Se considerarmos a data de assinatura do acordo de rendição da Alemanha nazista, ocorrido em 8 de maio de 1945, o término da 2ª Guerra Mundial completou 76 anos em maio. Se considerarmos a rendição do Japão, após o bombardeio das cidades de Hiroshima e Nagasaki, o término completará 76 anos em 2 de setembro.
Ainda que escassos, podemos ouvir relatos de sobreviventes, que eram crianças na época da 2ª Guerra. Certa vez disse-me um senhor judeu, com um número tatuado no braço: “ Esse assunto jamais deveria cair no esquecimento, não por vingança, mas para servir de alerta contra o autoritarismo”.
Se perguntarmos a qualquer cidadão bem informado sobre a 2ª Guerra Mundial, com certeza saberá dizer quais os países envolvidos e os locais dos campos de concentração na Europa. Mas se perguntarmos se tem conhecimento de campos de concentração no Brasil, por certo dirá que não, e até duvidará.
Há alguns anos, ganhei o livro “O Canto do Vento”, do escritor Camões Filho e fiquei impressionada com os relatos ali publicados. Não contém só relatos, dá provas. A obra é iniciada com a partida do navio Windkurt de Hamburgo, na Alemanha, para uma viagem turística à África, no ano 1939, quando já havia conflitos mas não guerra declarada.
Em setembro desse ano, quando o Windkurt estava na Cidade do Cabo, África do Sul, irrompeu a guerra. O capitão recebeu ordem para voltar à Alemanha. Ao sair do porto, cruzou com um navio holandês que telegrafou aos ingleses, informando o local do navio alemão; o capitão mudou a rota e veio para a América do Sul. No dia 7 de dezembro de 1939, chegou ao porto de Santos. Os turistas desembarcaram e se hospedaram em pensões santistas. Não havia como retornar à Alemanha.
No dia 18 de agosto de 1942, alguns navios brasileiros, como: Araraquara, Baependi, Itagiba, Bagé e outros, foram atacados – supostamente por alemães e afundaram. O Brasil rompeu relações com a Alemanha. Os tripulantes do navio atracado em Santos tiveram seus documentos confiscados. A polícia procurou os alemães que estavam nas pensões e lhes deu voz de prisão: “Vocês estão presos por causa da guerra!”, disseram. Remexeram em suas malas e encontraram um livro intitulado “Kochkunst Führer” (de receitas culinárias) e acharam que eram informações do Führer, como Hitler era chamado.
Os alemães foram transportados para a Hospedaria dos Imigrantes, em São Paulo, ficando com os tripulantes de um navio italiano, presos também. Permaneceram nesse local por cinco meses. Depois, a Polícia Especial, de Getúlio Vargas, os transportou em trens blindados para o campo de concentração instalado em Pindamonhangaba. Nessa época havia, também, campos de concentração em Bauru, Pirassununga, Ribeirão Preto e Guaratinguetá.
Esses campos de concentração sempre foram negados pelo Governo do Brasil. Argumentavam que eram ‘campos de internação’, mas os documentos exibidos pelos antigos prisioneiros provam que a denominação era “campo de concentração” mesmo.
Nos formulários, preenchidos por policiais brasileiros, está bem claro esse nome. Exemplo: “ Josef Müller/Campo de Concentração de Pindamonhangaba/São Paulo/Brasil”. Permaneceram nesses lugares até setembro de 1945, término da guerra. Quando soltos, o governo não sabia o que fazer com eles, não tinham orientações sobre isso. Um ex-prisioneiro relatou: “Nos libertaram às 10 horas da noite, chovia e fazia frio, sem um tostão e sem falar português, não tínhamos para onde ir. Rumamos para a Delegacia dos Estrangeiros, em São Paulo. Precisávamos ter documentos porque os nossos tinham sido confiscados pela polícia de Santos. Sofremos muito porque, ao passarmos, as pessoas gritavam: Olhem os nazistas! Nazistas!, e éramos judeus. Em 1952, o Consulado Alemão nos ofereceu retorno à Alemanha, alguns aceitaram, outros não”.
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Hoje, o antigo campo de concentração de Pindamonhangaba pertence à Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, onde funciona a Estação Experimental de Zootecnia; todos os vestígios do campo sumiram, as únicas testemunhas somos nós que, devido à idade, temos pouco tempo de vida para provar esse confinamento. Sobre os demais campos não temos notícias.
Como disse o meu amigo judeu, que tinha um número tatuado no braço: “Esse assunto jamais deve cair no esquecimento, não por vingança, mas para servir de alerta contra o autoritarismo”. (Foto de dezembro de 2002 – Crédito: André Nieto. Folhapress/memorialdaresistenciasp.org.br)
JÚLIA FERNANDES HEIMANN
É escritora e poetisa. Tem 10 livros publicados. Pertence à Academia Jundiaiense de Letras, á Academia Feminina de Letras e Artes, ao Grêmio Cultural Prof Pedro Fávaro e á Academia Louveirense de Letras. Professora de Literatura no CRIJU.
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