Grandes ideias nascem, na maioria das vezes, da necessidade. Em alguns setores, como a indústria automotiva, por exemplo, essa máxima é uma constante.
Na maioria das vezes, para não perder vendas, novos produtos são criados, repaginados e revividos… Sem exceções, eles levam em conta as tendências do mercado, a manutenção das vendas e dos lucros e, finalmente, os sonhos do consumidor.
No fim das contas, vender automóveis ainda é vender sonhos… Sonho de ter a liberdade de sair por aí sem rumo, de circular livremente entre o ponto A e o ponto B, sem grandes esforços… Ah, e tem também aqueles que encontram nessas máquinas uma maneira de exibir suas conquistas. Não importa se você é um cara que lutou a vida inteira para poder circular orgulhosamente num carro popular ou alguém que se superou e tem condições de ter um carro caríssimo, que curiosamente é chamado de carro dos sonhos.
Para a estreia da nova editoria de automóveis, o Test Drive, aqui no Jundiaí Agora, que conta com conteúdo exclusivo do website AutoMotori, escolhemos contar a história de um projeto que nasceu nos anos 60 da necessidade de trazer um produto novo, que despertasse o desejo dos consumidores que queriam um esportivo acessível, rápido e barato, fácil de dirigir e de estacionar.
Aproveitamos o lançamento do Mustang no Brasil,para contar uma história bem legal, cheia de curiosidades, idas-e-vindas, de fracassos e sucessos, que já dura mais de 50 anos.
Vídeo história Mustang!
Bom, para começar, a Ford ensaia há décadas trazer oficialmente o Mustang para o nosso mercado. Os carros que você vê circulando por aí chegaram por meio de importadores independentes, ou seja, sem as garantias de manutenção e de peças oferecidas pelo fabricante.
Esta curiosa história de sucesso, de um dos carros esportivos americanos mais cultuados do cinema, começou oficialmente em 17 de abril de 1964. A primeira aparição pública do Mustang aconteceu na Feira Mundial, em Flushing Meadows, Nova Iorque. Foi ali que a Ford apresentou o esportivo acessível, batizado de Mustang, um carro com o nome foi inspirado no lendário avião de caça da Segunda Guerra Mundial (P-51 Mustang) e nos cavalos selvagens que corriam livremente pelas pradarias do País.
Como era pequeno em relação aos esportivos americanos da época ele inaugurou um segmento batizado de “Pony Cars”, ou Carros Pônei em bom português. Uma curiosidade: no lançamento, o Mustang custava 2.368 dólares, a bagatela de 8 mil reais ao câmbio de hoje…
As vendas começaram na Feira e, apesar de ainda ser o ano de 64, o carro foi lançado como modelo 1965. Por este motivo, a primeira geração do esportivo ganhou o curioso apelido de “Mustang 64 e ½”.
De cara fez um enorme sucesso e bateu a marca de 120 mil unidades ainda em 1964! Um golaço do time de engenharia e do comercial da Ford, tanto que ao final dos dois primeiros anos, o Mustang já havia vendido mais de 1 milhão de exemplares. Hoje, os modelos da primeira geração, desde que bem conservados, são valiosos e cobiçados itens de coleção. O primeiro Mustang feito, um conversível branco, que virou carro-madrinha das 500 milhas de Indianapolis, foi vendido num leilão no ano passado pela bagatela R$ 3,7 milhões de reais…
O galope do Pônei
Desde os anos 50 os carros americanos eram enormes e beberrões. O pessoal da Ford percebeu que existia um nicho nesse mercado, com consumidores inspirados pelo sucesso dos esportivos europeus. Carros rápidos, fáceis de manobrar e estacionar. Menores, mas sem abrir mão da potência dos motores da época.
O Mustang, um carro compacto para os padrões norte-americanos da época, oferecia linhas esportivas e uma gama de motores que ia dos “pequenos” seis cilindros, nas configurações de entrada, aos poderosos V8, das versões mais caras.
A gasolina barata e farta estimulava as fábricas norte-americanas fazerem motores cada vez maiores e beberrões. A farra durou até a primeira crise mundial do petróleo, em 1973. De um dia para o outro a gasolina sumiu dos postos, que viviam com longas filas e vendas racionadas. E foi essa crise que pegou muitas fábricas de calças nas mãos…
Crise do petróleo e o fracasso do Pinto
Mas nem tudo foi glória…. No meio de 1974, a toque de caixa, a Ford resolveu que era hora de projetar a segunda geração do Mustang, com motores menores e mais econômicos. E o que era uma oportunidade acabou virando um fiasco… O modelo desagradou os consumidores, que se negavam comprar um carro que usava a mesma plataforma do Ford Pinto, outro retumbante fracasso da Ford, criado para o recém-chegado segmento dos carros compactos.
O Ford Pinto, era apertado e inseguro. Esse compacto de baixo custo, foi criado para enfrentar a chegada dos carros japoneses e atrair consumidores que fugiam da disparada nos preços da gasolina. Só que o carro tinha um defeito, literalmente explosivo. Por erro de projeto, o tanque de combustível foi posicionado atrás do eixo traseiro e explodia em caso de uma forte colisão traseira. Foram milhares de casos e a montadora respondeu a uma montanha de processos criminais por anos e pagar multas de centenas de milhões de dólares para encerrar as ações.
