Com raríssimas exceções, hoje ninguém mais discute sobre o bem que os exercícios físicos fazem à saúde, afinal são prescritos para qualquer pessoa em qualquer situação de saúde e em qualquer idade, basta adaptá-lo à realidade do indivíduo. Para quem teve a oportunidade de praticá-lo quando jovem tem seus benefícios estendidos ao longo de sua vida, afinal nosso corpo parece manter uma memória celular de nosso passado, seja ele saudável ou não.

Observando minha própria família posso me certificar disso.

Meu marido foi atleta de remo e até hoje colhe os benefícios de tal prática. Logo que casamos, no meio da noite acordei e fiquei observando-o dormir. Ele parecia morto. Pensei: “Deus! Estou casada há apenas uma semana e já estou viúva!” Desesperada, coloquei uma mão sobre seu rosto, estava quente, a outra sobre seu peito e percebi que se mexia muito pouco para cima e para baixo. Agradeci imensamente a Deus por estar vivo.

Meus filhos, desde o ano passado são atletas de um clube de São Paulo, embora já treinassem há vários anos as suas habilidades em Jundiaí. O mais velho joga basquete e o mais novo faz parte da equipe de atletismo. Embora seja adolescente e criança, respectivamente, não há dúvida de que os exercícios mais intensos trouxeram grandes benefícios para os dois, que eu poderia citar de pronto: equilíbrio emocional, resistência física e controle do peso corporal.

Por causa disso e do meu passado de bailarina, me senti estimulada a voltar a praticar atividade física também. Decisão que melhorou minha autoestima, minhas noites de sono e as dores absurdas no joelho.

Apesar de todo o benefício externo óbvio é por dentro que os exercícios físicos dão um show.

Dois grandes sistemas controlam todas as funções corporais: o sistema nervoso (neurônios e seus neurotransmissores) e o sistema endócrino (hormônios) ambos atuando em sincronia para que as respostas do indivíduo frente a qualquer desafio interno ou externo sejam precisas e equilibradas.

Além disso, essas informações são processadas nos setores nervosos responsáveis, como o córtex pré-frontal e armazenadas nas conexões do hipocampo e amígdala.

Isso também ocorre quando fazemos exercícios? Sim, e além de criarmos as memórias armazenadas nessas regiões cerebrais é possível alterar a memória celular. Da célula muscular! Não é incrível?

Esse fenômeno chama-se alteração epigenética. Ao longo de nosso código genético, existem proteínas e outros fatores ligados entre si e ao DNA que alteram o comportamento dos genes sem alterar o código genético original. Esses fatores respondem ao tipo de alimentação e a toda experiência que a célula em questão passa.

Lembrando Darwin: somos resultado de evolução, os mais aptos são os que sobrevivem.  Então aqueles indivíduos com maior capacidade de reconhecer sinais e permitir respostas plásticas a estímulos ambientais, teria capacidade aumentada de responder mais rapidamente a estímulos aprendidos, não só a um nível neuronal, mas muscular também.

Outro ponto importante a se considerar é que as pesquisas revelam que quanto mais jovem iniciar a prática de exercícios físicos, melhor sua capacidade de gerar essas memórias, e assim mais chance de recuperar “a musculatura perdida” mesmo com uma idade mais avançada. Prova de que ao exercitarmos nosso corpo quando jovens, nossa saúde quando mais velhos será melhor, ou ao menos, mais fácil de ser recuperada se perdida.

Infelizmente, hoje em dia um monte de escolas estão atualizando seus currículos e eliminando matérias “inúteis” como artes, música, computação e Educação Física.

Ponto negativo para elas.

Então isso tem a ver com o fato de meu marido até hoje ter um batimento cardíaco super baixo? Sim!

Enquanto ele se exercitava, lá no passado, ocorria a contração dos músculos esqueléticos, do músculo cardíaco, dos músculos lisos de diversas vísceras e a secreção de vários hormônios e tudo isso ajudava a formar uma nova memória celular além dos benefícios observados à época, como a hipertrofia muscular.

Devo confessar que a barriga tanquinho que ele tinha chamou a minha atenção.

O coração também hipertrofia com o exercício físico e faz com que ele fique mais eficiente, ou seja, contrai menos para ejetar o mesmo volume de sangue. Máquina que trabalha menos é poupada. Dura mais.

Durante o exercício físico são liberados hormônios e neurotransmissores que ajudarão o corpo a responder adequadamente ao desafio proposto. São eles: catecolaminas (adrenalina e noradrenalina hormônios produzidos e liberados pela supra renal), insulina e glucagon (hormônios produzidos e liberados pelo pâncreas), hormônio do crescimento (produzido e liberado pela adenohipófise) bem como os neurotransmissores endorfina e dopamina.

