A jornalista Paula Corrêa Pereira, 36 anos, nasceu em Jundiaí e mora na Ucrânia desde 2020. No início deste mês, o Jundiaí Agora a entrevistou. Na época, o país onde vive e a Rússia andava se estranhando. O atrito ganhou repercussão internacional mas, segundo Paula, nada que a pudesse deixá-la assustada. Desde então, Paula vinha fazendo postagens mostrando que a tranquilidade tomava conta dos ucranianos, apesar das ameaças. Ela também pedia respeito à decisão de quem decidiu ficar na Ucrânia. Agora, o conflito explodiu de fato. O JA vem tentando contato com Paula, sem sucesso. A entrevista publicada no último dia:

O que está acontecendo entre Rússia e Ucrânia?

De forma muito simplificada, podemos dizer que a Rússia pressiona a Ucrânia e busca garantir  que o país não faça parte da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), pois os países membros desta aliança tem o direito de se defenderem militarmente no caso de um ataque armado. As tensões recentes acontecem em um momento em que mais de 100 mil soldados russos realizam o que o presidente russo denomina “exercícios militares” na fronteira com a Ucrânia. Tendo em vista que em 2014, a região da Crimeia – antes território ucraniano – foi tomado pelos russos, a presença dos militares russos na fronteira é tida como uma ameaça à soberania e liberdade da Ucrânia. Essa tensão política existe, mas, de modo geral, não vejo a população assustada. Aqui as pessoas continuam vivendo suas vidas normalmente; vão ao trabalho, restaurantes, caminham pelos parques e conversam sobre assuntos amenos do dia a dia. Acho que a mídia, de forma geral, se alimenta passando a ideia de um terror que, apesar da ameaça real, não condiz com a leveza como muitos ucranianos vivem. Eu me preocupo, é claro, mas não me sinto apavorada. Assim como muitos outros, acredito na possibilidade de um acordo diplomático e creio que uma guerra não seja de interesse de nenhum país envolvido. Já cogitei retornar ao Brasil, pois em Jundiaí tenho uma mãe que se preocupa com meu bem-estar e sei que voltando à Jundiaí ela teria um pouco mais de tranquilidade. Porém, meu marido e eu concordamos em ficar, pois não achamos que seja necessário tomar esta medida no momento. Definimos que, caso realmente haja uma invasão russa, aí iremos ponderar sobre a melhor atitude a ser tomada: nos recolhermos em casa ou buscar abrigo em algum país vizinho temporariamente. Não temos um kit de emergência e nem preparamos uma mala pensando em evacuar do país, apenas deixamos à prontidão uma pasta com documentos essenciais e uma bolsa com reserva de dinheiro.

Onde se formou em jornalismo? Fez alguma outra faculdade?

Eu me formei em jornalismo pela Universidade Anhembi Morumbi e concluí dois cursos de pós-graduação pela Universidade de Campinas (Unicamp): uma especialização em “Divulgação Científica e Saúde: Neurociências” (2014) e um mestrado em “Divulgação Científica e Cultural” (2018).

Onde morou e estudou em Jundiaí?

Passei minha infância e adolescência no bairro Aeroporto, onde se situa o Centro de Engenharia e Automação – um instituto de pesquisas do governo do Estado de São Paulo (CEA-IAC). Quando pequena estudei na escola Irmã Úrsula Gherello, escola municipal que existe dentro do CEA. Também já estudei em outros três colégios: São Vicente de Paulo, na Emeb Rotary Club e cursei o ensino médio na Escola Padre Anchieta.

Chegou a trabalhar em Jundiaí antes de ser jornalista?

Antes de me formar em Jornalismo e mesmo depois de graduada tive o privilégio de trabalhar em áreas que sempre me geraram interesse: idiomas, comunicação visual e atendimento ao cliente. Já fui professora de inglês na escola Wizard de idiomas, trabalhei como recepcionista bilíngue no hotel Transamérica, fui editora de imagens (fazendo inclusive de restauração de fotos) na Foto e Ótica Imagem e já atuei como vendedora e coordenadora na Livraria Leitura onde aprendi muito sobre administração de um negócio, como tratar clientes e trabalhar em equipe. Também já trabalhei com produção de conteúdo para as redes sociais e, com meu marido que é programador, trabalhei com desenvolvimento de websites.

Quando se formou, atuou em algum veículo local?

Ainda não tive a oportunidade de atuar em um veículo de comunicação de Jundiaí após minha formação, mas já fui estagiária na rádio Santos Dumont, desenvolvendo conteúdo para o programa “Se Liga” com Tiozinho & Tiozão.

