Três PERCEPÇÕES básicas para a formação do jovem atleta

O momento esportivo geralmente traz e propõem uma série de provocações que nem sempre são percebidas pelos treinadores ou responsáveis pelo pai do atleta e por seu preparador. Existe uma preocupação excessiva por parte dos membros da comissão técnica com preparação física e tática, sempre negligenciando os aspectos técnicos e psicológicos, ampliando a defasagem já existente no jovem aprendiz.

Por que acontece isso: questões psicológicas nunca foram preocupação no mundo do esporte, nem durante toda a preparação, nem durante o desenvolvimento destes atletas. Desconsideram-se os fatores psicológicos por entenderem que se o atleta for forte e tiver esquema tático, nada mais interessa.

Tal ignorância e redução no mundo esportivo é suficiente para grandes desastres, semelhantes aos que vimos e vivemos na Copa do Mundo de Futebol, no Rio de Janeiro: tínhamos os maiores nomes do futebol mundial, mas as piores cabeças na atuação em campo. O resultado desta Copa lembraremos eternamente. Diferente daquilo que a Alemanha nos apresentou.

Algo nos impede de lembrarmos que o atleta, como todos nós, tem um limite físico que é testado diariamente, possibilitando o aparecimento de dores crônicas, cansaço excessivo e até mesmo lesões, acarretando divulgações desagradáveis na mídia especializada, além de uma alteração psicológicas relacionada a frustração, medo, raiva, ansiedade, insegurança, diante da impossibilidade de atuação.

Isto é suficiente para entendermos que o equilíbrio emocional é algo a ser melhor trabalhado na preparação global do atleta, favorecendo a uma maior segurança durante a prática da aprendizagem, especialização e competições. Saber    manejar as emoções é uma habilidade que precisa ser devidamente trabalhada com os professores, técnicos, atletas e dirigentes, de preferência durante todo o processo de preparação e não apenas em momentos pontuais, no momento de uma grande competição.

Sempre é momento de se perceber que as emoções interferem diretamente em ações específicas, influenciando nas nossas tomadas de decisões, em nossos medos e vergonhas e nas nossas relações interpessoais. Num momento em que nossos sentidos estão voltados à uma tarefa muito habilidosa, em que o resultado e a performance caminham lado a lado, as emoções precisam estar bem calibradas.

É necessário que estejamos antenados para compreender as funções das emoções, não só no esporte como em todas as facetas funcionais que desempenhamos no decorrer de nossa vida, garantindo, assim, uma forma de equilíbrio emocional que nos proporcione o bem estar necessário para uma vida saudável, menos estressante.

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O que não se compreende é a existência da vergonha no esporte, porque ela é inadmissível neste espaço público. Neste meio social, a coisa reinante é a superioridade e o poder, e a vergonha parece desqualificar a pessoa. Ela gera certo incômodo na rotina das pessoas, em especial daquelas pessoas públicas como os atletas e treinadores, por isso, é necessário que se saiba com propriedade sobre seu conceito.

Profissionais do esporte necessitam ter noções das implicações da vergonha para a prática e como enfrentá-la para que seja melhor manejada, não exercendo papel de vilã no que diz respeito a performance máxima de um indivíduo, mas reverta em benefício e como ferramenta para um bom desempenho.

Ela é tão importante para o homem que é capaz de acarretar diversas alterações no estado de ativação corporal, uma vez que causa mudanças fisiológicas, principalmente, por meio do sistema visceral, promovendo alterações comportamentais e motoras que incidem negativamente na pratica esportiva.

Por não olharmos de frente para a vergonha ou por não assumirmos que ela existe e que no esporte ela faz a diferença, os estudos apontam-na como algo que traz uma sensação de queda, de inferioridade, de insegurança, indignidade, alimenta a possibilidade de desconforto afetivo, que acarreta na diminuição de si e no medo da exposição publica.

Vale lembrar que a vergonha tem forte relação com a elaboração cognitiva do indivíduo, em especial porque este fica limitado a uma autoavaliação e a uma autoestima fragilizada e deficiente. Tais perspectivas são suficientes para desacelerar a evolução do aprendiz, do atleta e dos profissionais, como um todo.

Um ponto a ser destacado e merecedor de atenção é o conjunto de experiências anteriores de nossos atletas: ou seja, se um indivíduo viveu uma ou mais experiências fracassadas ele tenderá a sentir vergonha de se expor e cometer o mesmo erro em próximas atividades. Entra ai o recurso da preparação psicológica adequada e básica.

