A doçura, muitas vezes associada a uma fragilidade ou a uma ingenuidade excessiva, é, na verdade, uma qualidade profunda e complexa que vai além das primeiras impressões. Ser doce não é sinônimo de ser submisso, fraco ou desprovido de memória e percepção. Pelo contrário, a doçura é uma virtude de pessoas que, embora cientes da realidade dura que as cerca, escolhem agir com bondade, empatia e sensibilidade.
A doçura é uma virtude das pessoas civilizadas; em sociedades civilizadas, onde a convivência harmoniosa e o respeito mútuo são pilares fundamentais, a doçura emerge como um elemento essencial. Ela representa a capacidade de ouvir, compreender e acolher o outro, mesmo em momentos de conflito ou divergência.
Pessoas doces são aquelas que, em vez de reagirem com agressividade ou indiferença diante do erro alheio, optam por uma abordagem mais gentil e compassiva. Essa postura não denota fraqueza, mas sim um profundo entendimento das dinâmicas humanas e um compromisso com a construção de relações mais saudáveis e equilibradas.
A civilidade está intrinsicamente ligada à capacidade de controlar impulsos, de ponderar antes de agir ou falar. A doçura, nesse contexto, é uma manifestação desse autocontrole, uma escolha consciente de não perpetuar a violência, seja ela verbal, emocional ou física.
Ser doce é, portanto, uma demonstração de força interior, de maturidade emocional e de uma sabedoria que reconhece o valor da paz e da conciliação. A doçura e a empatia correspondem a compreensão da dor alheia. E uma das características mais marcantes das pessoas doces é habilidade de perceber e se sensibilizar com a dor do outro.
A empatia, entendida como a capacidade de se colocar no lugar do outro e de sentir o que ele sente, é uma qualidade que anda de mãos dadas com a doçura. No entanto, é crucial entender que essa empatia não significa ignorar ou minimizar a própria dor.
Pessoas doces não são aquelas que se anulam ou que colocam as necessidades dos outros acima das suas a ponto de se autossacrificarem. Pelo contrário, a verdadeira doçura reside na habilidade de equilibrar a atenção entre o sofrimento próprio e o do outro, buscando formas de aliviar a dor alheia sem se esquecer de si mesmas.
Essa capacidade de transformar a vida do outro em algo bom, mesmo quando se está passando por momentos difíceis, é um traço de grandeza de espírito. A doçura, nesse sentido, não é uma negação da própria dor, mas sim uma escolha de não permitir que essa dor contamine a relação com o outro. É a habilidade de, mesmo em meio à escuridão, acender uma luz que possa guiar e confortar aqueles que estão ao redor.
Porém é preciso entender que doçura não é fraqueza: uma das maiores falácias em torno da doçura é a ideia de que ela está associada à fraqueza, esquecimento. Ser doce, para muitos, é visto como ser vulnerável, ser facilmente manipulável ou não ter capacidade de se impor.
Entretanto, essa visão é profundamente equivocada. A doçura, quando verdadeira, é uma manifestação de força e resiliência. Pessoas doces são aquelas que, mesmo diante da dureza do mundo, conseguem manter sua essência, não se deixando amargurar ou endurecer pelo sofrimento.
Ser doce é ter a coragem de ser vulnerável sem medo, é saber que a gentileza não é sinônimo de submissão, mas sim de uma força que não precisa recorrer à violência para se afirmar. É, acima de tudo, ter a confiança de que a verdadeira fortaleza não está na agressividade ou na imposição, mas na capacidade de manter a serenidade e a compaixão mesmo diante das adversidades.
Doçura e memória funcionam como percepção do erro alheio e a compreensão deste fato. Este é um aspecto importante a ser considerado: é a relação entre a doçura e a memória, especialmente no que tange à percepção do erro alheio, mostrando que não se deixe de ser doce, quando se fala energicamente ou firmemente.
Ser doce não significa ser condescendente ou fechar os olhos para as falhas e transgressões dos outros. A verdadeira doçura envolve a capacidade de reconhecer o erro, de entender suas causas e, ao mesmo tempo, de escolher não alimentar rancor ou ressentimento.
Pessoas doces são aquelas que, mesmo reconhecendo as falhas dos outros, optam por uma abordagem que visa à reconciliação e ao crescimento mútuo. Elas não ignoram o erro, mas também não permitem que ele se torne uma barreira intransponível. A doçura, nesse sentido, é uma manifestação de uma visão de mundo que valoriza a reparação, o perdão e a construção de um futuro melhor, onde os erros são oportunidades de aprendizado e não motivos de divisão.
Em suma, ser doce é uma escolha de vida que requer coragem, força e sabedoria. É uma virtude que transcende a simplicidade da bondade superficial e se enraíza em uma profunda compreensão das complexidades humanas. É uma nobreza de caráter e um dom do espírito…
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OS DIFERENTES SÃO IMPRESCINDÍVEIS
A doçura é, acima de tudo, uma força transformadora, capaz de mudar não apenas a vida daqueles que a praticam, mas também a daqueles que a recebem. Em um mundo cada vez mais marcado pela dureza e pela indiferença, a doçura se destaca como um farol de esperança, indicando que é possível viver de forma plena e significativa sem perder a ternura.
Entendo como muito adequada a frase de Che Guevara: “Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás”. Prova incontestável de que a doçura não nos cega tampouco nos desmemoriza, apenas nos conduz de forma mais adequada, mais suave.(Foto: cena do clipe ‘California Gurls/Katy Perry)
AFONSO ANTÔNIO MACHADO
É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Leciona na Faculdade de Psicologia UNIANCHIETA. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.
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