Ah, a DESPEDIDA…

despedida

E está chegando o final do ano, momento propício para as despedidas: adeus àquilo que não foi conquistado, uma despedida daquilo que apenas se idealizou ou, ainda, aquele tempo que se dá para se conquistar o objetivo proposto sem esperança de atingi-lo. Sempre há uma suave dor quando nos colocamos partícipes de uma despedida. Sempre…

É para se pensar o porquê este momento é mais propício para as dores de uma despedida: talvez por vermos partir um ano em que tivemos muitos sonhos projetados e poucos deles serem atingidos. Esta magia dos rituais, e a passagem do ano é um dos rituais mais marcantes na Vida de todo mundo, nos aflora desejos que talvez nunca serão atingidos, resultando na despedida desta ilusão. É a forma de repaginar nossas Vidas e nossas intenções futuras.

O final do ano escolar está entre as grandes despedidas: um até logo, um até semestre que vem ou até ano que vem. Mas virá? Esse é o lance das despedidas: o improvável. O desconhecido faz com que a despedida assuma um lugar diferenciado na Vida dos que participam dela; se por um lado há esperança no retomar, no recomeçar, por outro lado há a possibilidade do inesperado se fazer presente e findar por ali a amizade, o companheirismo, a parceria. Uma simples despedida de final de ano, de final de semestre.

Quantos não foram os amigos que se desgarraram na virada do semestre? Quantos não foram os parceiros que mudaram de bairro, de cidade, desistiram da escola e nunca mais se viram? Não houve uma despedida formal, nem um adeus: houve um até logo, até breve. E o breve nunca se concretizou. Lembremos de nossos professores que, ao retornar do semestre, já não estão mais em nossas escolas, por motivos vários; e esta despedida, quando se dará?

Lembro-me que, na infância, muitos vizinhos mudavam de cidade e de estado, até, e lá se iam meus colegas de brincadeiras, de jogos, de estudos, sempre na ilusão de um dia nos reencontrarmos, de modo que a despedida nunca era formalizada, mas idealizada com a possibilidade de um “vou te visitar” ou “pede pro seu pai te trazer aqui”. Nem sei se digo que não sentia a dimensão da despedida e da dor que ela ocasiona, mas diria que havia algo mágico naqueles momentos de desligamento.

Sim, desligamento, porque quando se estabelece o vínculo, cortá-lo ou quebrá-lo cobra um desligamento interior, visto o fato que se passa horas pensando e rememorando os bons momentos (os maus, também) além de estarmos sempre aprontando a lista do que contar, no reencontro. Essa magia é uma das situações fortalecedoras dos seres que se despedem…

Antes de avançar, vamos refletir sobre esta situação: a despedida só ganha notoriedade pelo processo do desligamento que ela estabelece. É posto que cada despedida principia um afastamento, um desligamento, uma ruptura da ordem existente, que terá uma magnitude estrondosa, dependendo do vínculo criado entre as partes, em momentos outros.

As despedidas não se prendem apenas às situações de mudanças de endereço, de mudanças de cidade ou países; as mudanças de parcerias, sejam elas do tipo que forem, são mudanças que causam grandes ebulições afetivas e emocionais: romper um namoro, terminar um relacionamento, perder uma pessoa próxima ou um pet. Tais despedidas assumem um caráter definitivo e deixam marcas que nem imaginávamos que existiam.

Nestes casos, acredito que a despedida se faz aos poucos, lentamente. Uma mentira aqui, uma dissimulação ali, uma inverdade lá e um vacilo acolá já são pequenos traços de despedida, visto que ao sentir afeição por alguém, nenhum destes comportamentos cai bem e se torna aceitável. Então, a despedida se materializa a cada “pisada” destas, nos relacionamentos interpessoais.

É claro que alguns relacionamentos recebem maiores atenções; um casamento em que temos filhos envolvidos é algo de uma seriedade absurda, ainda que vejamos muita traição e muito descompromisso (que fica por conta da formação moral de cada um, sem juízo de valores), a traição de um amigo é algo inegociável, quando trata de alguém de alguém muito querido e muito “confiável”. Seria um corte na carne. Dor psíquica inenarrável.

Mas, contrapondo, temos a Morte. Ah, esta despedida…

A Morte consegue abalar todas as estruturas humanas, deixando nosso psiquismo fragilizado e irreconhecível: em algumas vezes, superamos com brevidade, pois o sofrimento do ente querido era demasiado e morrer seria aliviar suas dores, mas existem outras mortes que nos surpreendem e desorganizam nossos domínios afetivos, cognitivos e até psicomotores:  tiram-nos a sequência de nossa Vida. E, neste caso, não são somente as despedidas de nossos semelhantes: nossos pets, ao partirem, levam junto de si uma parte de nossa história e dificultam a continuidade imediata de nossas Vidas, pensem nisso. Lembrem-se de suas perdas e verifiquem o vácuo que nossos parceirinhos deixam, nestes casos.

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E tem aquela despedida, a da ultima vez. A que todos não queremos pensar e nem lembrar porque é dolorida apenas de pensar, caso já tenha vivido, lembrar do ultimo olhar, da última conversa, da ultima oportunidade de tocar é algo de rasgar nosso coração. Desconcerta e enfraquece, por um tempo, até que nos fortalecemos e nos aprumamos. Voltamos a viver numa velocidade lenta e numa forma diferente, mas vivemos.

Qualquer despedida fica de marca para a Vida, porque será sempre um divisor de águas, assim como a despedida mais dura deixa marcas mais profundas, a mais leve faz seus estragos, sim. Temos milhares de marcas que jamais apagaremos, pois nossa memória seletiva as armazena para que sirvam de exemplos, ainda que tragam dores. E trazem muitas dores, em forma de saudades, de mágoa, de vazio, de esperança. Ah, a despedida...(Foto: Cottonbro Studio/Pexels)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Leciona na Faculdade de Psicologia UNIANCHIETA. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.

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