O bairro do Anhangabaú é tão importante para a cidade porque foi a primeira porta de entrada e saída, depois da criação das rodovias, através do trevo da Avenida Jundiaí. A via Anhanguera dividiu o bairro que fazia parte da Serra do Japi. Os outros acessos e rotatórias construídos posteriormente são coadjuvantes.
Mas, nem sempre foi assim. No começo da “civilização”, o Anhangabaú foi um lugar rejeitado, pelos ditos cidadãos de visão que na verdade sofriam de vista curta. Ele desprezavam aquelas terras por causa da topografia formada por morros cobertos de vegetação. Não quero provocar polêmicas, mas, os negros aceitaram conviver neste inóspito reduto e ganharam a alcunha de “criadores de cabras” porque segundo os entendidos, o que viria a ser o Anhangabaú só servia para isso.
Aqueles desbravadores não eram vistos com bons olhos e como sempre considerados inferiores. Chique era morar na Vila Arens, perto da Estação Ferroviária. Naquela época que os jundiaienses achavam que tinham parentesco direto e assimilavam hábitos e costumes dos ingleses. Havia até comentários jocosos do tipo, que as terras do Anhangabaú eram ‘lugar de preto’. E os cidadãos negros, indiferentes a todas essas bravatas de falta de educação e desconhecimento, não se fizeram de rogados e ocuparam aquelas plagas. Com bravura, força, obstinação, resistência e com seu colorido e jogo de cintura. Desenvolveram grandes coisas que tornaram a base para que o bairro chegasse no que é hoje. De aceitação com grande estima e consideração. Elegante. De proximidade com o Largo Santa Cruz, atual Praça da Bandeira, onde o Clube Recreativo e Beneficente 28 de Setembro existe desde o século 19(foto). Considerado um dos primeiros a serem fundados no Brasil para desenvolvimento social de “pessoas de cor”, os negros se uniram e também frequentavam a Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, vizinha da sede do Clube. Fiz primeira comunhão lá em 1958. O catecismo era com as saudosas dona Irene e dona Umbelina.
Tenho que reverenciar as famílias negras que minhas memórias analógicas e afetivas guardam e dar meu testemunho, porque vivi muitas dessas situações e participei ativamente da vida do bairro nos anos de seu desenvolvimento mais produtivo. Nasci em 1950, estudei no Instituto de Educação de Jundiaí desde o primário até o científico, o colegial da época. Frequentei muito o Ginásio de Esportes Dr. Nicolino de Lucca, o Bolão. Inclusive trabalhei nos Jogos Abertos do Interior e nas festividades no recinto da Festa da Uva.
Sempre morei na rua Barão de Teffé, onde meu avô Antônio Medeiros, tinha um terreno que equivalia a meio quarteirão e poderia ter sido considerado um “mini quilombo”. Toda minha família lá morava. Ele a esposa, os filhos, as filhas e genros e nora. Várias casinhas com pequenos quintais e hortas. Meu avô materno era boiadeiro e trabalhava no matadouro, na Vila Rio Branco, onde hoje é o Maxi Shopping. Ele tinha cavalos e desenvolveu qualidades de cavaleiro nos filhos que também se tornaram romeiros em peregrinações a Bom Jesus de Pirapora.
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Meu tio José Carlos Medeiros, o caçula da família, hoje com 92 anos, tem uma saúde de ferro, é lúcido e anda mais que um adolescente. Está vivinho da silva e pode endossar tudo que falo e escrevo. Existem outras pessoas quem sabem das histórias, que a partir de agora quinzenalmente estarei revelando aos poucos, para não assustar, nem interferir nos relatórios e narrativas dos nossos adversários.
Como disse Paulo Diniz, malandro é São Benedito que é crioulo mas é santo. Inclusive Nossa Senhora Aparecida conseguiu ser destaque nas escolas de samba muito mais que o Cristo do Joãozinho Trinta e da Virgem de Nazaré, que a Igreja vetou a participação(no ano de 1975, numa homenagem ao Círio ) na maior festa popular do povo brasileiro.
E para concluir, quando escrevi ‘os negros não se fizeram de rogados’, o corretor de texto não entendeu e escreveu “togados”, ainda bem que revisei e corrigi…

LUIZ ALBERTO CARLOS
Natural de Jundiaí, é poeta e escritor. Contribui literariamente aos jornais e revistas locais. Possui livros publicados e é participante habitual das antologias poéticas da cidade.
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