Só não consegue ser mais chato que hospital e delegacia… mas com esta última sou familiarizada. Estou no cartório. Minha senha é ZYZ. Estão na B12…
Frenesi louco de cabeças ‘arribaabajo’ de olho na tela. O que se faz aqui? Tudo. De casamento a atestado de óbito, passando por registro da caixa d’água sem ladrão e autenticação da ‘frozinha’ na unha de gel.
Calor do inferno e um moço entra de jaqueta de couro preta, zaralhado, perguntando se aqui faz extravio de documento. Eu não sei o que a balconista entendeu. Ela responde um sonoro siiimmm, como se estivesse na cabine do Sílvio Santos, sem saber nem do que se trata. Acho que é o calor que faz isso com as pessoas.
Casal fofolete entra no cartório pisando igualzinho, juntinhos e em ré menor, pergunta:
-Pode marcar casameeentoo?
Os jovens riem que nem hienas drogadas, beijinhos melosos que dão ânsia em Sonrisal.
-Precisa de duas testemunhas, responde a moça da cabine…
Eles olham para os lados… eu abaixo a cabeça.
Nananinanão… não vou testemunhar nada, que é pra não sentir culpa depois.
Saem do cartório, vão pra rua e eu espicho o pescoço. Chamam o flanelinha que olhava carros, mas ele cobra R$ 5 pra compensar o tempo de ausência em seu posto. Vem também um sorveteiro.
Pronto… Peter Pan e Sininho já podem marcar a data. A lua de mel será um cruzeiro no navio do Capitão Gancho. Na saída ele pergunta se tem que casar de terno. Achei fofo.
Um ser que lembra um retículo endoplasmático rugoso (não sei nada sobre isto mas a palavra ‘rugoso’ me sugere algo velho) de, no mínimo 112 anos, quer cópia da certidão de nascimento. Pra quê? Espera um pouco e já pega a de óbito. Eu atesto a causa mortis: hora extra.
A moça esqueceu o RG e saiu falando palavrões num dialeto ‘sodomagomorrês’. Muito rápido… não consegui aprender nenhum.
Ar-condicionado tá fraaaaco, alguém reclama todas as cabeças se viraram pra ver quem era o fogoso… aqui deve estar uns 10 graus… até a periguete que tá esperando pra reconhecer se sua saia pode ser uma brusinha mais comprida já cobriu as coxas com os cabelos da mãe Eva Angélica.
Alguém reclama da demora afirmando que isso só acontece no Brasil… eu espicho o olho pra ver quem é a personalidade nórdica. Achei que fosse um sueco, mas é só um monte de músculos falante da terra de Petronilha mesmo.
A moça no balcão pergunta:
-É só isso, posso ir embora?
Eu tenho ímpeto de responder “não… fica aqui, aproveita e faz um café”. Vaza, né, mona…
Chamam outro. Levanta um guarda-roupa de ébano, todo trabalhado na melanina. Ele para no balcão, aliás, ele para o balcão… e diz o nome… a moça pergunta o sobrenome… “divórcio moça, o sobrenome dele é divórcio”, adoraria responder…
A mãe dos gêmeos Sadraque e Mesaque quer autenticar a cópia do RG dos diabretes. Ah, senhoraaaa… Deus te dá gêmeos e a senhora faz isso? Foi promessa? Ou foi haxixe mesmo?
OUTRA CRÔNICA DE ROSITA VERAS
-É ‘aquiquecasa’? A voz vem de uma mistura de Dick Vigarista com compadre Washington.
É aqui moço, segura na mão de Deus e vai… agarra teu milagre blondie bem firme, que outra ‘cê’ num arranja.
-Aceita ‘piques’? pergunta a menina veneno da microssaia.
-Não senhora… só dinheiro e cartão de débito.
Vai embora amor… e aumenta o tamanho da saia ou doa um pedaço do fêmur e encolhe as coxas.
Chamam meu número… e eu tô indo sem conseguir falar do casal que chegou perguntando:
-Aqui faz separação de corpos?
Mentalmente eu respondi que é só na maternidade, quando a mãe pari.
Peguei o lugar do deus ébano no balcão. Ele deixou cheiro de beleza no ar… até esqueci o que vim fazer no cartório. É o calor”. #partiucorreio. Câmbio desligo…(Foto: Agência Acre/Governo Federal)
ROSITA VERAS
É escritora, ghostwriter e articulista
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