Recente censo da moradia do “Quinto Andar” apurou que os brasileiros valorizam mais a casa própria do que filhos, religião e estabilidade. Possuir um imóvel é o sonho de 87% dos 3.486 entrevistados. Numa escala de 0 a 10, ter uma casa própria atingiu 9,7% das respostas. Enquanto isso, ter filhos chegou a 7,9%.
O resultado contraria a visão contemporânea de que a juventude já não faz questão de “possuir”, mas apenas de “usar”. Pode ser que haja nichos descolados que prefiram não ter casa, não ter carro, não acumular bens materiais e fruir gostosamente da vida, um pouco mais liberta dessa dependência patrimonialista. Mas o conservadorismo ainda predomina. O que é preocupante, em se cuidando de outros setores, como a cambaleante política partidária tupiniquim.
O sonho da casa própria, contudo, é pesadelo para a maior parte dos brasileiros. É inacreditável o custo de um imóvel e da construção que se ergue sobre o terreno. O avanço tecnológico permitiria edificações mais rápidas, com materiais mais duráveis, mais leves e mais baratos. Mas prossegue a via-crucis de quem primeiro encontra loteadores inescrupulosos. Não cumprem a legislação, cobram de forma eficiente e entregam deficitariamente.
O número de irregularidades fundiárias do Brasil é um dado indicador do atraso civilizatório em que nos encontramos. Continuam as ocupações em barrancos, em áreas de proteção ambiental, em reservas da natureza e em lugares inviáveis, sem qualquer estorvo por parte do Poder Público.
Ainda assim, na fantasia do pobre, ter sua casinha é o que nutre a sua luta diuturna em busca da redenção. Parece que a pandemia tornou ainda mais atraente a pretensão de um teto. A casa passou a ser, entre 2020 e 2022, o refúgio mais seguro. O lugar da “não contaminação”, a sua esperança de não contrair a peste.
Os políticos que ora só pensam em eleição e reeleição, deveriam atentar para essa aspiração do pobre brasileiro: ter sua casa, de sua propriedade, regularizada, com registro imobiliário, sua fortaleza, sua casamata afetiva, onde ele poderá gerar a prole, a salvo do nomadismo a que tantos miseráveis ainda são condenados pela vida afora.(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
JOSÉ RENATO NALINI
Desembargador aposentado, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Presidente da Academia Paulista de Letras.
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