Década de 80. Ao dar sinal para o ônibus numa rua, subíamos pela porta traseira. E ali estava o cobrador. Mas havia vários assentos na parte de trás, antes da catraca. Não havia pessoas espremidas antes dela. Nem havia motivo para tal. O cobrador estava sempre presente, e dali, observava tudo o que ocorria dentro do veículo. Era muito mais que cobrador. Sua presença inibia a presença de desordeiros. E auxiliava o motorista em várias tarefas. Nós, passageiros da época, observávamos tudo isto, porque a cidade era menor. Os motoristas e cobradores normalmente eram fixos na linha. Nisso, era mais fácil fazer amizade. Conhecíamos os motoristas. Linha e nome do motorista. Conhecíamos também as empresas. Cada empresa tinha sua própria identidade. Sua cor, seu design. E o usuário que tinha dificuldade para ler, identificava seu ônibus pela cor ou pelo motorista.
Havia problemas sim. Horários de pico, ônibus lotados. E iam passageiros pendurados nas portas, não havia proibição para o veículo rodar com as portas abertas. No entanto, não era comum haver acidentes com passageiros. Nem atritos entre motoristas e passageiros “estressados”. Tudo era diferente. Veículos, pessoas…
Os ônibus internamente eram mais limpos. Visualmente. Não havia catracas monstruosas, altas, para evitar passageiros pulando. Não havia tanto ferro, dando a aparência de jaula. A única coisa que quebrava o visual limpo eram aqueles veículos cheios de propagandas comerciais no teto, rente às janelas. E as pessoas liam, afinal, não havia celular para ficar lendo mensagens e informações. Então apreciava a paisagem pela janela quem estava sentado e quem viajava em pé ficava de cara com os anúncios.
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As pessoas mais altas podiam bater a cabeça no teto. Os ônibus eram menores e mais baixos. Não havia elevador para cadeirantes. Bancos estofados e depois chegaram os de fibra. Opiniões se dividiram. Nos anos 80, quando o poder público acompanhava bem de perto o serviço mas não interferia tanto, os usuários conseguiam se comunicar com a empresa. Havia telefone da prefeitura e da empresa bem visíveis. Até os prefixos dos ônibus eram mais fáceis de anotar ou memorizar. Com a interferência cada vez maior do poder público, os dígitos foram aumentando. E complicando para os usuários na hora de anotar tudo o que precisam para encaminhar sugestão ou reclamação.
Havia ônibus velho. Mas não tinha tanto mi-mi-mi como hoje. Sabíamos quando o veículo realmente era velho, e não com aparência de velho por causa de uma janela batendo ou um balaústre desparafusado.
Não existia “paixão” por ônibus como vemos agora, a internet revelou que existem muitas pessoas que gostam de ônibus hoje. Naqueles tempos havia menos. Mas havia mais respeito ao veículo e seus trabalhadores. Como o desembarque era pela porta da frente, a maior parte dos passageiros, ao descer, dizia “obrigado” ao motorista.
GEORGE ANDRÉ SAVY
Técnico em Administração e Meio Ambiente, escritor, articulista e palestrante. Desenvolve atividades literárias e exposições sobre transporte coletivo, área que pesquisa desde o final da década de 70.
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