Dentre as vivências da Quaresma, me vem a mensagem do Papa Francisco para este ano. Ele inicia com uma colocação de Jesus, em Jerusalém, no Monte das Oliveiras, aos seus discípulos, sobre o fim dos tempos, relatada por São Mateus (24, 12): “E, ante o progresso crescente da iniquidade, a caridade de muitos se esfriará”.
Quanta gente apegada a si mesma, sem conseguir enxergar as dificuldades do outro ou, ainda, procurando destruí-lo mais. Às vezes, dentro da própria casa. E agiganta-se o poder do egoísmo.
Ainda no texto, o Papa cita a Divina Comédia: “ao descrever o Inferno, Dante Alighieri imagina o diabo sentado num trono de gelo; habita no gelo do amor sufocado. Interroguemos então: como se resfria o amor em nós? Quais são os sinais indicadores de que o amor corre o risco de se apagar em nós?” . E Francisco especifica alguns sinais de escassez de amor, na falta de cuidados com “o bebê nascituro, o idoso doente, o hóspede de passagem, o estrangeiro, mas também com o próximo que não corresponde às nossas expectativas”.
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Recordei-me da moça que, para ser solidária ao irmão, foi visitá-lo por diversas vezes na cadeia. Desequilibrou-se no local, embora ficasse apenas algumas horas. Soube dos insetos, dos roedores, dos fantasmas que habitavam o pátio e as celas, viu os hematomas… Para suportar seu abatimento, o espaço de gelo, passou a usar drogas. Desfez-se a família. Os filhos choravam pela mãe, contudo ela não tinha mais condições de escutá-los. Encontrava-se narcotizada. Tentou firmar as pernas , mas os pés continuaram bambos. Numa noite, sem estrelas, com o cachimbo na boca, próxima à linha do trem, outro espectro, julgando-a assombração, empurrou-a. Não houve tempo para o apito do trem.
Diversos, ao saberem que partira com o comboio da madrugada, consideraram normal, devido aos seus desatinos. Conclusão gélida.
Repito com o Papa Francisco: “Como se resfria o amor em nós”. (foto: www.vaticannews.va)
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE
Com formação em Letras, professora, escreve crônicas, há 40 anos, em diversos meios de comunicação de Jundiaí e, também, em Portugal. Atua junto a populações em situação de vulnerabilidade social. Acesse o Facebook de Cristina Castilho.