O inverno vem carregado de uma capa de mistérios: suas noites frias e longas, seus silêncios abafados e as possibilidades de neblina trazem um ambiente intimista mais acentuado e profundo. Convoca-nos a refletir e a sonhar com algumas intenções mais escondidas e profundas, que reservamos para um momento de mais tranquilidade. Ainda bem que o inverno dura apenas quatro meses, pois acredito que seja no inverno que mais sentimos falta dos nossos amados mais amados. Dos abraços mais longos, dos afagos e sintonias afetivas.
Vivemos um redemoinho de emoções, de maneira que cada época nos direciona a algo que encontre eco com a situação, apesar de sentirmos tudo a todo momento. Não se pode dizer que esta emoção é específica desta ocasião: somos bombardeados pela emoções, sejam elas quais forem, a todos os instantes, entretanto, algumas características temporais nos possibilitam expressar e sentir algumas delas com mais profundidade. Ai está a magia da vida.
Na história do homem, desde sempre ele se nos apresenta versátil no trata das emoções; avança pelo tempo como se dominasse seus sentimentos e emoções e, acima de tudo, flanando pelas dores e gozando nas alegrias, apesar de não ser bem assim. Todos temos nossos limites e nossas restrições, bem como todos sentimos imensamente os prazeres a que nos permitimos porém alguns conseguem viver com intensidade e outros fingem viver esta forma intensa que não se concretiza.
Então, os intensos são mais sujeitos a enganos, vacilos e surpresas, quando não se dão conta das emboscadas que permitiram criar. São situações falaciosas e incomodas que se encontram nas searas das paixões: estas são turbulentas e agitadas mas não têm garantia de durabilidade nem de profundidade. São fugazes. E, por terem estas características, falaciosas e doloridas.
Pelo seu teor vulcânico, são envolventes, intensas e irresponsáveis, deixando marcas profundas nos que se permitiram enredar pelo sonho sem amarras. Talvez estejamos falando da responsabilidade que se cria ao encontrar alguém com quem se possa dividir espaços, tempos, palavras, projetos; e este alguém são nossos pais, amigos, filhos, parentes, colegas de trabalho. Não necessita ser alguém com quem se tenha uma relação amorosa ou carnal; são aqueles em quem confiamos, em quem depositamos nossos segredos e apoios.
Acontece que, por ser uma paixão desenfreada, a responsabilidade não encontra ancoragem e as amarras não se estabelecem. Pensar na história de responsabilidade que escrevemos com outra pessoa, pressupõe pensar em alegrias e dores que contrataremos ao longo de nosso percurso com esta parceria, portanto, deveria nos levar a entender que tudo está por ser planejado e de comum acordo entre as partes: isto é parceria.
Vemos algumas propostas pouco sadias por não se haver pensado nas dores vou causar no outro quando quebro o pacto. Quando deixo de corresponder com o contrato inicial e não me permito ser parte daquele “combo” que inicialmente era perfeito e equilibrado. Caso a retirada desta parceria seja explicita, seja aberta e bem resolvida, as coisas caminharão para seu fim, com dignidade.
Ao contrário disso, teremos uma ruptura abrupta e dolorida, em que uma das partes sofrerá muito e outra parte não terá dimensão do mal que fez. Então, cabe a pergunta: será que a coisa não se trata de lealdade? Se temos um pacto com a outra pessoa, ser desleal é desperdiçar o respeito, o amor, a parceria. No mínimo uma sinalização de que, no decorrer do caminho, algum plano mudou. Mas, estes acontecimentos são muito mais comuns do que possamos imaginar.
Os laços afetivos não atendem apenas movidos pela inteligência: são afetivos e como tal se permitem levar pelas pulsões e se apropriam de espaços sem muita vigília, momentos mais frágeis e situações mais delicadas, a que todos estamos sujeitos. Poderíamos dizer que as emoções funcionam como dois cavalos: o da paixão que me traz o apego, uma queda à afetividade pelo outro, uma busca por alguém que acolha e o outro cavalo, o da agressão, que nos faz lutar, brigar, rebelar, ultrapassar os limites e transgredir.
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NOSSAS VIDAS SÃO COM OS QUE FICAM
Ter estes cavalos domados é uma tarefa para a Vida. Às vezes damos conta de alimentar bem os dois e mantê-los firmes e fortes, cada um em seu devido espaço e momento. Em outras ocasiões somos levados a zelar por um deles, visto que não damos conta de tudo a todos os tempos; então estaremos sujeitos às regras que nos são mostradas pela nossa escolha e aos seus impulsos, que trarão emoções e sentimentos relativos a esta escolha. É o momento em que nos lamentamos por não termos dado atenção à nossa intuição ou à nossa inteligência, restando-nos torcer pela nossa segurança mental e afetiva.
E assim vamos construindo nossas histórias, pontuadas de momentos bons e outros não tão bons, porém resultados de nossas escolhas, o que se torna difícil é entender como podemos escolher tão mal. Ou tão bem. O valor sempre será dado no transcorrer do processo, porém é bem possível percebê-lo enquanto vamos edificando nossa estrada, que sempre é muito cheia de detalhes e surpresas, que aparecem e parecem querer dizer algo. Basta querer ouvir…só que não!!!(Foto: br.freepik.com)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO
É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.
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