O menino é de vivência de derrota, resultante da turbulência de sua história. Silencia sobre o pai e a mãe possui alguns limites. Não se furta, contudo, do direito de abraços, de presentear as pessoas com desenhos e de elogiá-las. É a sua forma de criar laços. Bom não se fechar em concha.
Semana passada, desenhou, como lembrança de seu primeiro presente, um super-herói, segundo ele. Quis saber qual era a personagem, por não identificá-la. Enrolou-se todo para explicar e me disse que era um super-herói que caíra. Indaguei sobre onde caíra. Não conseguiu me dizer.
OUTROS ARTIGOS DE MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE
Observando melhor, deve ser uma mistura do pai com ele. Desejaria que o pai fosse um super-herói, porém ele “tombou” nas guerras do cotidiano. Os lábios costurados e as sobrancelhas diferem no traçado. Pode-se traduzi-la como uma figura disforme. E, além disso, encontra-se solta no ar, sem chão. Cortando o rosto, uma corda cru e azul. Essa corda, na categoria infantil, significa atenção e respeito pela capoeira.
Conclui-se que o pai não lhe dá segurança e que, ao aparecer, com o propósito de evitar atritos e pancadas, é melhor ficar de boca hermeticamente fechada.
LEIA TAMBÉM:
VIVÊNCIAS COM GERALDO CEMENCIATO
VIVÊNCIAS DE MINHA MÃE(2): CASULOS E BORBOLETAS
A esperança paterna do menino está na corda cru e azul, como na ladainha da capoeira Angola do Mestre Poloca: “Já tomei todos cuidados/ Só falta o meu benzer./ Meu mestre me deu conselho,/ Faça seu saber valer,/ Use calma e inteligência, / Tudo pode acontecer./ Quando menos se esperar,/Chance vai aparecer”. É isso! (foto acima: viladacrianca.com.br)
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE
Com formação em Letras, professora, escreve crônicas, há 40 anos, em diversos meios de comunicação de Jundiaí e, também, em Portugal. Atua junto a populações em situação de vulnerabilidade social. Acesse o Facebook de Cristina Castilho