Os mais antigos ainda chamam de GO (assim mesmo, ge-ó) o quartel da Vila Rami. Lembranças de um tempo em que Jundiaí abrigava dois quartéis – um no Centro, o da 2ª Companhia de Comunicações, outro pelos lados da Estrada Velha de São Paulo. Os mais antigos ainda deixaram gravadas suas lembranças, como a transformação do grupo de Artilharia de Montanha, depois Artilharia de Dorso, e novamente Artilharia de Montanha, hoje Artilharia de Campanha. Mas sempre artilharia. E da pesada. É o maior calibre (155 milímetros) do Comando Militar Sudeste, ao qual está subordinado. Não importa a nomenclatura. Em 104 anos, o 12º GAC construiu uma história que se confunde com a história do País nas situações em que legalidade ficou em risco. Nos dias atuais, poucos são os que estão vivos para relembrar tempos antigos. Tempos em que muitos queriam “servir o quartel”, enquanto outros evitavam passar um ano fardados, de cabelos cortados no estilo recruta, recebendo treinamento militar. Neste mês comemora-se o centenário do GAC. As origens do quartel estão em dezembro de 1919. Porém, o decreto criando-o é de outubro de 1922.(A foto acima foi feita em 1956. A via Anhanguera, ligando São Paulo a Jundiaí, tinha sido inaugurada em 1940. Em 1953 foi duplicada.
Os que passaram pela caserna trazem consigo as lições de vida, de formação de caráter e de valorização da terra em que vivem – a terra que chamamos de Pátria. A eles não importam as recordações de longas marchas, dos coturnos de couro duro que machucavam os pés, da mochila pesada, dos sargentos que extraíam dos então soldados o máximo nos exercícios físicos e treinamentos de tiro. Tudo valeu a pena.
Os tempos mudaram. Os coturnos são mais confortáveis. O fardamento é adaptado ao clima. Mudaram em termos. O 12º GAC, como todo o Exército, conserva sua essência. Quem passou por castigos durante o Serviço Militar, como pernoites e até mesmo cadeia, hoje dá razão ao sargento ou tenente algoz: eu mereci. Alguns vão mais longe: não fossem tais castigos não sei o que seria de mim hoje. Talvez um inútil.
Como em 1964. Nesse ano, no dia 2 de abril, a tropa fez uma jornada – 450 quilômetros, de São Paulo a Curitiba, sem paradas. Um feito da Artilharia, com meios próprios, como reforço à 5ª Região Militar. Em anos anteriores, o grupo já havia demonstrado que não estava para brincadeira.
Um lugar para a Artilharia de Dorso
Em 1942, no meio da 2ª Guerra Mundial, o Exército pretendia criar um Regimento de Artilharia de Dorso, usando o grupo já existente em Jundiaí. Em março, o comandante da então 2ª Divisão de Infantaria mandou ofício à Prefeitura de Jundiaí explicando o plano e pedindo ajuda (200 mil contos de réis) para a compra de um terreno para instalar o novo regimento. Comparando valores: o primeiro prêmio da Loteria Paulista da época era de 250 mil contos de réis. E essa colaboração seria paga em prestações. O ofício era assinado pelo general Maurício José Cardoso(acima, apertando a mão do então presidente Getúlio Vargas/reprodução: jornal Novo Dia).
Era a Chácara Rami, que acabou comprada pelo Exército. No ano seguinte, o Grupo de Artilharia de Dorso já se exercitava na área, e ainda promovia provas hípicas. Sobravam mulas e cavalos para o transporte da tropa e armamento. O regimento acabou não se instalando por questões lógicas – em 1946 o grupo passou a se chamar 2º Grupo de Obuses 155 – e o equipamento, até hoje o maior da Artilharia, foi recebido pela unidade.
Algumas construções da época de Chácara Rami estão preservadas. A casa principal – sede da chácara – é hoje o Hotel de Trânsito do 12º GAC. E lá morou a família Cardia, dona da Cerâmica Rami, que depois se tornou Cidamar e atualmente é a Roca.
Cardoso, que deu início à atual sede do 12º GAC, foi militar de carreira brilhante. Incorporou-se ao Exército com 15 anos, em 1895, no 5º Batalhão de Infantaria, onde chegou a 2º sargento. Em 1902 entrou para a Escola Militar da Praia Vermelha e em 1906 foi declarado aspirante a tenente na Escola de Guerra de Porto Alegre.
