A hora da cirurgia aguardada desde o meu nascimento havia chegado. Impossível imaginar o coração dos meus pais. Veio a maca. Eu fui e a mamãe ficou no quarto. Lembro-me do frio. A equipe da maca conversava comigo. Entramos num elevador muito grande. Desceu. Mantive a conversa e não chorei. Ao escrever a boca do meu estômago se comprime. O anestesista falou comigo. Senti a picada. Algumas palavras… e mais nada.
Lembro de uma voz dizendo “fique quieto, você foi operado”. Acordei no quarto com a cabeça envolta em ataduras e sem travesseiro. Tinha que ficar deitado de costas todo o tempo. Minha avó Paulina ficou com minha mãe como acompanhante. Foi a primeira vez que ela deixou sua casa. Meu pai vinha todos os dias. Muitas visitas. Muitos chocolates. Tia Ivone, de Campinas, sempre presente. Neide, uma prima de papai também. A história dela espero, um dia, contar aqui.
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Dr. Mais vinha de maneira rápida, passando de quarto em quarto, ladeado por uma equipe de enfermeiras compelidas a serem muito ágeis, para poderem fazer os curativos e acompanhar o médico.
A comitiva invadiu meu quarto. Minhas ataduras e o tampão foram retirados.
Dr. Mais foi para os pés da cama e gesticulava estalando os dedos: “Você está enxergando?”, perguntava. Em seguida estalava os dedos. Eu não sabia o que seria enxergar. Entendi que não. Senti que eu deveria chorar. Ele me mandou olhar para baixo. Também não sabia fazer isso. Sai do hospital 22 dias depois. Meu pai me disse que a cirurgia poderia demorar alguns dias para fazer efeito.
Retomei minha vida. Escola, brincadeiras… O efeito não veio. Eu e meus pais seguimos em frente, deixando para traz a profecia do médico de que aos oito anos eu faria uma cirurgia e enxergaria.(Foto: Vidal Balielo Jr/Pexels)
JOSÉ AUGUSTO DE OLIVEIRA
Formado em Psicologia na Universidade São Francisco (USF) e Psicanálise pelo IPCAMP(Instituto de Psicanálise de Campinas). Atua no AMI (Ambulatório de Moléstias Infecciosas da Prefeitura de Jundiaí) e em consultório particular. É deficiente visual. WhattsApp: (11) 982190402.
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