A região onde está Jundiaí era bem diferente há 100 milhões de anos. Depois de um deserto, a umidade chegou e a vegetação começou a tomar conta. Os dinossauros já estavam por aqui. O Jundiaí Agora entrevistou Luiz Eduardo Anelli, professor da USP que, juntamente com Rodolfo Nogueira, especialista na paleoarte, lançaram recentemente o livro O Brasil dos Dinossauros. A entrevista:

Como era a região de Jundiaí no tempo dos dinossauros (estamos falando de quanto tempo atrás?)

A Era dos Dinossauros perdurou por ao menos 160 milhões de anos, de 231 a 66 milhões de anos atrás – é importante lembrar que, como dinossauros sobreviventes, as aves deram continuidade à Era dos Dinossauros até os dias atuais. Com tanto tempo de existência, diferentes ambientes e ecossistemas se estabeleceram na região de Jundiaí, assim como em toda região Sudeste do Brasil. Porém, assim como a geologia constrói o registro geológico que nos revela como tudo aconteceu no passado, ela também o apaga por meio da erosão. É o caso de toda essa região, até o litoral paulista, onde rochas da Era Mesozoica (de 250 até 66 Milhões de anos) que certamente existiram aqui no passado foram apagadas. Dessa forma, não temos evidências geológicas diretas desse tempo nas proximidades de Jundiaí

No entanto, olhando em direção ao interior paulista, e também em rochas africanas (a África, durante boa parte da Era dos Dinossauros, estava colada na América do Sul), encontramos rochas mesozoicas com restos de dinossauros. Como que olhando um espelho, podemos imaginar como tudo era por aqui, já que eram terras próximas dessa região

Climas semi-áridos com rios temporários, alguma vegetação arbórea em regiões mais úmidas, e boa diversidade biológica podem ter prevalecido durante o período Triássico (250 – 200 milhões de anos). Nesse tempo, certamente, alguns dos mais antigos dinossauros podem ter andado pela região. No entanto, como as rochas foram apagadas nessa região, seus esqueletos são encontrados apenas em rochas no Rio Grande do Sul com idades entre 230 – 215 milhões de anos (abaixo) É um espelho próximo que podemos olhar para imaginar como poderia ser a região por aqui. É possível que algumas das mais antigas espécies de dinossauros tenham andado pela região de Jundiaí no início da Era dos Dinossauros.

Como era a geografia de Jundiaí?

Entre 200 e 120 milhões de anos, um grande deserto de dunas se instalou em boa parte da metade sul do atual território brasileiro. Embora com baixa diversidade biológica, alguma umidade e pequenos oásis sustentavam a vida dinossauriana na região. Nessas rochas nenhum osso foi encontrado, mas deixaram por lá milhões de pegadas, indicando que a vida embora pouco diversa, era animada na região de Jundiaí.

A Serra do Japi já existia?

A Serra do Japi tem uma longa história, com rochas de idades que podem chegar a dois bilhões de anos. Cerca de 300 milhões de anos atrás, uma cordilheira existia na região. Bem mais tarde, no final do período Cretáceo, 70 milhões de anos atrás, perto do fim da Era dos Dinossauros, teve início o processo de erosão que deu origem ao aplainamento do Japi. Desde então, ela vem sendo ainda mais rebaixada pela erosão. No tempo dos dinossauros deveria ser uma serra ainda mais alta, com espécies de dinossauros que suportavam bem a vida nas alturas.

Como era a vegetação?

Difícil saber devido à falta de registro geológico na região, isto é, de rochas de idade Mesozoica contendo os fósseis. No entanto, dada a aridez que predominava até a parte média do Período Cretáceo, cerca de 100 milhões de anos atrás, a vegetação deveria ser escassa, concentradas em oásis em áreas rebaixadas próximas do lençol freático, e por isso mais úmidas.

Porém, após o nascimento da América do Sul e a abertura do oceano Atlântico, mais umidade chegou ao interior, trazendo com ela maior variedade de plantas. Pinheiros, samambaias e as primeiras plantas com flores certamente figuravam nessa região.

Havia muitos dinossauros? Quantas espécies por aqui?

