Em 2011, a dona de casa Ozeni Aparecida Diniz Martinez, hoje com 37 anos, fez um comentário no site da revista IstoÉ. Era uma matéria sobre as adoções ocorridas em Jundiaí na década de 90. Ela se intitulou como ‘a indignada’ e, nas poucas linhas, contou o que chama até hoje de ‘roubo’ da irmã, Talita Marquesa Diniz. Dois anos depois, no dia 10 de janeiro, as duas se encontraram pela internet. E a primeira pergunta que Talita fez foi: “você é a indignada?”. Ozeni nem se lembrava mais do comentário na página da revista. Nunca mais tinha acessado aquele post. Se tivesse, teria visto que Talita, vivendo do outro lado do Oceano Atlântico, havia se reconhecido no comentário da irmã. Mais: ao ler as palavras da ‘indignada’, Talita havia respondido. Se Ozeni continuasse acessando a publicação, o reencontro das duas teria sido antecipado em 24 meses.
TALITA: “ENTENDI RAPIDAMENTE QUE NUNCA MAIS VERIA MINHA FAMÍLIA”
Difícil mesmo foi fazer Talita entender que a mãe não tinha concordado com a adoção. Enquanto Maria Lúcia Diniz se desesperava e entrava em depressão sem notícias da menina, Talita acreditou por 18 anos que a mãe não a queria. “Só eu sei o que ela passou e o sofrimento que vivemos. Depois que a Talita foi tirada de nós, nunca mais tivemos Natal ou Ano Novo. Nos aniversários dela, em abril, ou em novembro, mês em que ela foi levada embora pela Justiça, minha mãe sempre caía em depressão”, relembra Ozeni. O ressentimento de Talita se foi quando a irmã contou tudo o que ela e a mãe sofreram.

Agressões desconhecidas – A família de Talita morava em Francisco Morato. Maria Lúcia era separada e tinha quatro filhos. Trabalhava como faxineira em uma transportadora. O pai era alcoólatra e não ajudava a família financeiramente. Talita acabou indo morar na casa de uma amiga, em Jundiaí. “Minha mãe fazia o que podia”, diz.
Hoje casada e mãe de três filhos, Ozeni afirma que ninguém desconfiaria que Talita apanhava casa onde vivia. “Aquela família tinha uma casa boa. Viviam bem aparentemente. Quando nos encontrávamos, a Talita não contava sobre maus tratos. Nunca soubemos de nada”, explica.
A última vez que a família viu Talita foi no enterro do pai, José Coelho. “Estávamos na estação de trem de Francisco Morato nos despedindo da Talita que iria voltar para Jundiaí, para a casa onde vivia”, lembra a irmã. Dias depois, A mãe da garota recebeu um telefonema da Casa da Criança Nossa Senhora do Desterro, na praça Dom Pedro II, onde Talita estudava. Avisaram que a menina tinha sido levada pelo Conselho Tutelar porque estava sendo vítima de agressões.
No dia seguinte, Maria Lúcia veio até o Fórum de Jundiaí. “Minha mãe é analfabeta e levou uma amiga com ela. Um funcionário a chamou até uma sala. A amiga, que sabia ler, não pode entrar. Ali, ela assinou um documento que, segundo o funcionário, autorizava um assistente social checar as condições da nossa casa para assim liberarem Talita. Este processo levaria 15 dias”, explicou Ozeni.
As duas semanas se passaram e Maria Lúcia não recebeu nenhuma visita. Ela voltou ao Fórum e ficou sabendo que, na verdade, tinha assinado um documento autorizando a adoção da filha. “Minha mãe entrou em choque. Ela gritava e chorava. Eu só tinha 14 anos. Pouco podia fazer”, diz.
Desesperada, Maria Lúcia passou a vir constantemente para Jundiaí. Pediu demissão do emprego e fez parte do movimento das Mães da Praça do Fórum por um ano. Ozeni nunca a acompanhou. “Junto com outras mulheres que tiveram os filhos tomados pela Justiça, minha mãe esteve no programa do Ratinho, do Gilberto Barros. Nunca fizeram um boletim de ocorrência. Na verdade, não sabiam como agir e não havia ninguém para ajudá-las ou instruí-las. Era um movimento sem direção. Estavam de mãos atadas e, no final, foram 18 anos de sofrimento.
Itália – Para a família de Talita, um casal de brasileiros tinha adotado a menina. “Chegaram a falar no Fórum que ela tinha sido levada para a Itália. Pensávamos que era mais uma mentira e deixamos de ir ao Fórum de Jundiaí”, lembra a irmã. Quase duas décadas, Ozeni descobriu que essa foi uma das poucas verdades contadas e que veio à tona quando a internet se tornou um fenômeno mundial.
Ao comprar um computador, a irmã de Talita não teve dúvidas. Criou um Facebook com o nome dela, fotos e relatando toda a história. “Fui adicionando várias pessoas sempre achando que uma iria passar para a outra até chegar na Talita. Foram anos assim. Até que vi a reportagem da revista IstoÉ e deixei a mensagem como ‘a indignada’. Na Itália, Talita viu o post e se reconheceu nele. Respondeu para a irmã. Só que Ozeni não entrou maisno site da revista. “Sempre ensinei meus filhos e meu netinho a amar a Talita mesmo quando não tínhamos a reencontrado. Sempre acreditei que iríamos achá-la. Nunca perdi a fé nisto”, comenta. O reencontro virtual aconteceu no dia 10 de janeiro de 2013.
Chorando, Ozeni conta como foi o reencontro na vida real: “A Talita pagou uma passagem e passei um mês na Itália com ela. Conheci Roma, Siena, Firenze e outras cidades lindas. Mas para mim o que importava mesmo era estar com ela. A viagem foi um bônus. Alegria mesmo era acordar e poder vê-la. Depois tomar café e poder preparar o almoço com a minha irmã, coisas pequenas que eu esperei 18 anos para fazer. Procuramos não falar muito da adoção. Foi maravilhoso. Foram 30 dias especiais. O marido dela, o Simone, é ótimo(foto acima)”, lembra. Depois, Talita veio ao Brasil e pretende regressar no início de 2018. Ela, o marido e o bebê que está esperando.
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