Uma série de mudanças ocorre no corpo ao praticar atividade física. De primeira, podemos citar as dores musculares.

Existem diversas teorias para tal fenômeno, mas o que podemos falar com certeza é que ocorrem porque ao realizar exercícios físicos, a maior exigência muscular leva a micro lesões nas fibras do músculo, causando uma inflamação que significa sentir dor e inchaço local. Para se defender, as fibras musculares recrutam um aporte maior de proteínas, provocando um aumento da massa muscular, fato facilitado pelas catecolaminas e hormônio do crescimento.

Em segundo lugar os benefícios cardiovasculares.

Ao realizar exercícios físicos com maior intensidade observamos um aumento da frequência cardíaca e respiratória, devido à ação das catecolaminas. A intensa atividade muscular exige um aporte maior de nutrientes, inclusive oxigênio, portanto, elevar o trabalho do coração bobeando sangue mais rápido e em maior volume para que o pulmão o preencha de oxigênio favorece o trabalho muscular intenso.

Além disso, aumenta gradativamente a capacidade de ambos os órgãos, fortalece a parede dos vasos sanguíneos, melhora a oxigenação de outros tecidos que não só os músculos, como o cérebro por exemplo.

Em terceiro lugar os benefícios no controle glicêmico, especialmente importante para portadores de distúrbios metabólicos como diabetes.

LEIA TAMBÉM:

A HUMANIDADE DENTRO DA HUMANIDADE

GLÂNDULAS: ESTRESSE, AUTOCONHECIMENTO E FELICIDADE

PROFESSORA DE FISIOLOGIA ESCREVE ROMANCES NA INTERNET

A insulina é um hormônio que facilita a entrada da glicose nas células e que durante o exercício físico mantem-se em suas concentrações mais baixas, pois a glicemia tende a se manter bem baixa devido à necessidade aumentada de nutrientes, especialmente aqueles de média a alta intensidade e duração.

Já o glucagon é o hormônio que mantem essa glicose constante durante o jejum ou exercício físico, suficiente para manter órgãos vitais como o cérebro a manter-se em atividade, pois os músculos conseguem outras fontes de energia utilizando um tipo de gordura conhecida por ácidos graxos livres.

Portanto a importância de não fazer exercícios físicos em jejum, correndo o risco de uma hipoglicemia e acidentes na sala de ginástica, sendo os mais comuns: desmaios, enjoos, vômito, dor de cabeça entre outros.

Em quarto lugar: Quer que seu filho cresça? Estimule-o a fazer exercícios físicos! Quer emagrecer? Procure o ânimo perdido dentro de você!

Durante a prática de atividade física, preferencialmente de média a alta intensidade, ocorre um aumento na produção de hormônio do crescimento, que aumenta a formação de proteínas (músculos maiores e mais fortes), aumenta a quebra de lipídios para uso como fonte de energia (emagrecimento), estimula o crescimento (em quem está crescendo ainda, certo?), principalmente por que durante o sono ele também é produzido em maior quantidade, portanto damos mais chances para as crianças crescerem bem e fortes quando elas têm a oportunidade de praticar atividade física.

Em quinto e último lugar: quer ser feliz? Faça exercícios físicos!!

Não há dúvida de que, após passar as primeiros semanas de dor intensa, a realização de exercícios físicos proporciona bem estar, alívio das dores, noites bem dormidas, melhoria da saúde mental, controle da ansiedade e do estresse, redução dos estados depressivos, melhoria do estado de humor entre tantas outras.

As culpadas são as endorfinas e a serotonina. Os sistemas pela qual elas agem recebe uma enorme variedade de teorias e é um pouco mais complicado de explicar devido à sua ação no sistema nervoso central e interações com uma centena de outros neurotransmissores e hormônios.

De forma geral, as endorfinas funcionam como analgésico natural e ainda regulam as nossas emoçõesdando a sensação de prazer e bem-estar, portanto é capaz de ajudar a reduzir a ansiedade e o estresse, aliviando as tensões do dia a dia. Associadas à serotonina podem fazer verdadeira mágica no nosso humor, pois esta, além de sedativa é calmante.

Aqui estão apresentados os mais conhecidos e estudadosefeitos dos exercícios sobre as funções fisiológicas, apesar de ser tema quase infinito de conversa, é necessário encerrar, mas acima de tudo, quando decidi falar sobre isso, foi baseada em observações feitas em relação à minha própria família e o quão difícil foi colocar todos em movimento.

E o quanto todo o esforço valeu a pena. (foto acima: agenciaaids.com.br)

 

MEMÓRIAELAINE FRANCESCONI

Bacharel em Zootecnia (UNESP Botucatu). Licenciatura em Biologia (Claretiano Campinas). Mestrado (USP Piracicaba) e doutorado (UNICAMP Campinas) em Fisiologia Humana. Professora Universitária e escritora