. Só que não.(Foto: www.institutoclaro.org.br)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology. Aluno da FATI.

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