Há inúmeros relatos que me emocionam e ensinam. Conheço a moça faz muito tempo e, inúmeras vezes, ela me traz notícias do submundo que me ajudam a compreender um pouco mais as pessoas. Compreender é uma forma de derrotar o julgamento humano. Relatava-me, na semana passada, sobre duas pessoas que conheci e eram usuárias de cocaína.
Uma vez, estava ela em um barraco na periferia com algumas amigas e a usuária entrou de supetão, com duas facas de churrasco, e as ameaçou. Disse que a primeira, que se atrevesse a sair, seria morta. A proprietária do barraco pediu que se acalmassem. Por certo, ela acabara de cheirar cocaína e era essa a sua reação diante da droga: medo que viessem atrás dela. Qualquer barulho a assustava. Pelo que entendi, deveriam ser os fantasmas de sua história desde a infância. Sei um pouco da história dela e me doeu quando soube de seu assassinato. Era brava, briguenta, provocadora… No outro lado, pedia-me de presente, nos natais em que estávamos próximas, bichinhos de pelúcia.
Um dos fatos de sua vida que me marcou, foi quando experimentou o crack. Percebeu que seria mais viciante que as outras drogas utilizadas. Ao saber que uma amiga, de acontecimentos na vida muito parecidos com os dela, iria se servir da droga, fez de tudo para preservá-la, porém não conseguiu.
Fiquei surpresa com o fato de a pessoa usar a droga para sair da realidade e, com ela, agigantar os fantasmas que carrega de suas dores. A moça, no entanto, acrescentou que nem todas as pessoas reagem da mesma forma.
O segundo era um moço que também já partiu. Usava a cocaína na veia. Na gíria: “tomava baque”. Abro um parêntese: conheci um jovem que, de tanto aplicar cocaína, estraçalhou vasos do braço e precisou amputá-lo. Passou a utilizar a veia do pescoço.
Voltando ao moço, ficava tão apavorado após o uso da droga, que atravessava a noite passando, sem interrupção, um pano no vitrô da cozinha, na expectativa de que apareceria alguém para destruí-lo. A qualquer sombra, já dizia: “Eles estão chegando! Irão entrar aqui e me matar!”
Ouço relatos assim e fico com pena. Ah, se pudéssemos conter as compulsões que levam aos vícios e assoprar fissuras!
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Domingo passado, na Missa no Santuário Diocesano Santa Rita de Cássia, onde o Padre Márcio Felipe de Souza Alves é Reitor e Pároco, em sua homilia sobre o Evangelho de São Mateus (25, 1-13), a respeito das virgens prudentes e imprevidentes, comentou sobre trazermos o óleo da alegria em nossa lâmpada, porque Deus é Amor e nos dá o Céu.
Penso que todos nós chegamos ao mundo, independente da crença, com uma lamparina com reserva de óleo. Onde será que escorreu o óleo da esperança de quem se utiliza de substâncias que despertam seus fantasmas?(Foto: cuiabanonews.com.br)
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE
É professora e cronista
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