SINAIS DOS TEMPOS: Atualidades e descasos

sinais dos tempos

Complicado como vemos a ligeira rotulação de transtornos e distúrbios em nossas crianças. De repente, de uma maneira bem acentuada, professores encaminham seus alunos a psicólogos, com hipótese diagnóstica de autismo ou hiperatividade. Em sua inocência, estas crianças são, no máximo, ativas e próximas de uma genialidade que a escola não consegue abarcar. Sinais dos tempos…

E lá vão os pais, em sofrimento, atrás de um diagnóstico que comprove que a escola está certa, embora estejam, interiormente, torcendo por um diagnóstico menos sombrio. Numa grande maioria de vezes, vemos a imprecisão da escola em diagnosticar sem conhecimento profundo no assunto e sem ser esta a sua especialidade.

Porém, mais triste do que isso, é o diagnóstico apressado de alguns pediatras que encaminham seus pequenos pacientes aos neurologistas ou psiquiatras, para uma avaliação mais acirrada, envolvendo ressonâncias magnéticas e demais exames, para verificarem os transtornos de comportamento acima citados.

Sofrem os pais, de ansiedade e medo. Sofrem os pequenos, pelos exaustivos e estranhos exames a que são submetidos, mediante de suspeitas infundadas. Parece que estamos vivendo uma fase em que todas as crianças ou são autistas ou são hiperativas, enquanto elas são apenas crianças e sentem necessidade de viver livremente explorando seus espaços e ritmos e movimentos, como deve ser com qualquer criança.

Nas consultas que antecedem aos exames de imagens já se discute o tratamento, sem antes saber o resultado. Triste ritual de condutas equivocadas. O que tenho observado é um volume de diagnóstico antecipado e um volume maior de ausência de desculpas diante das comprovações inexistentes e de uma doença não constatada: como se a pressa da medicamentalização fosse a regra máxima para sanar as questões em estudo.

E a escola, onde tudo começou, permanece no limbo, sem dar conta das suas tarefas básicas e sem melhorar o nível de conhecimento de seus docentes que insistem em psicologizar tudo e todo o processo educacional, quando deixa a desejar na sua tarefa primordial de alfabetizar os alunos. Sinais de modernidade não combinam com inconsistência na formação do docente, o que tem sido a tônica nas escolas da atualidade, onde o mais importante é o conteúdo e não o fortalecimento de seus alunos, tanto na aprendizagem quanto na formação humana. Lamentável, mas são sinais dos tempos…

Sabemos que, quando a criança se sente valorizada, dividindo seu tempo entre brincadeiras e jogos, ouvindo e contando histórias, tendo os pais ao seus lados, ativamente e não postados diante de um celular, enviando mensagens e postando suas alegrias no Instagran ou Facebook. Compartilhando seu tempo e seu dia com aqueles que precisam de zelo para se desenvolver, os pais exercem seus papéis com desenvoltura. Mas não é o que temos na atualidade.

Uma criança cujos pais se dedicam ao seu desenvolvimento será uma pessoa que conseguirá lidar com sentimentos, de maneira geral. O medo, a fúria e a tristeza serão vividos com certa segurança, sem causar maiores consequências; entender suas emoções e sentimentos ajudará a entender que é possível não estar todo dia bem, não é estranho sentir-se zangado ou assustado.

Assim vemos estas crianças caminhando para uma autonomia. A tolerância em relação às disputas familiares e escolares, além daquelas que a Vida proporá em seu percurso, será uma forma de atribuir valores positivos e possibilitar que se desfrute o mundo de maneira feliz e leve. Mas para isso há a necessidade da participação intensa dos pais, em seus momentos de relação familiar de atividade conjunta (se ainda houver!).

Os exemplos aprendidos em casa contam muito. Pais online durante todo o momento de vida familiar conjunta não podem reclamar de crianças hiperativas e distantes, em suas atividades: elas apenas refletem aquilo que vivem no seio de suas famílias. Aliás, estes pais plugados, na verdade, não reclamam, porque não têm olhos para seus filhos: enxergam apenas a telinha azul e interagem apenas com os amigos virtuais; os filhos são meros acidentes de percurso. Isto também são sinais dos tempos…

É desta forma que a ausência do carinho e da presença paternal constante levam a um distanciamento e agitação, para chamar a atenção de quem deveria estar atento ao desenvolvimento dos pequenos. Infelizmente as crianças de hoje disputam com o Tiktok com o Instaa atenção dos pais. Que fique claro que estas crianças perderão a disputa, porque o celular é muito mais importante que os filhos e as respostas às redes sociais precisam ser instantâneas e mais prazerosas.

Quando a escola se manifesta, a intuição grita e a correria aos médicos e especialistas se torna uma maratona sem fim, uma pretensa preocupação se avoluma e a vida segue, esperando por um fato novo para quebrar a rotina da vida online. Vale ressaltar que no mundo online estes pais são superatuantes e lideram o grupo dos ativistas, ainda que na vida real sejam apenas mais uma dupla despreocupada e desatenta com seus segmentos familiares.

Toda a resolução é dada pelo Google ou outro meio de informação, levando para seus círculos de amizade as informações reduzidas e de senso comum que ali são tratadas, como se estivéssemos diante de grandes tratados de medicina ou de qualquer outro assunto que seja o da vez. Cultura da inutilidade e casamento de fachada caracterização esta geração desinteressada pelos seus próprios filhos. Sim, existem exceções. Raras, mas existem.

Pensando nesta situação, como classifica-la? Trata-se de um momento difícil? É uma fotografia da sociedade atual? É algo passageiro? Então, este cenário assustador e alienado é um traço da cultura atual, diferente das anteriores que entendia da necessidade do saber e do sentir: a pós modernidade nos facilita o conhecimento raso e a ausência da empatia, ainda que pareçamos cultos e empáticos.

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AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.

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