Muito temos ouvido sobre loucuras e perversões, mas poucas vezes conseguimos ter clareza na diferença entre uma e outra palavra (e atitude). Vale a pena ressaltar que há muita distinção entre uma e outra palavra: louco é louco. Perverso é perverso. Por isso estaremos conversando sobre este tema, bastante oportuno para nosso momento histórico e cultural brasileiro. Começando por definições clássicas, da literatura técnica e acadêmica, temos que louco é aquele cujo comportamento ou raciocínio denota algumas alterações patológicas mentais; seus atos e palavras parecem extravagantes, desarrazoados. Está sempre flanando e contatando seu mundo interno.

Cuándo, de repente, detras de unárbol, se aparece el.

Mezcla rara de penultimo linyera

Y de primer polizon teenel viaje a Venus.

Medio melón en la cabeza,

Las rayas de la camisa pintadas en lapiel,

Dos medias suelas clavadas enlos pies

Y una banderita de taxi libre levantada en cada mano.

Parece que solo yoloveo,

Porque él pasa entre la gente y los maniquíes le guiñan,(*)

Atualmente, na concepção teórica da Saúde Mental temos que a loucura é entendida essencialmente como um fenômeno de intolerância e exclusão da vida social, de modo que exista um distanciamento, um afastamento daquele tido como louco, pelo fato dele ser visto como doente mental, digno de uma condução a internação hospitalar, ainda que contra sua vontade, com o fim de ser isolado. Por isso, a internação passa a ser vista como o auge da exclusão social, e não um meio contrário à intolerância. Exclusão social, em toda a forma e por motivos icônicos.

https://youtu.be/Y0e6hY2SxPs

Percebemos, assim, que a Saúde Mental atribui ao social (incluindo a própria Psiquiatria e suas técnicas para controle da loucura) o determinante das ações (reações, portanto) do louco em busca de sua autonomia subjetiva desautorizada: ele age fora dos parâmetros sociais e culturais de seu grupo (ele bate fora do bumbo). Na mesma linha, a Saúde Mental percebe o louco como a pessoa desautorizada de seus atos, transferindo para o orgânico doente a autoria de suas ações: por isso a medicalização.

Notemos que, ao longo da história, o louco foi aquilo que a cultura da época impunha: de santo a demônio, lixo, ameaça social…. Jamais cidadão e sujeito de direitos. Um cidadão de segunda categoria, desqualificado e incapaz e, com o iluminismo e o positivismo a loucura passou a ser algo não-humano, fazendo o contra-ponto da razão cartesiana. Aos loucos não se aplica o “cogito, ergo sun” (penso, logo existo), pois são dados como aqueles que não atinam, que não pensam, que não agem pela razão. Não passam de loucos. E louco é louco…

Y asi diziendo, el loco me convida

A andar en su ilusión super-sport

Y vamos a correr por lascornisas

¡con una golondrina en el motor!

De Vieytes nos aplauden: “¡Viva! ¡Viva!”,

Los locos que inventaron el Amor,

Y unángel y un soldado y una niña

Nos dan un valsecito bailador.

Nos sale a saludar la gente linda…

Y loco, pero tuyo, ¡qué sé yo!:

Provoca campanarios con su risa,

Y al fin, me mira, y canta a media voz(*)

Entretanto, o atual Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria, elenca 157 tipos dos mais variados transtornos mentais, dentre eles: Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor, Transtorno de Acumulação, Transtorno de Escoriação; diante disso temos que para o DSM-5 é difícil falarmos em normalidade, quando o assunto é saúde mental.

Comenta-se que louco é aquele sujeito que perdeu a razão, que tem pensamentos e ações sem sentido, rasga dinheiro e dorme no tempo, tem comportamentos distorcidos que fogem à regra: é o que conhecemos como a “alienação mental”, de Philippe Pinel, o pai da psiquiatria moderna, cujo sobrenome virou sinônimo de loucura, perpetuando seu nome nas ações que desenvolveu na França entre o final do século XVIII e o começo do século XIX. Bem mais: louco é todo o apaixonado, o amante, o boêmio.

Louco é o sujeito que canta e uiva para a Lua, que corre e deita nas enxurradas, banha-se da chuva e do luar, chora abraçado à árvore, rola na areia da praia, tem medo da sua própria sombra trava diálogo com cachorros de rua e gatos que perambulam pelos becos, altera seus comportamentos em noites de lua cheia (a lua dos amantes), canta para as estrelas, veste-se de trapos, alimenta-se de ilusões, taciturnos e perspicazes, mas inofensivos e poéticos.

Y asi diziendo, el loco me convida

A andar en su ilusión super-sport

Y vamos a correr por las cornisas

¡con una golondrina en el motor!

De Vieytes nos aplauden: “¡Viva! ¡Viva!”,

Los locos que inventaron el Amor,

Y unángel y un soldado y una niña

Nos danunvalsecito bailador.

