A agonia das nossas ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS

estações ferroviárias

Quem não se lembra da emoção de esperar os parentes de longe, amigos e até “seu amor” nas plataformas das estações ferroviárias interior afora? O vaivém de passageiros e pessoas que aguardavam seus entes queridos chegarem a bordo dos trens. A clássica “sala de senhoras”. O soar do sino e o apito do guarda da estação. Sons e imagens que ficaram no passado e não voltam mais. Os projetos até agora existentes abrangem somente as regiões metropolitanas. Os chamados “trens de longo curso” não voltarão a encostar nas dezenas de estações espalhadas pelo interior paulista para dar embarque e desembarque a passageiros.

Como estão essas estações hoje? Tempos atrás comecei a coletar imagens dessas estações, não só através de pesquisas na internet e sim pessoalmente, afinal, muita coisa não se encontra no meio virtual e gosto de estar presente, constatar a realidade.

Jundiaí perdeu sua “estaçãozinha”, aquela mais próxima ao centro. Louveira conseguiu restaurar sua estação, bem antes de nossa estação “vilarense”, sendo que Jundiaí atende passageiros do metropolitano, Louveira não. Por Louveira passa o transporte de carga e eventualmente surge algum transporte turístico, que é o projeto do governo para dar vida a pequenos trechos; isto graças principalmente ao empenho de grupos e associações ligadas à memória ferroviária. Se não fossem os cidadãos, possivelmente nada teria saído do papel.

Seguindo direção interior, a outra restaurada foi a de Campinas, que virou espaço cultural, para artes, música, exposições, enfim, eventos variados. Conforme avançamos, o cenário vai se alternando. Estações sobrevivendo às intempéries, em razoável estado de conservação, outras “caindo aos pedaços” e ainda as que sequer existem, já sumiram do mapa, como nossa “Estação do Horto”, que era próxima ao Parque Centenário. As que estão em estado razoável, acreditem… estão assim porque há famílias residindo. E havendo moradores, zelam pelo local, evitando que virem abrigos de pessoas em situação de rua, usuários de entorpecentes e a destruição por atos de vandalismo, como incêndio.

Neste mês de março visitei a de Torrinha, no trajeto ferroviário em direção a Bauru e Panorama. A administração está cuidando do local, que já ganhou área verde, um parque ao lado e há família que toma conta. Dessa forma, a clássica estação consta em catálogos de roteiros turísticos do município. O visitante não irá se decepcionar. O mesmo acontece em outra ferrovia paulista, a Sorocabana. Laranjal Paulista revitalizou totalmente sua estação e transformou em espaço cultural(foto principal). Embora estivesse fechado, não sei se devido a pandemia ou por ainda estar em trabalho de implantação, o visitante não perde a viagem, o local é limpo, permite fazer boas fotos e descansar, apreciando o entorno, com as casas da Vila Ferroviária quase nada modificadas, até as antigas árvores lá estão, nos remetendo aos tempos da Maria-Fumaça.

No entanto, são casos pontuais. Pouco além de Laranjal, está a Estação de Pereiras(foto acima), que fica isolada, distante da área central do município cerca de seis quilômetros. Na Rodovia Marechal Rondon há placa indicando Estação de Pereiras. Mas o visitante encontrará, a princípio, somente a vila. Vila da estação. Para achar a estação ferroviária não há placas indicativas, o visitante precisa recorrer a informações dos moradores da pequena vila ou ficar procurando, na intuição. Eu sabia mais ou menos a localização dela, mas por estar escondida entre árvores e demais construções que surgiram no entorno, precisei pedir informação. E recebi a informação completa, que está com uma família residindo. A construção lá está, em ruínas, por isso o interesse em vê-la causa certa curiosidade aos moradores. E as ruínas estão em pé porque também há moradores no local, que criam um ambiente possível para sobreviver e evitam a demolição total, pelo tempo ou por atos de vandalismo e furto de telhado, tijolos, etc.

Além das pessoas que vivem no local, a companhia de animais, da fauna é constante. Misturam-se as criações, animais domésticos como cães, galos, galinhas, com animais silvestres, inclusive aves, que promovem uma sinfonia diversificada, das mais conhecidas, como das rolinhas, às mais raras, como do fogo-apagou. Os dormentes podres, os trilhos que até dão impressão de estarem tortos conforme o ângulo que se observa, sustentam os velhos trens cargueiros que passam duas, três vezes ao dia, se arrastando a 30, 40 por hora como que milagrosamente por aquela via, que nos remete àqueles tempos que víamos passageiros na expectativa da chegada do comboio, veloz, requintado, com funcionários uniformizados, portando crachás e quepes. Conseguir visualizar esse cenário saudosista num cenário real, tomado pelo mato que cresce em meio aos trilhos, em alguns pontos cobrindo-o, gera uma mistura de sensações, prevalecendo a tristeza… relembrando aqui que o nosso atual Novo Horizonte, que se chamava Varjão, teve ainda, antes, o apelido de “trem da tristeza”, adotado pelos primeiros moradores, que ergueram barracos sobre o leito da Sorocabana, que por estes campos de cultivo de uvasjundiaienses e itupevenses nasceu como Ytuana.

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Assim, nossos velhos leitos ferroviários escancararam dois problemas crônicos de nosso país e principalmente de nosso território paulista. O descaso das autoridades, governos, desde o federal, passando ao estadual, chegando aos municipais, frente ao modal ferroviário de passageiros. E o problema social dominante. Na morte de nossas ferrovias, a parcela mais vulnerável da população foi se instalando aos trancos e barrancos nesses espaços que parecem não ser de ninguém. Junto às vilas ferroviárias, cresceram novas vilas, núcleos de submoradias. E muitas estações, ao Deus dará, se tornaram lar de algumas famílias… que acabam tomando conta, zelando por um patrimônio federal, estadual, de nossas cidades… que enriqueceram graças aos trens, ao modal ferroviário. O lado mais frágil salva o pouco que restou dos gloriosos tempos dos trens de passageiros… enquanto autoridades políticas discutem infinitamente de quem é a responsabilidade pelo pontapé inicial e o que fazer conforme cresce a consciência da população sobre a falta que os trens fazem ao povo, principalmente à população de menor poder aquisitivo.

GEORGE ANDRÉ SAVY

Técnico em Administração e Meio Ambiente, escritor, articulista e palestrante. Desenvolve atividades literárias e exposições sobre transporte coletivo, área que pesquisa desde o final da década de 70.

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