Sutileza da IRONIA

ironia

Nós, os negros que aqui no hemisfério sul das Américas, fomos escravizados, não devemos de forma alguma nos sentir envergonhados. Não fomos voluntários e, numa sutileza da ironia, nem convidados a vir exercer trabalhos com recompensas. Fomos forçados e reprimidos, apesar dos algozes saberem das nossas capacidades e da nobreza das nossas famílias originárias. 

Com a nossa resistência, devido a nossa fisiologia privilegiada, deram mais trabalhos aos mais fortes e com a aparência física dos titãs das histórias dos deuses da mitologia, que os brancos criaram e não se sustentaram. Então, como criadores, separaram os indivíduos em criaturas e criados. Os branco pensaram que poderiam tornar os negros inteligentes em criados-mudos.

Os negros eram vistos como reprodutores. Só que nunca foram tratados como os garanhões das corridas de cavalo. Nem como os animais das touradas, nem como os bois com pedigree elevado. A únicas semelhanças além do tamanho das genitálias, eram as grandes quantias que os proprietários (dos escravos) recebiam pela negociação de suas crias, tal qual as elevadas somas que se registram na contemporaneidade. O peão, o rodeio, o gado.

O problema nunca foi nosso, o que nos isenta sempre de certas irresponsabilidades. Conseguimos desenvolver nossa defesa, devido aos conhecimentos que já tínhamos e nos garantiram a sobrevivência, mesmo que a duras penas, inteiros e intactos. Outra ironia da história…

Assim foi a história dos negros que foram os primeiros a construírem as estradas de ferro no interior do estado de São Paulo. Meu avô paterno, no começo do século XX foi ferroviário e depois dele, seguindo a mesma profissão, meu tio e meu pai, filhos dele.

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Meu avô teve um histórico familiar de trabalhadores em estrada de ferro desde o século XIX. O pai e o avô dele, também. Meu avô tornou-se um especialista em “correr linha”. Uma qualidade diferenciada, assim como os militares, a não ter uma residência fixa na época. Tanto que de tanto correr linhas, nas idas e vindas, teve filhos em cidades diferentes. 

Em Cordeirópolis, Itirapina e Jundiaí foram três. Isto no tempo da Estrada de Ferro Araraquarense, que depois juntou-se a Mogiana e faziam baldeações. Até que quando aqui se estabeleceram, vieram trabalhar na Santos a Jundiaí, que depois se tornou a Cia Paulista de Estradas de Ferro, onde se aposentaram.

Nesta época eu já era nascido e ouvi essas histórias o tempo todo durante minha infância e adolescência. Meu avô poderia até ser semianalfabeto, mas com certeza, mentiroso ele não era. Foi meu padrinho de batismo. Eu confiava muito nele.

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Então, agora chega a grande oportunidade, que estamos conseguindo com o Afrofuturismo é a vantagem de tornarmos verdadeiros através de testemunhos, as histórias que nos foram contadas. Nãi deixa de ser uma ironia. Juntaremos todas e terão de ser aceitas nos tribunais de justiça, nas ocorrências policiais, nos eventos e nas entrevistas particulares ou coletivas de alguns membros. É a volta dos tempos dos “homens de palavra”, com depoimentos sinceros e avaliados pelo caráter. 

O problema do preconceito estrutural e do racismo pela cor da pele é a inveja. A “inveja branca”, aquela que pode ser desculpada, desinteressada porque eles “os invejosos” serão eternamente inocentes.

Pais perdoa-lhes, eles (não) sabem o que fazem…(Ilustração: Agência Senado)

LUIZ ALBERTO CARLOS

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