O GRITO DO IPIRANGA e o poder da palavra

grito

Neste mês de setembro, quando se comemoram os 200 anos da Independência do Brasil, muito foi e será escrito em referência, portanto, será inútil aludir a esse assunto. Mas, para não deixar de fazer um registro, irei “na contramão da História” e citarei uma polêmica antiga sobre o acontecimento. Nosso grande escritor Machado de Assis, digno de toda credibilidade, deixou-nos uma interrogação sobre a veracidade do famoso Grito do Ipiranga. Em uma crônica escrita em 15 de setembro de 1876, 54 anos depois do acontecimento, Machado de Assis publicou na revista “Ilustração Brasileira”, do Rio de Janeiro:

“Grito do Ipiranga? Isso tinha crédito antes de um nobre amigo, Dr. Joaquim Antonio Pinto Júnior, reclamar pela “Gazeta de Notícias” contra essa lenda de meio século. Segundo o ilustrado amigo paulista, não houve nem grito nem Rio Ipiranga! Durante 54 anos temos visto a repetição de uma coisa que o ilustre amigo declara não ter existido.

Sem dúvida, houve resolução do Príncipe D. Pedro, a independência, a desobediência e o mais; porém não foi, positivamente um grito, nem ele se deu às margens do célebre ribeiro! Informou, ainda, o ilustre Dr. Joaquim que o humilde e cristalino ribeiro só emprestou seu nome à nossa História porque assim quiseram os primeiros escritores do fato.

Minha opinião é que a lenda é mais bonita do que a história autêntica. Eu também prefiro o Grito do Ipiranga, pois é mais sumário, mais bonito e mais genérico”.

Corroborando com o citado na crônica de Machado de Assis, vamos encontrar uma declaração do artista Pedro Américo, autor do quadro “O Grito do Ipiranga”, pintado em 1888, 66 anos depois. Ao ser criticado pelos exageros cometidos na obra, disse:

“Não há sentido em ser historicamente fiel na arte. O “Grito do Ipiranga” quer trazer a grandiosidade do evento para convencer quem o vê que a Independência deve ter uma relevância memorável. Se o Regente estava montado numa mula e o local era ermo, pouco importa”.

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Reportando-me ao título, conforme informam os estudiosos da psiquê, o poder da palavra no cérebro é fortíssimo e, de tanto se repetir algo, o subconsciente o aceita, diz sim e torna realidade o que foi declarado. O povo, em geral, gosta do fantasioso, da imagem bonita, da grandiosidade.

Imagens e palavras são armas poderosas. Ficam registradas para sempre! Salve “Sete de Setembro”! Salve o ducentenário da Independência!(Foto: cena do filme ‘Independência ou Morte’, de 1972)

JÚLIA FERNANDES HEIMANN

É escritora e poetisa. Tem 10 livros publicados. Pertence á Academia Jundiaiense de Letras, á Academia Feminina de Letras e Artes, ao Grêmio Cultural Prof. Pedro Fávaro e á Academia Louveirense de Letras. Professora de Literatura no CRIJU

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