Hipócrates (460-377 a.C.) dizia: “A dor enerva a alma, torna-a mais temerosa, degenera-a…é o veneno da beleza”. Vamos hoje explicar o que é a dor e quais são as piores…
A dor é um mecanismo de defesa contra agressões que podem ocasionar perda parcial ou total de um membro ou órgão. Embora incômoda e desagradável, a dor desempenha função biológica para manter a integridade da vida do indivíduo, contribuindo para a preservação da espécie.
Exemplo: pessoas que, por motivo genético, são desprovidas da sensibilidade dolorosa, configurando o fenômeno “analgesia congênita”. Esta doença só é conhecida no ser humano, sendo este um indício de que a ausência da dor seja incompatível com a sobrevivência dos animais. O homem, por seguir instruções para evitar o perigo, consegue levar uma vida quase normal, apesar de ser comum o aparecimento de desgastes das articulações, fraturas ósseas, lesões da pele e extensas necroses provocadas por posições viciadas.
Curiosidade: não há adaptação para a dor. Os receptores nunca se adaptam, pelo contrário, em algumas situações eles reduzem seu limiar de estímulos, revelando maior sensibilidade.
Portanto, a dor é importantíssima. Mas, vivenciá-la é outra história.
A dor transforma, de fato, um indivíduo pacífico em alguém prestes a liderar uma guerra, seja ela de cunho mental ou físico.
A Neurofisiologia da dor é algo relativamente simples de entender e foi descrita por Renée Descartes há 400 anos: “A chama que queima a mão é transmitida ao longo do Sistema Nervoso (SN) para o cérebro como o estímulo onde atormenta o homem com uma pequena chama”.
Tradução:
1- Ocorre o estímulo nocivo;
2- Que ativa nociceptores (receptores que captam o estímulo doloroso);
3- Transmissão até o cérebro por circuitos neurais;
4- O cérebro traduz o sinal como dor (no córtex sensorial).
Simples, não é? Ledo engano, pois, a dor pode ter inúmeros significados, inclusive, problemas com membros “fantasma”.
Vamos entender.
O componente fisiológico da dor é chamado nocicepção,que consiste dos processos de transdução,transmissão e modulação de sinais neurais gerado sem resposta a um estímulo nocivo externo. De forma simplificada, pode ser considerado como uma cadeia de três neurônios, a saber: ode primeira ordem na periferia projetando-se para a medula espinhal, o de segunda ordem ascende pela medula espinhal e o de terceira ordem projeta-se para o córtex cerebral.
A Associação Internacional para o Estudo da Dor (AIED) a classifica como uma sensação desagradável, cuja experiência emocional está associada a estímulos de lesão tecidual real ou potencial. Entretanto, muitas vezes, manifesta-se mesmo na ausência de agressões teciduais vigentes, tal como ocorre em doentes com neuropatia periférica ou central e em certas afecções psicopatológicas.
Clinicamente, é parte integrante dos sintomas de muitas doenças.
A dor evoca práticas e reações múltiplas, como a experiência sensorial (dor rápida/lenta); experiência psicológica (ansiedade, depressão – dor crônica-, sofrimento e alterações de comportamento) e reação motora (Somática: reflexo de retirada, vocalização, expressão facial, posição antiálgica, choro. Viscerais: sudorese, vasoconstrição periférica, náuseas, vômito, entre outras ocorrências).
Os diferentes estímulos dolorosos são captados por diversos tipos de receptores. Para cada natureza de incômodo (térmica, mecânica ou química), há um receptor específico próprio.
A rapidez com que essa informação chegará ao cérebro depende do tipo de fibra nervosa que está conectada a esse receptor. Há fibras rápidas e fibras lentas, que dependem do seu grau de mielinização e diâmetro, mas, situações patológicas, como a inflamação, podem alterar a sensibilidade desses receptores. Isso ocorre, porque as prostaglandinas e bradicininas liberadas no processo inflamatório reduzem o limiar de sensibilidade dos neurônios nociceptivos, ou seja, estímulos antes inócuos, passam a produzir.
