BELLA TOZINI: “Transformo o preconceito em arte”

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Bella Tozini é uma artista e pesquisadora dedicada ao campo da fotografia e publicações de livros e fotolivros. Graduada em Comunicação Social/Cinema pela FAAP, tem especialização pela Escola de Cinema de Lódz, na Polônia e é mestra em Artes Visuais pela Unicamp. Ela mora em Cabreúva e produziu o documentário Me Abraça Forte, gravado em Jundiaí e que trata das vivências afetivas na comunidade LGBT+, apresentando as histórias de Agu Agatha e Ever Ferreira. Bella conta que sofre preconceito por ser lésbica e obesa. O Jundiaí Agora entrevistou a artista:

Você é de São Paulo. Porém, vive e trabalha em Cabreúva. Por que escolheu esta cidade?

Já estou morando em Cabreúva faz 10 anos, é uma cidade que visitava quando criança e tenho boas memórias afetivas! São Paulo já estava muito cinza e barulhenta para mim, então resolvi que queria morar no interior paulista e perto da natureza!

Por que seus trabalhos têm como temática a comunidade LGBTQ+, Bella?

Sou uma mulher lésbica e quando comecei a me dedicar ao meu trabalho autoral como artista visual, achei que o caminho era me conectar com pessoas da minha comunidade. As primeiras pessoas que fotografei com essa temática foram da comunidade LGBT+ de Jundiaí em 2016, rendeu um livro de retratos: “Lacração”. Depois fizemos uma exposição e intervenção urbana na cidade de Jundiaí, “Lacração Territórios”. Durante a pandemia comecei um projeto novo de retratos e depoimentos mais intimistas de pessoas LGBT+ com expressões dissidentes – CORPES Dissidentes, que também rendeu um fotolivro e algumas exposições. 

Como artista já sofreu preconceito por produzir trabalhos assim?

Eu sofro muito preconceito por ser uma pessoa gorda, mais do que por ser lésbica. Sou uma pessoa que acredita no diálogo e tenho como princípio o questionamento dos preconceitos e dos rótulos. O que implica que quando sofro algum tipo de ataque, transformo em arte e devolvo como pergunta. Poderia dizer que este é meu papel como artista: questionar a norma. Proponho reflexões a partir de um pensamento queer e decolonialClaro! Tudo tem limite e quando o outro não está disposto ao diálogo, mas a práticas de violências, eu me retiro e se necessário, eu aciono meus direitos como cidadã. 

Bella, suas obras já causaram polêmicas a ponto, por exemplo, de serem retiradas ou proibidas?

Como disse, estou sempre em diálogo, converso muito com as instituições e espaços parceiros que recebem meu trabalho. Para mim é importante que meus parceiros estejam confortáveis e felizes em me receber e as pessoas que fazem parte do meu projeto. Prezo muito pelo bem estar e segurança. Então, estou sempre alinhada, por exemplo, com a legislação de faixa etária. Se acho que em algum evento poderá surgir alguma indisposição, opto por contratar um segurança. Onde meus trabalhos costumam ser censurados, são nas redes sociais, não posso publicar sem tarjas ou cortes. 

Cabreúva é bem próxima de Jundiaí, cidade que tem uma bancada na Câmara Municipal dita ‘conservadora’ e que já apresentou vários projetos que violam os direitos conquistados pela comunidade LGBT+. Como analisa o posicionamento destes vereadores?

São posições antidemocráticas e inconstitucionais. Por isso, a comunidade LGBT+ precisa estar sempre em alerta, unida e em ação. Liberdade é uma conquista diária. 

Bella, você acredita que a postura deles reflete realmente o que a população de forma geral pensa?

Eu acho que eles contribuem para uma forma de pensamento, um pensamento pautado no medo e na exclusão. Infelizmente, eles alimentam os afetos com  fake news, gerando medo e violência. Percebo como uma  estratégia de dominação dos corpos e dos afetos. Porém, quando converso com as pessoas individualmente, nas minhas exposições, por exemplo, sinto que muitas acreditam na liberdade e na igualdade de direitos para todas as pessoas. 

Como surgiu a ideia do documentário ‘Me Abraça Forte’?

A partir das minhas pesquisas com retratos e depoimentos da comunidade LGBT+, comecei a direcionar  meu interesse para as relações afetivas e amorosas na comunidade. Muitas pessoas LGBTs são expulsas de casa e rejeitadas pelos pais, sofrendo inúmeras violências já na fase da adolescência. Essa falta de amor e cuidado, faz com que muitas pessoas tenham que sair de casa muito cedo e buscar afeto e aceitação entre amigos e pessoas da comunidade. O título veio a partir de uma matéria que li, que dizia que a partir de estudos científicos, que se você abraçar uma pessoa por mais de 20 segundos ela se acalma e os níveis de ansiedade baixam. “Me Abraça Forte” tem a ver com isso, com os abraços que nos acalmam e nos aconchegam.

Como e por quê escolheu as duas personagens?

Ever e Agu, são minhas amigas. Tenho muita admiração pelas pessoas que são e muito feliz em tê-las em minha vida e em meus projetos. Contar as histórias delas foi muito gratificante, elas compartilham seus processos de transição, seus modos de sentir e vivenciar o amor. 

Teve algum tipo de dificuldade para fazer o documentário? 

Não. O curta foi contemplado com o edital da Lei Paulo Gustavo da cidade de Jarinu. A equipe é constituída de pessoas LGBTs e mulheres. Então, foi uma delícia o processo de trabalho! 

Você afirma que o documentário sobre as histórias de Agu e Ever é um convite ao amor em todas suas vivências e expressões. Crê que o público hoje está preparado para todas as faces do amor? Ou: esta obra não será vista apenas pela comunidade e terá a capacidade de mudar a forma de pensar de muitas pessoas?

Espero que o curta-metragem toque os corações de quem assiste, não importa se a pessoa é LGBT+ ou não. O filme é sobre o amor, mas também sobre a falta dele. O que implica que todos nós em algum momento de nossas vidas já amamos, já fomos amados e também já sofremos por amor. As definições sobre o que é amor são diversas, mas transitar por ele em algum momento de nossas vidas acredito que seja universal. 

Quais seus próximos projetos, Bella?

Em paralelo com o lançamento do “Me Abraça Forte”, também estou lançando o curta-metragem “Deságue – Mulheres em Processo”,  sobre três mulheres artistas do interior paulista. (Foto: Beatriz Pastorini)

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