Com seguidas promoções, chegou a general de divisão (na época o maior posto) e ocupou o cargo de Chefe do Estado Maior do Exército. Foi iniciativa de Cardoso a construção do monumento a Duque de Caxias, na Capital, inaugurado em 1960. Cardoso morreu em 1968.
Os tempos mudaram o comportamento dos jovens que hoje são alistados. Jovens que encaram o Serviço Militar como uma oportunidade de aprendizado, de crescer na vida como cidadãos. Não fosse a tradição, o Serviço Militar nem precisaria mais ser obrigatório. Sobram voluntários. Em tempos antigos, muitos seguiam carreira. Dizia-se que engajavam-se no Exército. E lá ficavam até a aposentadoria – oficialmente ‘reforma’ – como sargentos, no máximo.
Aposentou-se o velho mosquetão. Aquele que fazia doer o ombro ao atirar se a posição não estivesse correta. As armas atuais são mais leves, mais precisas. Usá-las, só se preciso for. Os velhos canhões de 75mm (Schneider) e de 90mm (Krupp) são peças de museu. Decorativas, e cheias de história. O obus de 155mm mostrou em mais de uma oportunidade seu poder de persuasão e sua eficiência. Armamento pesado, que em nenhum momento impediu a rapidez de movimentação da tropa.
Em 1924, por exemplo, integrou a 2ª Brigada de Artilharia em movimento revolucionário (Revolta Paulista). Em outubro de 1930, irrompeu outro movimento revolucionário em vários estados (o golpe que depôs o presidente da República, Washington Luís, em 24 de outubro, impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes e pôs fim à República Velha).
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O grupo estava em manobras na região de Indaiatuba, e ao voltar para Jundiaí, recebeu ordem – e a cumpriu – enviou uma bateria de sua artilharia para Campinas e outra para Capela da Ribeira, onde estava o destacamento de Quitaúna. Tempos agitados. Em 1932 aconteceu a Revolução Constitucionalista. O 12º GAC esteve presente.
Em 1933 foi incorporado ao 4º Regimento de Artilharia Montada de Itu, e só voltou a Jundiaí em 1935. Dois anos depois (1937) o grupo se deslocou para Laguna, em Santa Catarina, onde ficou oito meses no estado e no Paraná. Uma missão de pacificação, de restabelecimento da autoridade e da unidade nacional, ameaçadas por revolucionários instalados no Sul do País. Em 1961 uma crise política, que começou com a renúncia do presidente Jânio Quadros em agosto, no Dia do Soldado, levou o GAC, no mês seguinte, a se deslocar com uma de suas baterias de obuses, durante oito dias, para Registro e Juquiá.
E antes de tudo isso, Jundiaí teve um tiro de guerra, noticiado na época como um dos mais antigos do Brasil. Era o TG 132, extinto em 1936. Em setembro de 1932, esse Tiro de Guerra – na época chamado Linha de Tiro – inaugurou seu stand de tiros na região da Colonia. Durante a revolução de 1932 coube aos integrantes do TG o policiamento da cidade – o Exército e a Força Pública (hoje Polícia Militar) estavam ocupados com a revolução.
A sede do TG ficava na rua Capitão Damásio – hoje rua Marechal Deodoro da Fonseca. Mas em 1936 criou-se uma Unidade Quadro. E essa unidade era parte do 2º Grupo de Artilharia de Dorso – hoje 12º GAC – uma bateria destinada a formar reservistas de segunda categoria.
Os tempos mudaram. E como mudaram. Os sisudos militares de décadas passadas deram lugar a oficiais jovens, de excelente formação. O 12º GAC mostrou-se como um porto seguro para toda a sociedade, hoje totalmente integrada com os militares. Pelo 12º GAC passaram aspirantes – e muitos voltaram como oficiais e comandantes. E dele saíram para ocupar cargos importantes na República. Tornaram-se generais.
A integração é tamanha que o 12º GAC ganhou um complemento à denominação – Grupo Barão de Jundiahy. E com ele, criou-se a Assagby em 2001 – Associação dos Amigos do 12º GAC – Grupo Barão de Jundiahy. Associação sempre presidida por pessoas íntegras, devotadas e que não buscam projeção social ou política. Uma associação que formalmente reúne dezenas de pessoas, mas que na prática engloba toda a população de Jundiaí e cidades da região(Texto: Anselmo Brombal/Novo Dia – Fotos: acervo Professor Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí).
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