E, dentre todos estes assuntos, temos os pais do jovem atleta. Aqueles que incentivam, apoiam, estimulam, planejam e excitam a uma carreira profissional. Trarei uma classificação elaborada por um aluno, que me parece adequada para este momento, visto que André Aroni e muito dedicado a este assunto, levando a seguir a risca sua proposta. Temos:

  • Pais desinteressados: são aqueles que transferem a responsabilidade de cuidar dos filhos para o treinador. Eles inscrevem os filhos em programas esportivos sem ao menos saber se a criança gosta da atividade. Estas crianças podem ser submetidas a situações de estresse, por serem obrigados a praticar uma modalidade, não estando suficientemente motivados a gostar e querer praticar o esporte. Este comportamento pode levar não só ao abandono da prática, como a intolerância futura ao esporte.
  • Pais mal informados: são aqueles que permitem a prática esportiva de seus filhos a partir de uma primeira conversa, mas depois não se envolvem no processo de treino e competições. Nestes casos, não parece haver desinteresse por parte deles, mas uma incompreensão sobre a importância do seu papel frente à formação esportiva do seu filho.
  • Pais excitados: este grupo refere-se aos que tendem a colaborar sempre com o treinador. Frequentam os treinos, se envolvem no processo de forma adequada. Entretanto, em jogos mais empolgantes, se excitam de forma exacerbada, podendo tratar os árbitros de forma ofensiva e prejudicando o ambiente competitivo. Pais nesta categoria não são más pessoas, geralmente não percebem seu comportamento inadequado, e muito menos que estão dando um mal exemplo de conduta social e esportiva aos jovens, além de todo o constrangimento.
  • Pais fanáticos: são os mais problemáticos. Independente de suas experiências no esporte, eles criam um desejo que seus filhos sejam os verdadeiros heróis. Nunca estão satisfeitos com o desempenho e sempre têm sugestões para melhoria deste. Acabam interferindo em todo o processo de preparação, cobram seus filhos a ponto de gerar grandes pressões e falta de prazer pela prática. Exaltam-se facilmente com a conduta dos árbitros e do próprio treinador, criando assim um ambiente hostil e perturbado.

Em outro estudo, Latorre (2001) ao tratar da influência da família no ambiente escolar, classificou o perfil e características em relação a vida competitiva dos filhos da seguinte forma:

  • Os pais desinteressados: sempre ausentes das competições dos filhos, eles são desinteressados ou julgam ter algum outro compromisso mais importante;
  • Os pais úteis: incentivam a participação dos filhos nas competições sempre de forma positiva, sem cobrança desnecessária, com adequação;
  • Os pais excessivamente críticos: criticam os filhos e nunca estão satisfeitos com seus desempenhos;
  • Os pais vociferantes: ficam alterados durante as competições, gritam, gesticulam e chegam a ficar agressivos;
  • Os pais “técnicos”: consideram-se os donos do time, dão instruções aos jovens e, em alguns momentos, passam por cima das instruções do treinador;

Ainda no comportamento e perfil dos pais, um detalhe importante foi apresentado por mim, em minha tese de doutorado, onde destaco que na relação entre pais e filhos esportistas, o atleta pode sentir-se incomodado com a simples presença dos pais na arquibancada ou ambiente competitivo. Seguindo, aponto que a justificativa para este “incômodo” pode ter origem em alguns fatores: (a) atitudes exageradas dos pais na arquibancada, assim como apresentado nas classificações acima; (b) uma relação conturbada entre os pais e os filhos, mesmo que por motivos não relacionados ao esporte; (c) algum trauma na infância do jovem que seja projetado nos pais; (d) o silêncio dos pais durante a competição.

Temos que compreender que cabe aos pais o trabalho de motivar seus filhos, porém sem adoecê-los, sem castrá-los, sem machucá-los; os extremos podem deixar as crianças e jovens mais vulneráveis. Não há um perfil ideal ou exato ou do momento: há sempre a necessidade de compor um perfil para cada ocasião e ter sempre uma orientação profissional adequada, visto que a Psicologia do Esporte é hoje um diferencial para aquele que se perfila nas imediações da carreira esportiva. (foto acima: www.ad2m.com.br)

 

PERCEPÇÕESAFONSO ANTÔNIO MACHADO

É docente e coordenador do PPG- Desenvolvimento Humano e Tecnologias da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduando em Psicologia.