Durante cinco dias, a superintendente da Fundação Serra do Japi, a veterinária Vânia Plaza Nunes, esteve em Brumadinho. Ela foi até lá ajudar no resgate de animais presos na lama composta por rejeitos da mineração. Acompanhe o relato dela ao Jundiaí Agora:

Adriano Machado/Reuters/Direitos reservados

Quantos dias ficou em Brumadinho?

Estive em Brumadinho por cinco dias, estive lá do meio ao final da semana seguinte ao acidente.

Foi com o objetivo exclusivo de ajudar no resgate de animais?

Sim. Mas, não apenas nas ações diretas mas auxílio, na avaliação e gerenciamento do necessário para os animais que foram direta e indiretamente atingidos.

Outros veterinários de Jundiaí também foram?

Não, ninguém.

Havia muitos profissionais com esta missão lá?

Sim de diferentes áreas defesa civil, bombeiros, polícia civil, militar e ambiental, médicos-veterinários e muitos voluntários pelos humanos e também uma boa equipe pelos animais, órgãos ambientais federais e estaduais ligados aos animais e outros a questões humanas, Ministério Público de Minas, voluntários de diferentes cultos religiosos, entre outros.

A senhora já tinha vivido uma experiência assim?

Sim. Já tinha participado na época de Mariana. Em 2015

Como foi no começo? Ficou chocada?

Sempre é muito triste e impactante observar o tamanho dos danos e ver a complexidade do que ocorre pela irresponsabilidade de humanos em especial empresas que empregam pessoas. Ficar chocada não, pois estou acostumada com situações onde o caos se instala em diferentes frentes. Entretanto cada caso é um caso. Neste a quantidade de pessoas envolvidas pelo número de vítimas humanas, recursos disponibilizados e a complexidade para o resgate naquela situação foi muito intenso. A quantidade de recursos necessários para apoio aos que estavam em serviço, enfim algo muito grande e complexo.

Quantos e quais animais resgatou? Descreva como era este trabalho…

Não ocorreu resgate individualizado, eles sempre ocorreram com equipes multiprofissionais, os animais que eram prioritários quando cheguei eram os que estavam em áreas de risco e ainda não tinham cuidados, então esses eram as prioridades. Tivemos sobrevoos onde estive justamente para buscar animais que estavam em áreas isoladas do território não tendo como sair. Ou para avaliar se ainda haviam outros por exemplo bovinos e cavalos que não tinham sido resgatados nas áreas atingidas pelo rejeito. Para os que ficaram presos na lama/rejeito os resgates só foram autorizados muitas horas após o rompimento para evitar novos acidentes pois e muito diferente resgatar animais de pequeno e grande porte, as necessidades em ambos os casos são bem especificas.

Alguns dos colegas e voluntários pelos animais que ali estavam tem experiência de outras situações em especial Mariana, que precisou de mais resgates de animais que ficaram presos. Muitos em ambos podem ter morrido e não foram contabilizados no momento, mas muitos conseguiram se salvar pois tem maior capacidade de se evadir da área pois o sistema sensorial dos animais é bem mais sensível a pequenas alterações sonoras, olfativas, táteis e se estavam em área possível de deslocamento procuraram locais mais seguros e se salvaram ou ficaram retidos nas margens e foram retirados, e neste caso foi um pequeno número. Esse comportamento dos animais é algo sempre observado em situações de grandes acidentes ambientais, só não conseguem fugir animais presos e que estão na área de percurso por exemplo do rejeito.

Entretanto com o esvaziamento das comunidades próximas em caráter de emergência muitos animais de diferentes espécies foram deixados para trás e para esses o trabalho voluntariado foi essencial. Todos foram alimentados, receberam água e avaliação veterinária sendo recolhidos no momento correto e passaram a receber cuidados e encaminhamento que continua nesse momento. Ali onde tudo ocorreu é área rural, característica de Minas Gerais um núcleo habitacional no caso Brumadinho e vários distritos onde existem comunidades com praça, igreja, escola, ruas e casas com estruturas básicas para família, e moradores. Passado o momento da emergência, urgência, precisamos ter toda uma estrutura pensada e mantida por longo período com os animais além das pessoas.

