Queremos ir aos BARES. Mas, precisam estar abertos…

bares

É de conhecimento geral que nós, brasileiros, amamos socializar, trocar ideias e, se durante essa troca houver comes e bebes, melhor ainda! E qual é o melhor lugar para encontrar pessoas e consumir bebidas e porções? Os bares. Estes locais têm variações, podendo ser ambientes requintados, gourmets ou extremamente simples (o tão comum “risca a faca”). O fato é que todos nós, em algum momento, vamos entrar num deles.

Quando paramos para analisar, percebemos que esse tipo de estabelecimento está ligado praticamente a todos. Ao mesmo tempo que certo bar abraça o estilo de vida do senhorzinho aposentado do bairro que joga cartas, come mortadela com limão e bebe uma cachacinha, o bar também abraça a vida do jovem que, após uma semana toda fazendo trabalhos da faculdade e trabalhando, quer buscar liberdade na noite de sexta-feira, usar aquela camiseta nova que comprou e voltar para casa com histórias para contar. A verdade é que existem mil e um tipos de bares e propósitos para ir ao encontro deles, mas para que isso ocorra, precisamos deles abertos.

Desde que me mudei para essa região, percebo o quanto bares e casas noturnas navegam por águas agitadas: vejo o tempo todo novos espaços abrirem, mas vejo ainda mais eles fechando. Percebo também que esse fenômeno está permeado em diferentes grupos socioeconômicos, já que vi isso ocorrer dentro da Galeria Beco Fino ao mesmo tempo que vi na Vila Rami, por exemplo. É muito comum para nós na região criarmos um afeto por um lugar e após meses ou poucos anos o ver fechando, seja por dificuldade monetária, busca de regulamentação de alvará ou falta de público. Aliás, o alvará é uma grande dificuldade devido à Lei do Silêncio que está em vigor desde 1965 e interfere diretamente em espaços que funcionam após as 22h. Assim, bares que conseguem se manter são considerados resistência nessa cidade que claramente não se importa o suficiente com a diversão dos adultos. Talvez a prefeitura e a comunidade não tenham percebido que para existir uma “Cidade das Crianças” precisamos também cuidar de uma “Cidade dos Adultos”. Nenhuma criança mora sozinha ou é filha de chocadeira e nós, crescidos, precisamos também de diversão e diria até mais – precisamos urgentemente de espaços seguros para assim fazer.

Por consequência desse alvará necessário para manter um estabelecimento funcionando até mais tarde, vejo frequentemente clientes em grupos consideráveis, ainda consumindo, sendo convidados a se retirar do espaço quando ele está fechando em pleno sábado à noite e sinceramente já vi isso em diferentes tipos de lugar e com todo tipo de pessoa, do jovenzinho ao mais velho. Não culpo os estabelecimentos, já que conseguir esse alvará é muito difícil e poucos bares o têm, só fico descontente em um modo geral pela situação que todos nós enquanto munícipes temos que passar. É prejudicial para todos que buscam se entreter, a todos que veem um final de semana à noite como um espaço para socializar e desempenhar sua individualidade. Todos deveriam ter o direito de, após uma semana inteira agindo em modo automático e tendo dias estressantes, ter a oportunidade de usufruir de seu tempo livre, seja lá em qual tipo de estabelecimento essa pessoa quer estar.

Por essas questões já mencionadas, é frequente a sensação de estar vivendo o pico da noite quando alguém vem avisar que o bar está fechando. Dessa forma, é natural para alguém que está se divertindo se sentir relutante sobre ir para casa antes da meia-noite, e todos sabem que podemos nos tornar cabeças-duras se tivermos alguma porcentagem de álcool no organismo. Então nesse caso, o que acontece? Bom, acredito que você talvez já saiba: procuramos alguma loja de conveniência, ficamos em alguma praça ou, se tivermos sorte, somos convidados para terminar a noite na casa de algum amigo que pode nos receber. O problema maior está na necessidade de estar nas duas primeiras opções, já que nesses locais nem eu nem pessoas próximas de mim se sentem devidamente seguras.