Exemplo: dor de ouvido. Antes da inflamação podemos apertar a parte anterior/posterior do ouvido externo sem sentir nada, no entanto, basta haver uma inflamação no local que, só de passar a mão por ele, causa dor lancinante. Idem para dor de dente. Esta situação é classificada de hiperalgesia.
Como nosso organismo é perfeito, para cada distúrbio ocorrido existem sistemas de compensação. Esse processo é chamado de homeostase (é nesse momento que meus ex-alunos arrepiavam….kkkkk).
Então, se o estímulo é doloroso, o sistema contrário, de defesa, é o antiálgico, um mecanismo de compensação endógena de analgesia que toma o sentido oposto: parte do córtex cerebral atinge o tronco encefálico, percorre a medula e inibe o neurônio de segunda ordem que está enviando o sinal doloroso, ao mesmo tempo em que, substâncias analgésicas como endorfinas e encefalinas, são liberadas no local.
Exatamente onde, no Sistema Nervoso Central, sentimos a dor? E porque ela evoca sensações emocionais?
A dor percorre o caminho anterolateral da coluna, conhecido por trato espino-talâmico, atinge o bulbo, tálamo e, por fim, o córtex cerebral que traduzirá o sinal, indicando onde está o estímulo doloroso (por isso a dor em uma perna não me faz encolher a outra), se é forte ou fraco e a qual natureza pertence (térmico, químico ou sensorial).
É no córtex, então que sentimos a dor.
Mas, por que ela evoca sensações emocionais? A pergunta que não quer calar.
Em 1965, Melzack e Wall, propuseram a teoria do “portão”, segundo a qual a dor é uma percepção mais do que uma sensação. Isto é, existe uma sensação identificável de dor, mas ela, raramente, se reflete com absoluta amplidão.
Esta sensação é modificada por informações de várias outras origens. Ela afirma que as fibras cutâneas grandes e pequenas interagem em um estágio inicial no sistema nervoso, ao nível das “células-portão” da medula espinhal que, por sua vez, regulam a transmissão da dor para ambos os sistemas sensoriais e motivacionais.
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De acordo com essa teoria, essas mesmas células-portão são influenciadas por processos centrais (emocionais, experiências anteriores, quadro atual) e, apesar de, nos detalhes fisiológicos, ela não estar absolutamente correta, a teoria não perde sua importância, porque deu uma ênfase histórica de como não olhar para a dor sendo, simplesmente, uma experiência sensorial.
Daí, entendermos todo o drama masculino frente a uma gripe, uma febre ou uma dor de barriga. Eles gemem e parecem desfalecer ao mínimo movimento respiratório. Eles não estão acostumados com dor.
Nós mulheres, crescemos com a dor.
Sentimos dor ao menstruar.
Sentimos dor ao parir.
Sentimos dor ao amamentar.
Sentimos a dor dos nossos filhos. Qualquer uma. De uma queda à decepção amorosa.
Então, nosso sistema de detecção de dor tem um limiar alto. Precisamos de um estímulo realmente doloroso para reclamar.
Embora existam divergências no âmbito sexual, a comunidade científica concorda que há dores insuportáveis. Aqui estão algumas:
– Enxaqueca;
– Artrite;
– Gota;
– Abcesso;
– Lombalgia;
– Parto;
– Infarto;
– Apendicite;
– Cálculo renal;
– Pancreatite;
– Cálculo Biliar;
– Herpes-zóster;
– Nervo ciático;
– Neuralgia do trigêmeo;
– Rompimento do tendão de Aquiles;
– Fratura peniana;
– Tétano;
– Fibromialgia;
– Dor de dente;
– Queimadura de segundo grau;
– Hérnia de disco;
– Câncer;
– Endometriose;
– Osso quebrado;
– Úlcera de estômago;
– Hipertensão intracraniana.
E para cada uma delas, existe alguém que a suportou com mais ou menos recursos emocionais.
Mas o certo é o que William Shakespeare falou sobre a dor:
“Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente”. (Foto acima: www.altoastral.com.br)
ELAINE FRANCESCONI
Bacharel em Zootecnia (UNESP Botucatu). Licenciatura em Biologia (Claretiano Campinas). Mestrado (USP Piracicaba) e doutorado (UNICAMP Campinas) em Fisiologia Humana. Professora Universitária e escritora.
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