Voltando ao Mustang, as vendas despencaram e, mesmo assim, a terceira geração só apareceu quatro anos depois, em 1978.
Um pônei em risco de extinção
Se não acertasse no novo projeto, a Ford ameaçava eliminar o Mustang de sua linha de veículos. Em 1979, chega a terceira geração, desta vez montada sobre uma nova plataforma, com mais espaço interno. Enfim, o Mustang cresceu e voltou a aparecer.
Maior e mais bonito, o novo carro resgatou um pouco da imagem que havia sido construída pelo Mustang original. E graças aos acertos, esta foi a geração mais duradoura, comercializada por 14 anos, entre 1979 e 1993. Ao longo desse tempo, apenas pequenas mudanças estéticas nos faróis, grade e pequenos detalhes. Pura perfumaria, que se tornou responsável por uma queda lenta e gradual nas vendas…
E assim nasceu a quarta geração
Em 1994, a Ford surpreendeu o consumidor com um Mustang totalmente novo e o melhor, inspirado no ícone de 30 anos antes. Os projetistas fizeram uma releitura para o gosto da época, mas algumas linhas originais dos primeiros Mustangs estavam lá. E a quarta geração finalmente devolveu ao esportivo o espaço perdido nos anos anteriores. A geração 4 viveu dias de glória por exatos 10 anos, até que em 2004 a Ford resolveu resgatar de verdade, sem modismos e filtros exagerados de estilo, a pureza da primeira geração. Outra providência: ampliar a oferta de motores. Ao lado do eficiente V6, eles resgataram os potentes motores V8, mais econômicos e limpos.
E o Mustang se reinventou!
Finalmente, para o deleite dos fãs, em 2005 chega a quinta geração, a mais fiel da história do esportivo! Um carro responsável pelo sucesso e o respeito pelo ícone, que cresceu em todo o mundo. Com vendas em alta, o simpático pônei, com espírito de cavalo selvagem, reconquistou o coração do consumidor. A quinta geração cresceu um pouco mais quando comparado à anterior. Mas um fato que ainda incomodava no carro, persistia: A suspensão traseira ainda usava eixo rígido, mais pesada e que comprometia uma tocada mais esportiva. Sobraram críticas da imprensa especializada, dos fãs e dos compradores.
Ok, o carro não tinha uma suspensão traseira sofisticada e de alta performance, mas o preço era muito atraente, e isso era o que vendia…
E o pônei virou garanhão!
Finalmente, em 2014, o Mustang chegou à sexta geração. De lá para cá o carro não parou de evoluir. O visual do modelo, atualizado no final do ano passado, deixou o carro com aparência agressiva.
Debaixo da carroceria, maior e mais rígida, o Mustang deu um salto tecnológico que o deixou mais rápido, mais seguro e perfeito para pilotar numa pista de corrida… Tá, mas e o carro feito para o dia-a-dia? Também está lá!
Graças à eletrônica, o novo Mustang ganhou dupla personalidade. Consegue ser um carro gostoso para usar para ir ao trabalho, ao mercado, ou viajar, e consegue se transformar num autêntico Muscle Car. Tudo ao toque de alguns botões…
O modelo 2018 chega com uma aerodinâmica (que é a capacidade de cortar o ar e gerar força para manter o carro no chão) mais apurada e todos os aparatos modernos,
como central multimídia, painel eletrônico configurável, além de um moderníssimo câmbio automático de 10 marchas que permite ao V8 aproveitar toda a sua força.
A suspensão traseira? Continua com eixo rígido, mas com vários pontos de apoio e amortecedores com tecnologia Magne Ride que permitem mudar a viscosidade do óleo do seu interior através de pulsos magnéticos. Não entendeu? Vou explicar… O que deixa um carro mais estável é a suspensão mais dura, certo? Mas num carro duro, que pula e bate a cada buraquinho que você passa, o conforto é sacrificado.
Quem define uma suspensão ser mais firme ou macia são os amortecedores. O sistema, batizado com o complicado nome de magneto reológico, traz dentro dos amortecedores óleo impregnado por partículas metálicas. Quando você seleciona no painel do carro que quer dirigir de maneira esportiva, o sistema ativa uma carga magnética dentro do amortecedor, fazendo com que as partículas de metal se agrupem, deixando o óleo mais grosso, viscoso e o amortecedor mais duro. Entendeu?
Esse sistema, que apareceu primeiro nas Ferraris, acaba proporcionando uma boa performance tanto da suspensão dianteira quanto da traseira.
(Vídeo novo Mustang V8 em movimento.)
Considerado o melhor Mustang de todos os tempos, o modelo chega ao Brasil na versão de topo de linha batizada de GT Premium. Ele usa o novo motor V8 5.0 litros de 466 cavalos, transmissão automática de 10 marchas, com opção de trocas no volante. Esse conjunto faz com que o esportivo acelere de 0 a 100 km/h em 4,3 segundos e chegue à velocidade máxima de 250 km/h, que foi limitada eletronicamente.
Ah, e antes que eu me esqueça: para rodar por aí com um carro com tanta história é bom preparar o bolso. O Mustang GT é vendido na rede de concessionários Ford por R$ 299.900.
Joaquim Rimoli é jornalista automotivo há 25 anos, apaixonado por tudo que se move (de carrinhos de corda a jatos supersônicos). Durante 12 anos comandou o Programa Auto Esporte, da Rede Globo, e é criador do site AutoMotori.