Como as vivências de transfiguração ampliam o sentido da vida e assopram as dores.
Há histórias que são muito tristes. O coração do bebê parou de bater algumas horas antes de seu nascimento. Atroz! Uma cova entre os sonhos maternos e a realidade. Os médicos, após o acontecido, consideravam que a mocinha, de 18 anos, deveria ficar mais tempo no hospital. Suplicou a alta. Desejava tratar de questões ligadas à filha. Por ser feriado de ano novo, não havia flores para colocar no caixão diminuto. Virou-se com as margaridas do quintal de sua casa. E um fato que me deixou abismada: o cemitério, para pessoas de baixa renda, não abriu no primeiro do ano. Para acrescentar: junto ao ossário, segundo ela, dependentes de crack montaram um ponto de consumo de drogas. Foram dois dias de velório. Disse-me que se surpreendeu com a resistência da filha, por 48 horas, no aguardo do sepultamento. Contou-me com ar de vitória e com a conclusão de que se tornara um anjo valente junto de Deus. Emudeceu-me.
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No domingo posterior, o Evangelho foi da Transfiguração de Jesus. A Missa, de que participei, foi celebrada pelo Padre Milton Rogério Vicente, pároco da Catedral Nossa Senhora do Desterro. São Marcos (9, 2-10) relata, em seu Evangelho, que Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e os levou sozinhos a um lugar à parte sobre uma alta montanha. E transfigurou-se diante deles. Suas roupas ficaram brilhantes e tão brancas como nenhuma lavadeira sobre a terra poderia alvejar. (…) Então desceu uma nuvem e os encobriu com sua sombra. E da nuvem saiu uma voz: “Este é o meu filho amado. Escutai o que ele diz!” Padre Milton comentou, em sua homilia, com muita clareza e profundidade, como é próprio dele, sobre a importância de, todos os dias, vivenciarmos um pouco do Céu para não perdermos a esperança. A memória da transfiguração de Jesus venceu as sombras do medo no Calvário. A mãe da menina me parece ter essa consciência, pois é da certeza do reencontro.
Tenho procurado ficar atenta aos sinais que o Senhor me dá, todos os dias, para ampliar a expectativa da Páscoa.
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE
Com formação em Letras, professora, escreve crônicas, há 40 anos, em diversos meios de comunicação de Jundiaí e, também, em Portugal. Atua junto a populações em situação de vulnerabilidade social. Acesse o Facebook de Cristina Castilho.