Estávamos no trecho de Estiva até Consolação, em Minas Gerais, e a presença do cão nos deixou num estado de silêncio ensurdecedor. Foi um momento de acalmar a mente, exercitar o propósito de viver aquele instante, acreditar que a novidade era a companhia dele, caminhar os 19 quilômetros livremente e ter fé.
O cão era livre e estava vivendo aquele instante intensamente. Ao observar tudo isso escolhi também deixar de ficar contando o tempo para o destino final que era Aparecida, viver o melhor que podíamos naquele dia e em especial enxergar o caminho com suas paisagens e desafios. Era inverno, mas o sol estava forte e nossos passos eram bem curtos. O animal era muito observador e percebeu que precisava nos esperar. Então cavou um buraco do seu comprimento até aparecer uma terra mais úmida, deitou bem ali e ficou à nossa espera.
Como era um trecho sem árvores resolvemos prosseguir sem descanso, o elogiamos pela obra de contenção de calor e a sua esperteza. Sem cerimônia ele levantou a cabeça, depois o corpo, abandonou sua obra e continuou a caminhada ao nosso lado. Nesta altura nós já nos preocupávamos se ele tinha fome e especialmente sede. Sabíamos que alimentá-lo seria uma aproximação muito grande. Porém, o que fazer? E assim decidimos dividir nossa água com ele e para nossa decepção ele não quis tomá-la … Que desfeita, pensamos!
Logo mais a frente havia um córrego que formava uma poça d’água, nosso companheiro mergulhou, bebeu daquela água, se refrescou e nós ficamos lá felizes com a alegria dele! Perguntamo-nos: será que ele sabia que tinha essa fonte de água e por isso recusou a nossa? A gente conversava com ele. Imaginem duas mulheres que gostam de falar e que acham o cara perfeito para tagarelar sem parar. E ele não reclamava!!! O silêncio ensurdecedor ficou para trás…
Como tínhamos tempo resolvemos escolher um nome para ele. Num momento de descanso testamos todos os nomes possíveis para um cão do seu estilo. A gente usou a criatividade começando por Pelé e passamos por diversos nomes e ele prestava atenção sem entusiasmo. Até o momento que deu dormiu profundamente.
VALÉRIA GONÇALVES
É repórter-fotográfica e se descobriu peregrina em 2016
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