Se alguém afirmar que você é neurótico, provavelmente terá o sentido de um insulto ou, no mínimo, o apontamento de uma característica negativa a seu respeito. Numa compreensão mais corriqueira, a pessoa neurótica é aquela que tem os nervos à flor da pele, age com desconfiança e costuma ser invadida por pensamentos persecutórios. Ao sentir a ofensa, poderá retrucar: neurótico é você!
É nesta perspectiva que eu escolhi parafrasear, no título da coluna, a frase “O Inferno são os Outros”, atribuída ao filósofo francês Jean-Paul Sartre, e que significa que muito do que padecemos é resultado da alteridade, ou seja, do nosso encontro com o “outro”. Nessa interação social, eu não sou o “inferno”, nem o “neurótico”. Os outros que são.
Agora, se quisermos sair do senso comum e aprofundar mais sobre o que significa ser uma pessoa neurótica, precisamos recorrer à teoria psicanalítica, a partir de seu fundador, Sigmund Freud (1856-1939). Já adianto que, ser uma pessoa neurótica, significa um traço saudável da personalidade, uma característica muito mais positiva do que negativa do nosso modo de funcionamento psíquico. Vou explicar melhor.
A personalidade é o resultado de um conjunto de características que define uma pessoa, influenciando a forma como ela pensa, sente e age, determinando os modos de ser e existir no mundo, ou seja, como a pessoa vai se relacionar com as outras pessoas e consigo mesma. É um conceito que está relacionado à identidade e individualidade de cada um, sendo relevante tanto no campo social como subjetivo.
Para a psicanálise, existe somente três tipos de estrutura de personalidade: psicótica, borderline ou neurótica. As duas primeiras são, por si só, psicopatologias. As neuroses, nem sempre. Para Freud, neuróticos somos todos nós: pessoas normais, que têm conflitos internos e lidam com eles por meio de mecanismos de defesa e certa dose de repressão.
Na vida em sociedade, se você nunca reprime os seus desejos e ímpetos, isso é uma evidência de psicose. Caso tudo ocorra suficientemente bem no decorrer do nosso desenvolvimento psicoemocional, desde a mais tenra infância, seremos pessoas neuróticas.
Dessa forma, a pergunta correta não é se operamos ou não na neurose, mas qual tipo de neurose que nos acompanha. As principais neuroses são: as fobias, caracterizadas pelo medo; as histerias, caracterizadas pela repressão; as compulsivas, caracterizadas pela culpa; as depressivas, em que o sentimento de perda é o conflito mais marcante.
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Agora, claro, todas as pessoas são constituídas por algum nível de medo, culpa, repressão ou sentimento de perda. Ao passar por momentos mais desafiadores, estamos sujeitos a algum tipo de sofrimento. Isso não é patológico, não significa adoecimento. Entretanto, na eventualidade de alguma dessas características se destacar, dificultando ou impedindo alguém de realizar atividades cotidianas, trabalho, relacionamentos, estudos, enfim, então temos um alerta. Caso a pessoa não seja acolhida, profissionalmente falando, há o risco de desenvolver agravos em saúde mental.
A última afirmação positiva em relação à nossa neurose de cada dia é que, se bem elaboradas e integradas à nossa consciência, a partir de novas narrativas sobre os fatos e acontecimentos na nossa experiência de existir, poderemos atingir estados de bem-estar e plenitude na vida. No limite, o sentimento será de felicidade.(Foto: Reprodução/TV Globo/G1)
MARCELO LIMÃO
Sociólogo, psicólogo clínico, especialista em “Adolescência” (Unifesp) e “Saúde mental no trabalho” (IPq-USP). Colaborador no “Espaço Transcender – Programa de Atenção à Infância, Adolescência e Diversidade de Gênero”, da Faculdade de Medicina da USP. Instagram: @marcelo.limao/Whatsapp: (11) 99996-7042
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