Você deve estar acompanhando que outras barragens estão com risco 2 de rompimento, então de forma preventiva as pessoas de outras comunidades, em outras cidades e localidades também estão sendo removidas. Neste caso os voluntários da Brigada Animal Minas Gerais, da qual eu faço parte, vão aos locais para iniciar as ações até que empresas contratadas cheguem, sejam orientados e capacitados pelos voluntários e possam assumir o controle e ações necessários em cada local. Um esforço imenso está sendo feito em especial pelos voluntários da Brigada para não deixar os animais e indiretamente as pessoas das comunidades atingidas sem assistência aos seus animais. Uma coisa que esqueci de falar ainda em Brumadinho é que também a fauna silvestre da região foi atingida e medidas de resgate, apoio local e avaliação do dano forma feitas e continuam. Tudo sempre de forma integrada e segura evitando risco aos voluntários e trabalhadores dos órgãos ambientais.

A senhora pode ter sofrido algum tipo de contaminação pelos produtos rejeitados? Há este risco? E todos os bombeiros que vimos na lama?

Os riscos são intrinsecamente ligados as ações desenvolvidas e ao material de segurança destinado a cada um envolvido no resgate, com sua função. Não acho que diretamente possa ter sido contaminada. Não tínhamos autorização para entrar nas áreas atingidas se não era seguro. Quem trabalha e trabalhou no resgate diretamente sempre usa equipamentos de segurança específicos e disponíveis.

Qual a reação do animal nesta hora? Ficam estressados ou sabem que estão sendo retirados e acabam permitindo a aproximação e manejo?

Muito variável mas todos com certeza estão em situações de trauma como os humanos pois a capacidade perceptiva e mental é muito semelhante talvez até mais sensível em muitas situações…Os animais como bovinos, equinos, suínos e aves domesticas tem maior ou menor proximidade com humanos e isso interfere na hora do resgate, além e claro da condição necessária para o resgate que pode ser mais ou menos estável.

Para onde os bichos eram levados?

Foi montado dois postos de recepção e encaminhamento, mas alguns em condições de necessidade especificas foram encaminhados para clinicas veterinárias, hospital da UFMG mas foi a minoria, depois alguns temporariamente foram enviados a hotéis, por exemplo cães e gatos até que as estruturas adequadas estivessem prontas numa fazenda que foi alugada para abrigar os animais e onde foi montado um pequeno hospital com todo recurso. Muitos bovinos e cavalos já após a avaliação forma e estão mantidos na fazenda.

Muitos animais morreram nesta tragédia? Há uma estimativa?

Estão sendo contabilizados.

Chegou a ver resgate de pessoas?

Só os helicópteros chegando com os corpos ou parte deles.

O que a senhora viu que as TVs não mostraram?

Muita coisa é completamente diferente ver ao vivo e pelas imagens trazidas pelos meios de comunicação. Ao vivo temos a dimensão exata do dano, da irresponsabilidade dos causadores do mesmo e da quantidade de dificuldades que está sendo enfrentada. Muitas vidas continuam em risco no resgate e só vai terminar tudo não se sabe quando ainda, muito triste. Vi muitos eventos para o sepultamento de vítimas em muitos distritos e sempre uma solidariedade de todos muito forte. Muitos voluntários em frentes que não são mostradas na mídia. O povo mineiro é muito simples e cheio de afeto, de simplicidade e acolhimento, isso era visível naquele momento. Tanta gente reunida em muitas partes e cada qual com uma missão muito especifica e fundamental difícil descrever…..

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Chegou a ver a contaminação do rio/peixes mortos?

Só de cima mas a distância. Mas ver o Rio antes e depois da área afetada é algo inesquecível…

Acha que aquela área se recuperará um dia?

Só o tempo vai dizer nas próximas gerações se mudarmos nossa forma de lidar com o meio ambiente agora onde quem decide e influencia a quem pode decidir sempre achando que pelo lucro e interesses podemos fazer qualquer coisa talvez, mas só o tempo vai dizer. Em Mariana a lacuna e a tristeza de uma natureza resiliente e muito forte…. Igual nunca será, pois a perturbação levou a característica que para se recuperar sofrerá alterações da recuperação por tempo indeterminado e pela interferência de todo o entorno

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