Era a década de 1990. Não lembro se em 93 ou 94 (minha memória anda mais bugada que Windows 95), mas fui transferido para trabalhar como programador visual e diagramador do saudoso suplemento dominical do Jornal da Cidade, o Domingo Especial. A coordenação era da querida Zara Lúzia de Campos, chefe com humor refinado, que proporcionava edições memoráveis de até 60 páginas, além do famoso Guia da Noiva JC. O comercial era fera: garantia anúncios, matérias e até umas permutas estratégicas que faziam a alegria do setor. Nesta época conheci Renata Taffarello…
Fui para Domingo Especial a convite da Zara, que acreditava no meu estilo “fora da caixinha”. Modéstia à parte (e a parte é grande), eu não me contentava com o arroz com feijão de títulos em 35 toques na fonte SB 6225. Gostava de dar moral às imagens e fazer o texto dançar com o design. E a Zarinha, sempre visionária, resolveu contratar uma jornalista para reforçar a equipe e deixar o domingo mais leve — tipo sobremesa depois do feijão.
Eis que surge o currículo de Renata, saindo do forno da PUC-Campinas. Entrevista marcada para quarta-feira, 14h, na antiga sede do JC, Praça da Bandeira. Tocou o interfone, a Rose da recepção anunciou: “A Renata chegou!”. Mandei entrar, Zara do meu lado. A porta abre, Renata sorri, eu sorrio, levanto, cumprimento, e começamos aquela conversa típica de dois velhos amigos… que nunca tinham se visto.
Zara ficou de canto, coitada, até que explodiu:
— Mas afinal, de onde vocês se conhecem?
Olhei para a Renata, ela olhou para mim, e respondemos quase em coro:
— Nesta vida não sabemos… mas de outras encarnações, certeza!
A cena parou em estilo Matrix: tudo congelado, menos nós dois, que já falávamos de família, amigos e afinidades como se nos víssemos todo dia.
Logo vieram trabalhos marcantes. Uma das primeiras matérias da Rê foi sobre o Grendacc – Grupo em Defesa da Criança com Câncer. A presidente na época, Verci Butalo, foi ao JC divulgar o projeto. Eu estava lá meio por acaso, e Renata mandou ver no texto. Deu show. Eu, para acompanhar, caprichei na diagramação — porque, convenhamos, roupa boa merece cabide bonito.
Nossa parceria sempre foi assim: um sente quando o outro não está bem. Angústia, alegria, conquista — a sintonia é imediata. Podíamos ficar meses sem nos ver; quando encontrávamos, era como se tivéssemos almoçado juntos no dia anterior (com direito a sobremesa e cafezinho).
Uma vez, em entrevista com uma aventureira do trekking, que tinha ido ao Chile de ônibus, começamos a completar as falas um do outro. A entrevistada parou e decretou:
— Sabia que vocês viveram outras vidas juntos?
Não chegamos a disputar papel na novela A Viagem, mas confesso: a ficha caiu.
Traumas também compartilhamos. Como a saga de transformar o antigo tablóide Revista da Noiva em, de fato, uma revista. Zara queria porque queria. Trabalhamos até de domingo, com direito a estresse, gargalhadas e coca quente e pão com mortadela. Não tenho orgulho da primeira edição (revista é bicho diferente de jornal), mas vencemos a batalha — e ainda tínhamos elenco de apoio: Adriana Zutini, Ronaldo Verdile, Niza Souza e companhia limitada.
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Momentos hilários? Aos montes. Como a colaboradora que jurou que minha adaptação de Mulher Rendeira para Mulher Brejeira tinha fundamento filosófico. Gritou, se emocionou… e nós choramos de rir. Outra clássica: quando dividíamos funções, eu era o Edi, ela a Tora. E, na hora de fechar, a frase ritualística:
— Ô Rê, preciso de você, sentir o seu carinho pra concluir a edição… e o carinho!
Renata é dessas amigas-irmãs que fazem diferença. Às vezes, resolve uma dúvida existencial com um sorriso. Excelente ouvinte, melhor conselheira ainda. E eu sou grato de ter encontrado essa parceira de outras vidas, que transforma minha jornada em algo mais leve.
Porque, convenhamos: se a vida fosse uma edição de jornal, a Renata sempre colocaria o lead certo.

MIGUEL ÉDI GOMES
É jundiaiense, tem 53 anos. É formado em jornalismo pela UniFaccamp e atualmente faz parte da equipe da Assessoria de Imprensa da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.
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