O final da década de 70 foi muito especial na minha vida. Estudava no Colégio Técnico (hoje Escola Técnica Vasco Venchiarutti) às margens da rodovia Anhanguera, onde as vezes pegávamos carona para voltar para o centro de Jundiaí. O lema do Colégio “Liberdade com Responsabilidade” soava bem aos ouvidos. Era um convite à mudança de fase da vida, saindo da adolescência para o mundo adulto. O Brasil também mudava de fase, passando da ditadura militar, que agonizava, para a democracia.  Veio a anistia ampla, geral e irrestrita e os aeroportos passaram a receber personagens da luta contra a ditadura. Na bagagem traziam alívio e a esperança equilibrista.

Neste ambiente de transformações a música cumpriu uma importância enorme naquele momento no Brasil. Seja na revolução dos costumes, seja nos versos que cantavam a liberdade e o próprio Brasil. Eu gostava de ouvir rádio e ver shows alternativos influenciado por um amigo músico e maestro.  Numa aventura estivemos no Festival de Águas Claras, íamos à capital com frequência e assistimos o irreverente Língua de Trapo, Premeditando o Breque, vimos o encontro no Teatro Municipal, na capital, de  Artur Moreira Lima e Elomar (um extraordinário cantador baiano)  , e por aí afora. Era o gosto pela música e a descoberta de novos movimentos de cultura.

Certa vez ouvindo rádio surgiu uma voz meio estranha cantando “eu sou apenas um rapaz latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior” e mais pra frente dizia  “não me peça que eu lhe faça uma canção como se deve, correta, branca, suave muito limpa, muito leve. Sons, palavras são navalhas e eu não posso cantar como convém, sem querer ferir ninguém”. Era Belchior, que partiu neste final de semana.

A partir daí me interessei pelos seus versos que as vezes era pura  poesia como nas músicas “ Mucuripe” e “Paralelas”  e outras vezes  faziam refletir como aquelas eternizadas por Elis Regina “Como Nossos Pais” e “ Velha Roupa Colorida”.

 

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Sua história está sendo recontada pela mídia nos últimos dias por ocasião de sua partida. Belchior optou, nos últimos dez anos, pelo isolamento. Segundo as informações ele se afastou das pessoas, se dedicou à leitura, a ouvir música e a uma vida nômade e sem bens materiais.

Assim como eu, imagino que muitos tenham sido influenciados por sua música e seus versos. O Brasil perde um grande compositor, que escreveu sobre a “divina comédia humana onde nada é eterno”. (foto acima: Facebook)

 

RAPAZPEDRO BIGARDI
É jundiaiense, 57 anos, engenheiro civil, casado com Margarete e pai de Patricia, deputado estadual (2009 – 2012) e prefeito de Jundiaí (2013 – 2016).