Nos sale a saludar la gente linda…

Y loco, pero tuyo, ¡qué sé yo!:

Provoca campanarios con su risa,

Y al fin, me mira, y canta a media voz (*)

O louco é louco é difere-se do perverso. Este é um sujeito que está para além do limite, ou pelo menos, para além do limite do neurótico. Traz sintomatologia contrária da Neurose, que é baseada no Recalque; o perverso não aceita a castração nem a frustração e geralmente age a partir do que chamamos de Negação, ou Desmentido, com atitudes impulsivas e de grande alarme, buscando a notoriedade e a visibilidade. Os manuais relatam que, normalmente, a pessoa perversa se sente superior, é manipuladora, bem impulsiva e usa de todos os recursos possíveis para seduzir.

Para os perversos, mentiras e transgressões de normas fazem parte doseu modo operante, sem que tenha sentimento de culpa ou remorsos por algo que deu errado. Estes, os perversos, desejam o poder e podem adotar práticas estranhas e deliberadamente perigosas na tentativa de submeter o outro ao seu desejo, ainda que leve tudo a destruição e derrocada. Age obstinadamente. A perversão não tem cura, vem como avalanche, destruindo tudo aquilo que encontra em seu caminho, sem avaliar o poder do esfacelamento.

Estudiosos sugerem que a perversão é um desvio de comportamento, apontado como um dos tripés das psicopatologias, juntamente com a neurose e psicose. Popularmente, o termo é utilizado para sugerir uma espécie de “depravação”, mas os especialistas trabalham num campo muito mais amplo: analisam o fato da perversão estruturar-se sobre uma vontade explícita de transgredir a ordem natural das coisas, de perturbar a norma social, de modo a garantir seu poder ou crescimento. Trata-se de um fenômeno social, físico, político e estrutural. Para além da questão mental, unicamente.

Trepate a esta ternura de locos que hayenmí,

Ponete esta peluca de alondras, ¡y volá!

¡Volá conmigo ya! ¡Vení, volá, vení!

Queremeasí,

Abritelos amores que vamos a intentar

La mágica locura total de revivir…

¡Vení, volá, vení! ¡Trai-lai-la-larará! (*)

A pessoa perversa está sempre buscando o seu prazer, continuamente, tanto em seus comportamentos esdrúxulos bem como em suas fantasias anormais e inconsistentes. Sim, o diagnóstico da perversão é complexo, sendo necessário considerar além dos sintomas, toda a experiência do sujeito, suas relações e seus comprometimentos com o social. Além disso, segundo seu comportamento, o paciente poderá se encaixar em um destes três tipos de perversão: exagero ou diminuição de algo, compromisso com a transgressão ou inversão e dissociação. Interessante notar, especificamente dois destes, para que tenhamos idéia da diferença entre o louco e o perverso.

Quando pensamos naquele perverso, que tende ao exagero ou a diminuição de algo, percebemos que a pessoa estereotipa comportamentos, que passam a ser não só desejados, mas necessários para que haja o seu prazer, o seu direito ao gozo. O perverso não o faz de forma eventual, como parte de uma fantasia. Ele planeja, arquiteta, faz e usa de esmero em suas atitudes e ações, mostrando que depende do êxito de sua atuação maldosa de forma incondicional e com exagero.

Já, aquele cujas ações sugerem a inversão e a dissociação, nega a norma estabelecida e toma um “atalho” na hora de viver a sua vida. Parece estar fora do contexto, parece não estar nem ai, não se preocupa com toda a corrente que está em direção oposta, não se atenta para as posições assertivas de todo um conjunto de pessoas. Ele é o oposto. Sempre está na outra margem, com suas regras próprias e seus pensamentos contrários a ordem, simplesmente por falta de enquadramento. É marcadamente a ideia de desvio, e essa negação da norma é a estratégia escolhida para reafirmar sua força.

Finalmente, os que tem o compromisso com a transgressão: este sujeito não está disposto a respeitar a moral, a lei, a ordem, os postulados e axiomas e nem tão pouco os costumes. Em seu compromisso de transgredir perverte a norma, com naturalidade e rigor, afirmando ou negando um conjunto de costumes, imprimindo a sua regra e a sua ordem. Vive acima do bem e do mal e não percebe seu grau de maldade ou de ignorância. Desta maneira torna-se perverso e manipulador, agindo no impulso e forma tal que se sinta superior a tudo e a todos. Mente e atropela as normas rotineiras sem nenhum sentimento de culpa, buscando sempre a sensação de poder. Escamoteiam a verdade e burlam as seguranças com maestria.

A loucura, quando bem encaminhada e acompanhada, pode restabelecer seu portador a uma vida social adequada, com propostas de boa convivência social. Já o perverso, de acordo com algumas deformidades de caráter, dificilmente têm interesse no convivo social, mesmo porque sempre buscará assumir a posição de “reizinho inconsequente”, tomando posturas sempre destrutivas e maléficas. Por isso que louco é louco e perverso é perverso. Será preciso desenhar? (*) Balada Para un Loco: Tango de Astor PiazzollaFoto: Cena do filme ‘Coringa’, Warner Bros/2019/Divulgação)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology. Aluno da FATI.

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