Seguramente os dinossauros pisaram por aqui. Rochas contendo fósseis na região de Uberaba (MG), e por todo interior paulista, contêm fósseis de mais de 20 espécies de dinossauros. Localizada entre as duas regiões, certamente foi palco de lutas, acasalamentos, reprodução e mesmo longas perseguições de dinossauros carnívoros famintos.

Quais os tipos mais comuns?

Os tipos mais comuns eram os titanossauros, pescoçudos herbívoros que no Brasil podiam chegar a 25 metros de comprimento. Dinossauros predadores abelissaurídeos também andaram por toda a região de Jundiaí.

Mais carnívoros ou herbívoros?

Sempre mais numerosos, ainda nos dias atuais, dentre os grandes animais vertebrados, herbívoros superam em número de indivíduos e de espécies predadores carnívoros, como o da foto principal, da espécie Oxalaia. Não deveria ser diferente no tempo dos dinossauros. Manadas de grandes herbívoros se reuniam a fim de unir as forças contra grandes predadores que nessa região poderiam chegar a nove metros de comprimento.

Qual o tamanho deles?

Dentre os titanossauros estava o gigante Austroposeidon, herbívoro que viveu no final do período Cretáceo cerca de 70 milhões de anos atrás. Ao lado de outro titanossauro, o Uberabatitan, é o maior dinossauro a ter pisado nossas terras. Porém, pequenos dinossauros predadores com um ou dois metros de comprimento eram igualmente muito comuns nas paisagens.

Já encontraram muitos fósseis por aqui? Existe algum lugar específico na região de Jundiaí que pode ser considerado um sítio paleontológico?

Não. Jundiaí está sobre rochas ígneas muito antigas, um tipo de rocha que não contém fósseis porque foi formada quilômetros abaixo da superfície. Rochas sedimentares mais recentes, com cerca de 500 milhões de anos, e que podem conter fósseis, também ocorrem nessa região, mas foram muito alteradas pela dinâmica terrestre e não mostram restos de animais fossilizados. Desse modo, não existem sítios paleontológicos na região. Todos os dinossauros ilustrados acima podem ter transitado ou mesmo vivido na região. No entanto, sem as rochas certas, não existem evidências materiais como ossos ou mesmo pegadas.

O restante do país era muito diferente da região de Jundiaí ou não?

Sim. Assim como hoje o clima, a vegetação e as paisagens variam com a latitude, proximidade do oceano e relevo, no passado também. A região norte do Brasil durante o período Cretáceo possuía regiões mais úmidas, onde viviam outras espécies de dinossauros.

Quantos animais foram catalogados até agora?

Sabemos hoje que no Brasil circularam ao menos 40 espécies de dinossauros, incluindo algumas conhecidas somente pelas pegadas que deixaram, dentes, ou restos de esqueletos bastante incompletos. Muitas outras ainda serão descobertas se as pesquisas receberem financiamentos nas várias universidades onde trabalham nossos paleontólogos.

Como foi a produção do livro?  Mapear todos os dinossauros que viveram no Brasil não deve ter sido tarefa fácil…

Venho escrevendo livros sobre dinossauros há anos, e por isso tenho muita familiaridade com as espécies, suas idades, local de ocorrência etc. No entanto, nesse livro, a grande novidade foi ter dado a mesma importância dada aos próprios dinossauros, à reconstrução das paisagens onde viveram, às plantas e outros animais com os quais conviveram, em todos os sítios paleontológicos do Brasil onde atualmente podem ser encontrados. Ilustrado por Rodolfo Nogueira (os dois abaixo), um ótimo e premiado paleoartista brasileiro, o livro ganhou uma dimensão e qualidade superior a tudo o que já foi feito sobre a pré-história nacional. Este livro será ainda este ano transformado em uma grande exposição no parque do Ibirapuera, desta vez apenas com dinossauros brasileiros.

Como deve proceder quem quiser comprar o livro?

O livro está à venda em várias livrarias, mas pode ser encontrado na internet em Livraria Panapaná, onde posso enviá-lo com dedicatória. Para isso basta acessar http://bit.ly/2n0kDhI

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