Já me deparei com diversas situações que me fizeram refletir sobre quão importante é ter a oportunidade de se divertir em um espaço livre de grandes perigos. Uma vez, em uma das lojas de conveniência de posto mais famosas de Jundiaí, o segurança do estabelecimento não quis permitir que uma amiga minha usasse o banheiro. Nas palavras dele, o cabelo curto dela fazia ela parecer um homem e ele não tinha nenhuma obrigação de ser simpático na abordagem. Acontece que era uma mulher de um metro e meio contra um homem de mais de um metro e oitenta que, em teoria, deveria exercer o oposto do que ele ali fez. Outras vezes já fui parada em praças por pessoas fora de si e de atitudes também duvidosas, mas outra situação terrível para mim é a questão de, na falta de espaços acessíveis à noite, não termos sequer um banheiro para usar. Quantas vezes pensei que não merecia passar por essas coisas, ainda mais após uma semana trabalhando duro, ter que ser obrigada a me encontrar com amigos nesses lugares que eu, uma mulher LGBTQIAP+, não me sinto bem tratada.

Parece-me que Jundiaí ainda não se deu conta que desde 1965 (data de início da ‘Lei do Silêncio’) muita coisa mudou. Hoje, nosso espaço não é apenas uma cidade dormitório e atualmente encontramos no contexto nacional um crescimento exponencial no empreendedorismo. Temos muito mais cidadãos interessados em iniciar o sonho de ter seu negócio próprio e muitos deles são cervejarias, bares e casas noturnas. A dificuldade em toda essa situação não é apenas para clientes, é também para os proprietários que aplicam dinheiro e criam expectativas de ter sucesso profissional. Ao abrir e dar início, de cara se deparam com diversos processos ultra burocráticos e, por consequência, sentem uma apreensão iminente de talvez não conseguir resistir. No fim das contas muito é afetado: cidadãos perdem, estabelecimentos perdem, trabalhadores desses bares perdem, motoristas de aplicativo perdem e é claro, a cidade perde.

“Quem quer dá um jeito”, é como dizem. Dentro desse contexto não é diferente, já que quem quer se divertir e viver experiências noturnas dignas vai frequentemente para Campinas ou São Paulo, e assim fazem com que o dinheiro (muitas vezes conquistado aqui na região) vá para essas outras cidades. Por isso Jundiaí, um local que embora tenha tanto potencial, fica a ver navios. Quem não consegue ir para esses polos de vida noturna também ficam, já que não é tão barato assim se locomover para eles quando não se tem carro e cidadãos com renda mais baixa encontram imensas complicações na hora de se divertir à noite.

UTROS ARTIGOS DE ANNA CLARA BUENO

ESPAÇOS COLABORATIVOS

TRANSFORMAR…

ARTISTAS PERMANECEREMOS…

CELEBRAÇÃO PELA VITÓRIA DOS ARTISTAS INDEPENDENTES LGBTQIAP+

Precisamos com urgência entender quais são as maiores questões a serem reajustadas e, para isso, precisamos de um diálogo entre moradores da região, empreendedores e forças políticas, porém isso é algo que tem que ocorrer de cima para baixo: as figuras de poder da região têm que se mostrar abertas a isso. Precisamos que os vereadores e o futuro prefeito de Jundiaí se mostrem interessados em ouvir o que nós temos a dizer. Não podemos mais normalizar esse fluxo exorbitante de bares e restaurantes o tempo todo abrindo e fechando, pelejando para conseguir lidar com todas as burocracias que tornam tudo mais inacessível ao mesmo tempo que lidam com todas as outras dificuldades complexas que esses espaços já possuem naturalmente. Além disso, precisamos falar mais sobre isso, cobrar mais dessas pessoas que comandam o nosso lar, para que todos tenham a possibilidade de viver plenamente aqui, consumindo entretenimento e cultura localmente. Ao votar em outubro, pense em quem estaria ao menos aberto a nos ouvir de fato, e quem se importa conosco a ponto de considerar também nossa vivência, não apenas nossa sobrevivência.(Foto/montagem: Anna Clara Bueno – Fonte: Google Maps)

ANNA CLARA BUENO

De nome artístico Anubis Blackwood, é drag queen, artista performática e visual, professora de inglês, palestrante e produtora cultural. É membro do coletivo Tô de Drag, o primeiro de arte drag de Jundiaí e região. Colabora com o ‘Grafia Drag’, da UFRGS. Produz o festival Drag Vibes em colaboração com o coletivo, para democratizar a arte drag, mostrar sua versatilidade e levá-la a espaços e públicos novos por meio de performances plurais e muito diálogo.

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