Em áreas rurais particulares ou não, ainda existem placas que avisam que é proibido caçar ou pescar em determinados locais. O objetivo da mensagem desses avisos traz embutida a pretensão de que determinada atividade humana seja nefasta aos animais silvestres e ao mesmo tempo pode também trazer a ideia de aquela propriedade estaria protegida por algo ou alguém, ou ainda, que a legislação ambiental estaria sendo cumprida. A origem de tais medidas pode guardar sintonia com o antigo Código Civil de 1916, quando ao tratar sobre o direito das coisas, considerava os animais silvestres como coisas e portanto passíveis de disponibilidade conforme a intenção do dono da terra. O fazendeiro tinha o direito legal de autorizar ou não a atividade de caça na sua propriedade, em razão da natureza jurídica de objeto atribuída a esses animais.

Ainda que a atividade de caça esteja inserida na história da humanidade, desde o homo sapiens que para sobreviver tinha que caçar para fins de alimentação, passados séculos de evolução, tal atividade ainda é presente nas nossas vidas. Considerados os Biomas brasileiros, cada um com seu ecossistema distinto, temos várias espécies de animais que podem estar caçadas indiferentemente às proibições da lei. A justificativa para ainda ocorrer atividades de caças no país envolve alguns aspectos, que podem até servir de explicação, mas não para justificar tanta maldade contra os animais, como o econômico, lazer, cultural, entre outros. No aspecto econômico, a caça de animais silvestres é explorada de forma criminosa, para aferir lucro, como no caso do tráfico de animais, atingindo bilhões de dólares ao ano, sendo a quarta maior atividade ilícita do mundo, conforme levantamentos demonstrado através de relatórios elaborados pela RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres) em 2011. No aspecto cultural invoca-se que a caça sempre esteve presente na vida dos nossos ancestrais e que a manutenção da sua continuidade é legal, pois que há a manutenção dos valores históricos que ela representaria. No aspecto lazer, a justificativa para o abate de animais, principalmente de aves criadas em cativeiro para tal finalidade, é que também seria uma atividade esportiva benéfica à manutenção da saúde humana. Enfim, várias as tentativas de tentar explicar condutas bestiais que ainda hoje, em pleno Século XXI, são praticadas por animais racionais, ditos seres humanos.

No histórico da legislação pátria quanto a atividade de caça, promulga-se em 1934, o primeiro código de proteção aos animais, através do Decreto-Lei n° 24.645 de 10.07.1934, que naquela época já tratava da tutela dos animais silvestres, ainda que esses eram consideradas “coisas” pelo então Código Civil de 1916. Em seguida, passa a disciplinar o assunto a Lei de Contravenções Penais de 1941, conforme Decreto-Lei nº 3.688 de 03 de setembro de 1941, dispondo sobre algumas condutas lesivas contra os animais, tipificando-as como meras contravenções penais, apenadas com sanções irrisórias, brandas na sua eficácia. Já a crueldade contra animais era tratada em capítulo à parte desse diploma. Em 1965 com a promulgação do Código Florestal, que tinha a pretensão de proteger e valorizar a flora, surgiu sentimento de que a fauna também merecia proteção especial, sendo promulgado o Código de Proteção à Fauna, mais conhecido como Código de Caça, através da Lei nº 5.197 de 03 de janeiro de 1967, ainda em vigor no que dispõe sobre sua parte geral. No seu art. 27, passou a disciplinar algumas condutas envolvendo danos à fauna silvestre, tipificando-as como crimes e não mais como simples contravenções, atribuindo-lhes sanções mais graves, de reclusão, prescrevendo um tratamento mais rigoroso por parte da lei, contra aqueles que praticavam caça ilegal. Em 1978, em Bruxelas, a UNESCO promulga a Declaração Universal sobre os Direitos dos Animais, passando a orientar a postura mundial sobre os direitos e a proteção dos animais. Mesmo diante do rigorismo imputado pelo código de proteção à fauna, tais atividades não cessaram o que levou a necessidade de um maior rigor na aplicação da lei.

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Dessa forma, em 1988 foi promulgada a Lei nº 7.653 de 12 de fevereiro de 1988, que passou a considerar inafiançáveis os crimes contra os animais. Somente com o advento da promulgação da Carta Magna de 1988, a proteção dos animais ganha maior respaldo constitucional, conforme art. 225, §1º, inciso VII, da CF, incumbindo ao poder público de dever de proteger a fauna e a flora, ficando vedadas as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade, conforme dispor a lei. Por fim, nessa fase da aplicação do direito ambiental, em 1998, é promulgada a Lei nº 9.605 em 12 de fevereiro, regulamentada pelo Decreto 6.514 de 22 de julho de 2008, que também tipifica como crimes as condutas lesivas aos animais silvestres, ampliando o rol de situações de agressões aos animais, atribuindo porém penas mais brandas que a Lei 7.653/88, onde eram previstas penas de detenção até reclusão, com prisão em flagrante do autor do crime. A atual Lei Ambiental revoga tacitamente os artigos que tratavam dos crimes contra os animais previstos no Código de Proteção à Fauna de 67, passando a vigorar somente os mandamentos da Lei 9.605/98. Tramita no Congresso Nacional alguns Projetos de Lei que trazem inovações à proteção animal silvestres e domésticos.

No mundo animal, dentro da cadeia alimentar, aquele que caça a sua presa é considerado predador, sendo considerada uma atividade normal de equilíbrio da vida num ambiente selvagem. Já no dito mundo civilizado, aquele que caça o animal silvestre (ser humano), é considerado caçador e ainda hoje não conseguiu evoluir o suficiente para reconhecer sua ignorância do grande mal que causa à fauna, insistindo em continuar desrespeitando a plaquinha de proibido caçar. (foto acima: Panoramio)
DR. FERRAZJOSÉ ROBERTO FERRAZ

Ex-comandante da Guarda Municipal de Jundiaí; delegado aposentado da Polícia Civil; especialista e professor de Direito Ambiental.