As discussões envolvendo temas sérios e conflitantes como política, religião e gênero têm se tornado cada vez mais presentes em diversos contextos sociais, seja nas conversas cotidianas ou nas mídias digitais. Esses temas são inevitavelmente polêmicos, pois tocam em valores pessoais, identidades e visões de mundo.
No entanto, diante de questões tão sérias e conflitantes, o consenso parece difícil de ser alcançado, enquanto o medo e o desconhecimento surgem como barreiras para um diálogo aberto e construtivo. Esta crônica busca refletir sobre as dificuldades de se estabelecer um consenso sobre esses temas e como o medo e a falta de conhecimento alimentam o conflito, muitas vezes impedindo avanços sociais significativos.
Estabelecer um consenso sobre política, religião e gênero é um dos maiores desafios da sociedade contemporânea. A diversidade de opiniões, valores e crenças faz com que, ao invés de uma convergência de ideias, haja um distanciamento entre grupos, muitas vezes reforçado por uma polarização.
Quando se fala em política, por exemplo, os debates muitas vezes se tornam acirrados, com argumentos emocionais que beiram o irracional. Cada grupo defende sua posição como a única correta, sem abertura para o diálogo e a compreensão do outro.
Na religião, o consenso é ainda mais difícil de ser alcançado, devido à multiplicidade de crenças e à importância da fé no desenvolvimento da identidade individual. O que uma pessoa acredita sobre o sagrado ou o divino é, em muitos casos, parte fundamental de sua visão de mundo, tornando-se um ponto inegociável.
Assim, debates inter-religiosos ou mesmo intrarreligiosos podem se tornar extremamente sensíveis, levando ao conflito e à intolerância. Algumas religiões mais resistentes e menos porosas são bastante inflexíveis e inclementes com tudo aquilo que não combine com seus dogmas.
Em relação ao gênero, as discussões têm ganhado cada vez mais destaque, especialmente com o aumento da visibilidade de movimentos que defendem os direitos das pessoas LGBTQIA+. No entanto, a resistência de parte da sociedade a essas novas compreensões sobre identidade de gênero e orientação sexual revela a dificuldade de se alcançar um entendimento comum. As ideias tradicionais sobre masculinidade e feminilidade ainda estão profundamente enraizadas, o que impede um consenso mais inclusivo e progressista.
O medo desempenha um papel crucial na manutenção de conflitos em torno dessas questões. O medo do desconhecido, por exemplo, leva muitas pessoas a rejeitarem discussões sobre temas como identidade de gênero ou mudanças políticas, preferindo se apegar ao que já conhecem ou ao que consideram seguro.
Esse medo está diretamente relacionado à perda de uma identidade ou de um senso de estabilidade que determinadas crenças e ideologias proporcionam. No campo político, o medo de mudanças drásticas gera reações intensas, como vimos em diversos movimentos populistas que, ao se basearem na aversão ao “outro”, promovem a manutenção de sistemas políticos excludentes. Em uma sociedade cada vez mais plural, o medo do que é diferente alimenta a xenofobia, o racismo e a homofobia, intensificando os conflitos e dificultando ainda mais a criação de um diálogo produtivo.
Em questões religiosas, o medo se manifesta como uma defesa fervorosa das próprias crenças, muitas vezes consideradas ameaçadas por outras ideologias ou sistemas religiosos. Esse medo leva à intolerância e, em casos mais extremos, à violência religiosa. Assim, o diálogo inter-religioso é muitas vezes comprometido pela resistência de grupos em questionarem suas próprias crenças ou se abrirem para novas perspectivas.
Em relação ao gênero, o medo de desconstruir padrões estabelecidos de masculinidade e feminilidade também impede avanços sociais. A desconstrução de tais padrões pode ser vista como uma ameaça à ordem social estabelecida, fazendo com que muitas pessoas resistam às mudanças que visam incluir e respeitar as diversidades de identidade de gênero e sexualidade.
Esse medo é muitas vezes instrumentalizado por discursos conservadores que buscam manter uma visão tradicional da sociedade. O desconhecimento sobre questões complexas como política, religião e gênero também é um fator que perpetua conflitos e alimenta o medo.
A falta de informações precisas ou a disseminação de fake news dificulta a formação de uma opinião fundamentada e gera mal-entendidos sobre o que está realmente em jogo. Na política, por exemplo, a manipulação de informações e o desconhecimento sobre as implicações de determinadas políticas públicas contribuem para uma sociedade desinformada e polarizada.
O mesmo ocorre no campo religioso, onde a falta de conhecimento sobre outras tradições religiosas gera preconceito e intolerância. Muitas pessoas, por exemplo, desconhecem os princípios básicos de religiões como o islamismo ou o budismo, e baseiam suas opiniões em estereótipos e generalizações que não correspondem à realidade.
Esse desconhecimento cria barreiras que impedem o diálogo inter-religioso e a coexistência pacífica entre diferentes comunidades de fé. Em relação ao gênero, o desconhecimento sobre as complexidades da identidade de gênero e orientação sexual resulta em discursos simplistas e preconceituosos.
Termos como “gênero não-binário” ou “transexualidade” ainda são desconhecidos para uma grande parte da população, o que alimenta a discriminação e a marginalização de pessoas que se identificam dessa forma. A educação e o acesso à informação são fundamentais para desmistificar esses conceitos e promover uma compreensão mais inclusiva e respeitosa das diversidades de gênero.
As discussões sobre política, religião e gênero são complexas e conflituosas e a falta de consenso sobre esses temas é, muitas vezes, alimentada pelo medo e pelo desconhecimento, que se espalha pelo país como algo totalmente inconsequente e comum.
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No entanto, o diálogo aberto e informado é a única forma de superar essas barreiras e avançar em direção a uma sociedade mais justa e inclusiva. É essencial que, como indivíduos e como sociedade, estejamos dispostos a enfrentar nossos medos e questionar nossas próprias convicções, buscando sempre aprender e entender o outro.
Só assim será possível transformar conflitos em oportunidades de crescimento e construir um consenso que respeite a diversidade e promova o bem comum. A transformação sempre parte do indivíduo que, em passos lentos e precisos vão se alinhando e possibilitando as mudanças sociais.(Foto: Cottonbro Studio/Pexels)
AFONSO ANTÔNIO MACHADO
É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Leciona na Faculdade de Psicologia UNIANCHIETA. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.
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