TERNURA e experiência

ternura

Experiência e ternura não morrem. Partiu, aos 101 anos, em 24 de outubro, Wanda Póltawska(foto), sobrevivente das experiências desumanas nazistas no campo de concentração de Ravensbrück. Médica e psicóloga, teve uma grande amizade intelectual e espiritual com São João Paulo II. Ele a tratava por “dusia”, ou seja, irmãzinha. Faz-me um bem imenso ler sobre pessoas que não transformaram em revolta o sofrimento pelo qual passaram. É o caso dela.

De acordo com o jornalista Giampaolo Mattei do Vatican News, era “mulher com estilo e caráter de rocha, com jeito direto e palavras essenciais diante de qualquer interlocutor. Uma mulher livre, acima de tudo. Com uma história pessoal que a torna hoje um ‘ícone’ da conturbada história do século XX para a sua Polônia e para a própria Europa”.

Participou em Lublin, sua cidade natal, dos círculos da juventude católica, dos escoteiros, de atividades esportivas e da resistência polonesa à invasão nazista da Polônia em 1939. Presa, aos 19 anos, vítima de maus tratos na prisão de sua cidade e, nove meses depois, transformou-se no número 7709 no campo de concentração de Ravensbrück. Das quarenta mil mulheres polonesas ali detidas, apenas oito mil sobreviveram.

Como outras mulheres foi submetida a todo tipo de “experimentos”, quase sempre fatais, que tinham à frente o Dr. Kael Gebhard, médico pessoal de Heinrich Himmler, chefe das Gestapo.

Foi libertada entre abril e maio de 1945. Formou-se em Medicina e Psicologia, com especialização em Psiquiatria, estudando também Filosofia.

Terminada a Guerra, mudou-se para a Cracóvia, para tentar apagar o “pesadelo”. Contudo, afirmava ter medo dos sonhos e que o horror não pode ser cancelado, mas sim transformado.

De acordo com Giampaulo Mattei, “Unir a dureza da experiência de Ravensbrück com a ternura pelas pessoas que sofrem é, talvez, o maior testemunho da doutora Póltwska. Sim, a escolha de não se colocar do lado do rancor vingativo, mas da reconstrução de um povo a partir da sua parte mais frágil: os doentes, as pessoas com deficiência”.

Sempre em busca de algo mais, sua vida mudou no encontro com o Padre Karol Wojtyla. Tornou-se uma parceira espiritual de amizade que durou mais de meio século. De acordo com ela, nem a morte interrompeu porque, depois de ter estado ao seu lado até dois de abril de 2005, lendo-lhe textos espirituais e de literatura polonesa, convenceu-se de que a fé dá a certeza de que as relações humanas autênticas não se rompem.

Foi determinada na luta contra o aborto. Viu os nazistas usarem mulheres grávidas como cobaias e até jogarem recém-nascidos nos crematórios. Prometeu a si mesma que, se sobrevivesse, defenderia a vida de todas as maneiras, especialmente das crianças, sem exceção.

Ela e sua família, seu marido Andrzej, filósofo, e seus quatro filhos se tornaram os afetos familiares para Karol Wojtyla.

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Atribuía a recuperação da saúde no câncer que teve, em 1962, ao pedido que o Bispo Karol fez ao Padre Pio de Pietrelcina, que ela desconhecia quem era. Afirmava que, em lugar de ajoelhar e agradecer a Deus, quase causou uma rebelião nela: “Fiquei espantada com o poder de Deus e também do fato de sermos totalmente dependentes dEle”.

Colaborou com São João Paulo II na redação de textos e documentos de alto nível.

Que fique a sua grande lição: sem rancor vingativo, defesa da vida e ternura pelos mais vulneráveis.

MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE

É professora e cronista

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