Há quanto tempo está na Ucrânia? Tem família em Jundiaí? Vem com qual frequência visitá-los?

Vivo na Ucrânia desde outubro de 2020 com meu marido Sergei, que é ucraniano. A gente se conheceu pela internet em um curso de oratória que fizemos em 2013 pela Coursera – uma plataforma que oferece cursos de universidades de diversos países. Em dezembro de 2014 nos casamos no Brasil e vivemos em Jundiaí grande parte do tempo. Porém, em 2020, meu marido recebeu uma proposta de emprego para trabalhar para uma empresa de Hong Kong. O emprego é home-office, mas para conciliarmos melhor a diferença de fuso-horário, achamos melhor passar um tempo na Ucrânia. Daqui o fuso horário é menor e eu tenho a possibilidade de aprender melhor o idioma russo e também de conhecer mais a cultura e a própria família do meu marido. Em Jundiaí, ficaram minha mãe e nossos três gatinhos (Tchê Guri, Branca Letícia e Malhadinha). Meu pai morreu já há alguns anos. Estive no Brasil em setembro de 2021 e passei um mês matando a saudade da mamãe, dos gatinhos e dos amigos. Foi um mês muito corrido. Tive de resolver muitas coisas…

E o que uma jundiaiense faz na Ucrânia?

Ah, esta jundiaiense aqui está calibrando a vida, tendo muitas experiências novas, conhecendo pessoas de culturas diferentes e criando novas ambições. Encarei a vinda à Ucrânia como meu ano sabático, pois eu sabia que seria uma experiência temporária. Digo isso porque, a princípio eu e Sergei concordamos em passar apenas um ano aqui, mas o primeiro ano terminou e optamos por ficar mais um ano devido ao seu trabalho. Daqui de Odessa, cidade ao sul da Ucrânia, passo meu tempo equilibrando diferentes projetos e tarefas. Além de estudar o idioma russo (que é o mais falado em Odessa), também dedico meu tempo a aprimorar meus conhecimentos em cursos online e escrevo crônicas para o “Viajando nos 30”. Lá compartilho minhas experiências de vida de forma muito leve e descontraída. Ainda mais recentemente, desde outubro do ano passado, venho trabalhando como modelo para sites de bancos de imagens. Eu sequer sabia que este tipo de trabalho existia, até que um dia recebi, pelo Instagram, a mensagem de uma produtora me convidando para uma sessão. O trabalho não requeria experiência prévia e era remunerado. Desde então, já participei de 15 ensaios fotográficos e esta tem sido uma experiência muito interessante e divertida, tendo a oportunidade de exibir mais meu “lado artístico”. Às vezes, no ensaio eu preciso ser uma mulher de negócios, às vezes preciso ser vendedora de uma floricultura ou simplesmente exibir diferentes expressões diante da câmera. É bem divertido!

Já encontrou outros jundiaienses por aí ou países vizinhos?

Jundiaienses não encontrei, mas já fiz amizades com brasileiros de diferentes estados vivendo aqui em Odessa.

Você acompanha as notícias de Jundiaí e do Brasil pela web?

Sim, acompanho o noticiário de Jundiaí e do Brasil diariamente pela internet. Não apenas para saber como anda a situação do Covid em Jundiaí – já que me preocupo com a segurança da minha mãe e amigos -, mas também porque possuo investimentos no Brasil e informação é fundamental para uma boa tomada de decisão.

Como avalia a Terra da Uva e o Brasil nestes últimos anos?

Jundiaí tem se desenvolvido muito nos últimos anos. Sob meu ponto de vista, a área de educação e saúde recebem destaques frequentemente. A cidade continua atraindo investidores, servindo de instalação para novas empresas e criando novas oportunidades de emprego. Quando Jundiaí aparece nos resultados de pesquisas como uma das melhores cidades do Brasil para se viver, dá muito orgulho ver como a cidade tem sido gerida. Acredito também que os jundiaienses possuem uma boa interação com os veículos de comunicação e estão interessados em tirar proveito das oportunidades que a cidade oferece, seja pela realização de cursos gratuitos oferecidos pela Prefeitura da cidade ou pelo uso regular das praças e parques desenvolvidos para o bem-estar social.

Como foi sua adaptação?

