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CONFINAR para crescer

CONFINAR

A crise não é financeira apenas. A crise é generalizada; muitas atividades foram alteradas e tiveram mudanças em seus andamentos, quer sejam de produtividade, quer sejam de elaboração. Vivemos outros tempos. Nada ficou como estava e a questão atual é confinar para crescer. Lógico deve estar que esta é a vontade de todos, crescer. Mas confinar? Que dificuldade.

Diante deste propósito, nunca pensado por nós, brasileiros, que sempre fomos poupados de grandes entraves na saúde pública, fomos apresentados ao tal isolamento social, ao distanciamento, ao confinamento. De início, palavras sem sentido e sem direção, até que a situação se tornou séria e passamos ao enfrentamento subjetivo e coletivo do coronavírus.

Será que todos conseguiremos gerenciar o estresse? Será que teremos habilidades para organizar os comportamentos adaptativos e criativos básicos para superar o recolhimento social? Como buscaremos um estado de bem-estar e de boas convivências durante a crise? No meio deste transtorno, ainda temos um grupo que defende a direita, outro que defende a esquerda e outro que não sabe nem se defende algo.

A intolerância está maior que o combate ao vírus; e as implicâncias estão crescendo e transbordando os limites da razão. Será que temos paciência para este guerra partidária ou haverá um momento que todos nos uniremos para elevar o Brasil? Eu não sei responder e não vejo muito caminho para tal união; ninguém admite largar o osso.

Os desgastes psicológicos, numa pandemia, são maiores no decorrer do confinamento. Entretanto, o isolamento é um espaço ideal para aprender, para dar vazão à criatividade, curtir espaços desconhecidos de dentro de casa. Conviver. Estudos apontam para o aumento da capacidade de enfrentamentos, para o estímulo de nossa mente, para a aproximação e conhecimento da espiritualidade tão desgastada.

Sim, claro, precisamos diferenciar alguns detalhes: nosso cotidiano fica alterado, sem possibilidades de entrar e sair de onde quer que queiramos ir, porque não vamos. Esta é a realidade. Perdemos a noção do tempo, dos dias da semana, visto que são todos iguais em qualquer hora. Não percebemos o passar da semana, quiçá do mês; passamos a ter outros critérios de organização.

Foi preciso (é preciso) que se crie um calendário próprio, para que nos organizemos de dentro para fora; com listas de atividades, com relações de livros ou revistas e filmes, com conversas pelo celular ou Whatsapp. Passamos a mexer com nossas coisas, nossos armários, nossas roupas, nossos móveis: mudamos, trocamos, doamos, mas fazemos algo com estes pertences.

A vida profissional já não é mais a mesma (aliás, sobre isso falaremos semana que vem) como nada mais será o mesmo. Tudo terá outro valor, outra dimensão, outra relação. Precisamos nos preparar para isso, pois o confinamento veio nos tirar de nossa zona de conforto. Mais do que nunca, nossa imunidade psíquica será nossa salvação.

Quando cuidamos da imunidade psíquica, criamos uma resistência psicológica que nos auxiliará a enfrentar a crise, de uma maneira ou de outra, porém há que estimular tal criação. Bons pensamentos, afastar pessoas e notícias tóxicas, movimentar-se, receber sol diariamente, garantir boa hidratação e alimentação e sobretudo aprimorar nosso sentido de fé. Seja fé naquilo que for.

Viver as emoções e saber de sua importância é fundamental nesse período, pois isso nos aproxima de nosso interior, que tanto maltratamos; o período de isolamento nos traz para dentro de nós. Entendo como um momento de boa leitura e porque não ler nosso próprio interior? E a partir propor mudanças leves mas eficazes? Excelente época para boas e edificantes transformações.

Entretanto, esta semana, vi uma cena muito triste. Um grupo de quatro senhores de boa idade, acima dos 60, certamente, de camisetinha regatas, desprotegidos e rindo de algumas pessoas que usavam máscara, na porta de um supermercado da cidade. Fiquei de longe observando a cena ridícula até que ouvi de um deles: nosso presidente abraça todo mundo e anda sem máscara. Aquilo é que é exemplo.

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E, assim, meio desanimado, termino esta crônica. Onde a sabedoria não consegue vencer a ignorância, a idiotice consegue fazer estragos. É nessa hora que se percebe que ser mais velho nem sempre é sinônimo de sabedoria. As vezes é apenas mais velho, mesmo. Com ideias gessadas, pouca flexibilidade de pensamento e estreiteza de visão; nem sempre a Vida conseguiu ensinar tudo para todos. Triste, mas real.

Vamos em frente, acreditando que podemos fazer melhor conosco. Já é o suficiente, para hoje. Forte abraço.(Foto: www.radiocidadejundiai.com.br)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology. Aluno da FATI.

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