Sabiamente, o autor da frase “se quiser provar o caráter de um homem, dê-lhe poder” foi um dos melhores presidentes que os EUA tiveram: Abrahan Lincoln. E nenhum conselho ilustra melhor o assédio moral. Juntamente com o bullying é um dos grandes vilões das relações pessoais, na atualidade ou em priscas eras, a diferença é que no passado ainda não havia classificação para tantas aberrações. Ocorre que, em pleno século XXI ainda vivenciamos as mais diversas formas de agressões psicológicas, que colocam os indivíduos, muitas vezes, em profundo estado de vulnerabilidade e, entre essas agressões, estão o bullying e o assédio moral.

Os conceitos entre ambos se esbarram e guardam similitudes, todavia, o bullying ocorre, usualmente, entre jovens e em ambiente estudantil através de ameaças, amedrontamento e intimidação, enquanto o assédio moral permeia as relações trabalhistas, mas, também, pode ocorrer nas relações entre professores e alunos, numa linha descendente (professor assediando moralmente alunos) e ascendente (alunos assediando moralmente professores).

O assédio moral é uma conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude, entre outros) de natureza psicológica, intencional, reiterada e prolongada no tempo, que expõe o indivíduo a situações humilhantes e constrangedoras, atentando contra a personalidade, a dignidade ou a integridade psíquica do ofendido, durante a jornada e no exercício de suas funções, ocorrendo nos mais variados níveis hierárquicos, dentro dos ambientes organizacionais.

Fui envolvida algumas vezes em situações análogas. Infelizmente.

Fui vítima, como professora, sendo intimidada por alunos valentões que precisavam de nota e, agora, presencio quase que diariamente, a prática desta malfadada ocorrência num clube esportivo conceituado de São Paulo.

É triste. Chega a ser desumano uma pessoa tratar outra de forma desrespeitosa. Será que o tutor despótico gostaria de receber o mesmo tratamento? Talvez, por hábito em seu lar seja comum esse tipo de comportamento. Ou será que o poder lhe confere esse direito?

Nenhuma das alternativas deveria estar correta.

Tanto o assédio moral quanto o bullying, devem ser considerados comportamentos doentios. Como não é só a palavra que aproxima na convivência diária entre as pessoas, o assédio moral tem comunicações não verbais e tão poderosas quanto as frases malditas, exemplo: silêncios, olhares de desprezo, desconfiança, etc. que, aplicados separadamente podem parecer inofensivos, porém, se repetidos de forma sistemática, soarão como destruidores.

No clube acima referido, com a desculpa de manter o time competitivo, tudo parece ser permitido: exigências em excesso, sobrecarga de tarefas, horários prolongados, urgências sem critérios, tensão e estresse. E, como nada é explicado e tudo fica subentendido, resta a insegurança psicológica como a única certeza, além das palavras de desestimulo à prática, a saber: “você não serve para isso”, “nunca aprenderá a jogar”, “você será dispensado no fim do ano, não tem condições de continuar” e, assim, sucessivamente.

São tantas as frases odiosas ditas, trancados na sala do técnico, e outras gritadas ao vento no meio da quadra, que não seria possível denominá-las.

Importante ressaltar a responsabilidade dos dirigentes das organizações em prestar atenção à esse comportamento. A autoestima dos atletas, o sentimento de identidade com a organização, a responsabilidade com o treino, a produtividade e a competitividade, entre outros indicadores, certamente, não são estimulados por uma comunicação antípoda que os desprezam ou os subestimam.

Num dado julgamento em setembro de 2013, a 2ª Turma tomou uma decisão inédita na Corte Superior (da região Sul do Brasil): reconheceu o assédio moral como ato de improbidade administrativa.

“Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Dessa forma, o assediador poderá ser responsabilizado civilmente pela prática do assédio moral,cabendo indenização ao ofendido de acordo com os danos causados: sendo material, em casos em que o assédio tenha causado prejuízos financeiros a vítima e, também, indenização moral, ou seja, quando houver prejuízos não palpáveis, não mensuráveis, isto é, danos psicológicos ou à imagem da vítima.

No âmbito penal, o assédio moral poderá se tornar um crime quando capitulado na modalidade calúnia (quando o assediador acusar o assediado pela prática de alguma ação não cometida, conforme artigo 138 do Código Penal Brasileiro). Sua pena é detenção de seis meses a dois anos mais multa.

Ademais, caso o assediador ofenda publicamente a honra da vítima, poderá ser caracterizado crime de difamação, capitulado nos termos do artigo 139, punível com detenção de três meses a um ano mais multa. Se o assediador ofender a dignidade ou o decoro da vítima, poderá tipificar crime de injúria, nos termos do artigo 140 do Código Penal, cabendo detenção de seis meses a um ano ou multa.

Já, nos casos mais extremos, o assediador poderá ser enquadrado em outros crimes, tais como: lesão a integridade corporal ou a saúde da vítima, nos termos do artigo 129 do Código Penal.

Não estão esgotadas as possibilidades de tipificação do assédio moral no Código Penal, dependendo do caso, há vários outros crimes em que o assédio moral poderá ser determinado.

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A jurisprudência é pacífica nos casos em que a inércia injustificável do empregador em determinar que o assediador cesse de imediato as agressões. Daí a obrigatoriedade de indenizar o assediado que, muitas vezes, não tem meios próprios para conter o assédio, seja ele em situações de trabalho ou de ensino, o que torna o empregador responsável pelos atos de seus empregados, pois, está relacionada com sua obrigação de dirigir, fiscalizar e punir aqueles que se pautem por condutas danosas uns contra os outros, bem como, de zelar por ambiente de trabalho saudável.

Os assediadores só aprenderão a respeitar o próximo, quando sofrerem as consequências de suas ações maléficas. Assédio moral é crime e deve ser denunciado no Disque denúncia: 181.

Viu acontecer? Denuncie! Aconteceu com você? Denuncie! Nunca se cale diante de pessoas que fingem fazer o bem, quando o mal ronda as suas ações. Você não merece, nunca deixe que te convençam do contrário! (Foto: www.brasil.gov.br)


ELAINE FRANCESCONI

Bacharel em Zootecnia (UNESP Botucatu). Licenciatura em Biologia (Claretiano Campinas). Mestrado (USP Piracicaba) e doutorado (UNICAMP Campinas) em Fisiologia Humana. Professora Universitária e escritora.