Essa semana terminou com um psicopata sendo novamente preso após tentar – dessa vez só tentar, ao que parece -, abusar sexualmente de uma mulher em um ônibus. Antes, havia sido preso após ejacular em outra mulher e foi solto porque o fato só tinha caracterizado contravenção penal e não estupro. A essa decisão do jovem juiz seguiram-se críticas de toda espécie, algumas sérias e bem intencionadas, outras hipócritas, histéricas e objetivando somente atacar com mais um pretexto o Judiciário que, como sabemos, foi eleito pela mídia como o maior vilão do país: não funciona, é injusto, os salários são absurdos e, o que é muito grave, prende corruptos e prejudica a ladroeira empresarial e política que nos tem arruinado há décadas. Agora analisemos o dilema do juiz: era ou não para o maníaco ter sido solto?

Tecnicamente, meu colega agiu corretamente, pois a ejaculação em outra pessoa (seja homem ou mulher) é asquerosa, é nojenta, é repugnante – mas estupro não é. Ao escolher pela contravenção penal, de mera moléstia à vítima, o jovem juiz não agiu sem base jurídica; estava correto tecnicamente. Ocorre que esse é um tipo de caso em que o senso comum conduziria a uma decisão diferente, mesmo porque o sujeito não fazia isso pela primeira vez (tanto que poucos dias depois voltou a praticar o ato). Faltou experiência ao meu colega (que é muito bom juiz), pois haveria a saída da internação compulsória, o que pelo menos o “tiraria de circulação ” e faria com que o Judiciário não houvesse sido exposto como foi, tanto a críticos de boa como de má -fé. E a vítima acabou tendo uma exposição enorme, desnecessária, pelo sensacionalismo de parte da imprensa, que vende desgraças como seu principal produto.

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Mas dito isso, fica minha reflexão, de alguém que é juiz há 35 anos: ao mesmo tempo em que nunca aceitei que o juiz seja refém da opinião pública, mutável e manipulável por natureza, também compreendo a indignação e a perplexidade pela decisão de soltura, com ordem apenas para tratamento psiquiátrico (e o jovem promotor de Justiça foi o primeiro a pedir isso, frise-se). Muitas vezes ficamos entre a cruz e a espada: deveria meu colega “criar” um novo crime, o que obviamente não pode, ou “forçar a barra” e dizer que ter ejaculado equivale ao estupro, o que é o mesmo que inventar um novo crime?

Por certo não é isso o que um juiz sério faria, é foi isso que o jovem juiz, que é sério, não fez. Mas ao agir dessa maneira ficou exposto a todo tipo de críticas e ofensas, até mesmo ameaças. Ficou “marcado ” e, se sou ele, peço para sair dessas funções e ir para uma Vara Cível ou de Família, rapidinho. Mas deixo aqui minha própria opinião sobre os fatos: meu colega cumpriu a lei penal, rigorosamente; faltou-lhe a meu ver experiência para manter a custódia do maníaco; mas não pode ser sacrificado por ter cumprido seu trabalho de maneira regular e na esfera de sua competência.

Está com certeza sofrendo o dilema do que é ser juiz. Jjulgou os fatos de acordo com seu convencimento, motivou corretamente sua decisão, mas aos olhos da grande maioria foi conivente com o abuso sexual de uma pessoa claramente inocente. É o preço a pagar para quem segue minha carreira; mas só posso aplaudir quem julgou sem medo e sem curvar-se às circunstâncias desfavoráveis. Isso o leigo não entende e jamais entenderá, por não ter o destino de seu semelhante em suas mãos (por pior que seja esse semelhante). A lei e a paixão muitas vezes não se conciliam. (foto acima: newyourklawjournal.com)


DILEMACLÁUDIO ANTONIO SOARES LEVADA

Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Mestre/USP e Doutor/PUCSP em Direito Civil. Professor e Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica do Unianchieta. Professor da Pós-Graduação da PUCSP em Direito Civil. Diretor Jurídico da Associação Paulista dos Magistrados.