Quando me mudei para Ucrânia, eu já havia realizado um curso de russo durante um ano na cidade de Campinas. Tive uma boa introdução ao idioma, mas vim para cá bem “travada” na comunicação. Meu marido aprendeu português, mas temos o hábito de conversar em inglês e isso não favoreceu para que eu aprendesse o idioma rapidamente. Mas certamente vir à Ucrânia e ter contato com mais pessoas daqui ajuda muito no aprendizado. Percebo claramente que houve um progresso no meu aprendizado, mas ainda sinto que sou iniciante e tenho muito ainda a aprender. Russo é um idioma difícil, o alfabeto é diferente e as regras gramaticais são bem complexas e cheias de exceções (diferente do inglês), mas não me desanimo diante da dificuldade.

E o frio? Qual a temperatura mais baixa que enfrentou aí? Nestas horas tem vontade de voltar?

Na cidade de Odessa o inverno não é tão rigoroso quanto na capital, Kiev. A temperatura mais baixa que já presenciei foi -15°C! Sem luvas, a pele da mão queima de frio e não é nada confortável, por isso, se agasalhar bem para o inverno é essencial. O frio em si não me intimida, mas me deixa menos animada para resolver coisas simples do dia a dia, como comprar um pão na padaria. E a ausência de dias ensolarados também me entristece um pouco, mas por sorte, eles não duram muito tempo; às vezes lá fora faz um frio enorme e até neva, mas se sai o sol, fica lindo de se ver!

O que a Ucrania tem que o Brasil não tem e vice-versa?

Vamos começar pelo que o Brasil tem de bom! O Brasil tem um povo animado, muito “verde e verdura”! As paisagens brasileiras, com nossa diversidade de fauna e flora, são coisas que a gente passa a dar mais valor quando não as encontra tão facilmente. Odessa é uma cidade grande, com cerca de um milhão de habitantes. A arquitetura, principalmente dos prédios históricos, é de tirar o fôlego – mesmo quando os prédios parecem tão carentes de manutenção. E Odessa costuma ter ruas arborizadas com calçadas bem espaçosas, mas exceto pelas aves mais usuais (como pombas, corvos, patos e gaivotas), você não terá um encontro regular com uma ave colorida (como uma maritaca, um tucano ou um beija-flor) tal como temos o prazer de presenciar em Jundiaí. O Brasil tem uma variedade de verduras, legumes e frutas que faz a gente sentir falta da terrinha, principalmente no inverno. Isso porque aqui na Ucrânia, o frio intenso castiga as plantações e gera uma escassez de legumes e verduras. Desta forma, os legumes mais usuais em casa nessa época são: tomate, cenoura, batata e pepino. Porém, o verão na Ucrânia é bem saboroso, é quando a gente pode comprar framboesa, morangos e cereja por quilo – frutas bastante cultivadas aqui. O sorriso e a alegria escancarada do brasileiro também são coisas que não surgem com tanta facilidade por aqui. Os ucranianos estreitam seus laços de forma lenta e moderada e reservam suas emoções para momentos mais privados. Já o brasileiro, esbanja energia na conversa de bar, joga conversa fora com qualquer pessoa e não se incomoda em fazer perguntas mais pessoais só para saciar sua curiosidade. Aqui, pela experiência que tive, os ucranianos também são curiosos, mas não farão um interrogatório logo na primeira conversa.

Como reagem quando você diz que é brasileira? Chegou a explicar que é de uma cidade no interior de São Paulo chamada Jundiaí, terra da uva, que tem uma serra linda?

Geralmente, quando digo que sou brasileira, os ucranianos respondem de forma muito positiva. E assim que me apresento, eles logo compartilham algo que sabem sobre o Brasil; como futebol, novelas brasileiras, praias e, claro, Rio de Janeiro e carnaval. Certa vez, em um mercado municipal, uma senhora recordou-se da novela “Escrava Isaura” e fiquei muito surpresa. Quando digo que sou de Jundiaí, sempre acrescento que é uma cidade que fica próxima a São Paulo, acredito que assim são maiores as chances de criarem alguma referência sobre a localização. Para as amizades que construí aqui, sempre que tenho a oportunidade, exibo fotos de Jundiaí e das coisas que sei que são inexistentes na Ucrânia. Eles gostam de ver as fotos da Serra do Japi, da variedade de frutas, paisagens e ficam curiosos para saber sobre nossas refeições.

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Pensa em voltar para Jundiaí?

Sim, os planos são para que voltemos à Jundiaí ainda no final deste ano. Apesar de termos experiências muito positivas na Ucrânia, nossa vivência aqui foi planejada desde o início para ser temporária. No Brasil é onde pretendemos fixar moradia e realizar nossos sonhos.

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