Há políticos ungidos pelo Senhor? Ou: a sedução do poder que inebria

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A chamada “teoria do direito divino do monarca” surgiu na Europa, nos séculos XVI e XVII. Jean Bodin (1530-1596), o francês autor de “Os Seis Livros da República”, foi o autor dessa explicação que salvou os Reis, ameaçados pelo crescimento do poder feudal. Diante da aparente perda de soberania real, buscou-se no apóstolo Paulo o trecho “todo o poder emana de Deus”, para justificar o poderio real. Se um rei estava a exercer o poder, era porque Deus assim o queria. Daí a tentativa de converter a coroação num oitavo sacramento e o costume de alguns monarcas europeus serem coroados pelo Papa ou por seu preposto. Mas, será que há políticos ungidos pelo Senhor?

Essa doutrina consolidou-se e fortaleceu o absolutismo. E perdurou até praticamente nossos dias. Hailé Selassié, o Imperador da Etiópia, era considerado herdeiro dos deuses. Também tinha origem divina o Imperador do Japão, até a II Guerra. A História conta que alguns japoneses fiéis ao Império se recusavam a aceitar que o Japão perdera a guerra e chegaram a praticar suicídio.

A tentativa de se considerar “ungido do Senhor” é sedutora. Governantes megalomaníacos e personalistas ao extremo não hesitam em afirmar que são os eleitos pela Providência Divina para trazer ordem, progresso e paz para a Nação que governam. Um deles foi Berlusconi, que deu um exemplo sem precedentes na história da Itália, de personalização da política. Editou doze milhões de livros de sua biografia. Para Norberto Bobbio, que foi um contundente crítico dele, o excesso de fotos mostrou “para além de qualquer razoável dúvida, que figura ele é, uma figura em relação à qual os cidadãos, que conservaram ainda um pouco de bom senso e de senso de humor, perguntam-se, surpresos, se não perdeu o senso de ridículo”.

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Quanto à pergunta do título – há políticos ungidos pelo Senhor? -, fica claro que o poder inebria. Faz perder a noção das coisas. Pode levar ao ridículo, o que não é o pior. Pode levar à prepotência, essa sim, perigosa. Só mesmo pedindo a Deus, para que a lucidez, a sensatez, o discernimento, seja a regra, não a exceção.(Foto: www.xplace.com)

JOSÉ RENATO NALINI

Desembargador aposentado, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Presidente da Academia Paulista de Letras.

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