Não há dúvidas que os principais indicadores da expansão urbana são as edificações, se espalhando em áreas de solo já degradadas ou retirando matas e florestas. Nessa paisagem urbana de concreto acende-se uma luz verde, apontando para uma maior sustentabilidade da cadeia produtiva do concreto, e assim, menor impacto ao meio ambiente.
De que é feito o concreto? Que impactos causa a extração de seus componentes? Qual a situação dos mercados brasileiros e mundiais? E, por fim, que luz é essa e quem a traz? Vamos falar um pouco de tudo!
O concreto é uma mistura equilibrada de cimento, areia, brita (pedras) e água, e apesar de não ser tão resistente quanto outros materiais, como o aço, tem enorme popularidade no mundo inteiro. Isso devido a ser fácil de produzir, manejar e transportar, também em pequenas quantidades; durável, de baixo custo e disponível em locais próximos à demanda, além de ser de largo uso em qualquer tipo de construção e alvenaria.
Pra se ter uma ideia, os romanos há mais de 2.000 anos já sabiam como fabricar o concreto, o utilizando de forma pioneira em aquedutos com a vantagem de ser altamente resistente à água, evitando as infiltrações. No entanto os egípcios vieram antes: eles já exploravam a rocha calcária, fonte do cimento, na construção de monumentos e túmulos faraônicos, e suas pirâmides, como a de Quéops, ponto turístico até os dias de hoje.
O mercado mundial de cimento encerra números fabulosos, movimentando cerca de U$250 bilhões de dólares/ano. Tem-se a HOLCIM (Suiça), com capacidade de 218 Mt/ano (ou seja 218 milhões de toneladas ao ano), seguida da francesa LAFARGE, 217 Mt/ano (dados de 2012 do cimento.org). No entanto nada é comparado com a gigante China, que responde por mais de metade da produção e do consumo mundial, com abastecimento pelas industrias locais, como a estatal chinesa CNBM (China NationalBuilding Material), com capacidade de 343 Mt/ano, fazendo poeira nas demais.
Quer mais? Pode sentar. A China usou mais concreto em três anos que os Estados Unidos da América em todo um século. Como? De 2011 a 2013 os chineses empregaram 6,6 gigatoneladas (gigatonelada é 1 bilhão de toneladas, viu?) em suas construções enquanto dos EUA usaram 4,5 gigatoneladas, só que de 1901 a 2000. Sentiu o drama?
As estatísticas brasileiras são mais modestas, mas nem por isso menos relevantes: a Votorantim se posiciona no 10° lugar no ranking mundial, com as chinesas; sem elas, ocupa o 7° lugar e há cerca de 24 grupos cimenteiros atuando no Brasil.
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Números extraordinários de consumo e demanda correspondem a outros em igual proporção de extração do calcário, impactando sobremaneira toda a cadeia produtiva, de forma direta e indireta. Apenas para elencar alguns desses impactos, temos os desmatamentos; as áreas erodidas;os problemas do passivo ambiental quando determinada cava de mineração é desativada; o impacto visual das minas a céu aberto, alterando radicalmente a paisagem original, como na imagem de abertura deste texto.
Acrescente-se a poluição atmosférica, com a movimentação das máquinas e caminhões; visual e sonora, devido às explosões na rocha, e o assoreamento do leito dos rios existentes, espalhando os resíduos a quilômetros de distância das minas e afetando a fauna e vegetação existentes. Assim como elas, também são afetadas a comunidade do entorno, muitas vezes em ocupação desordenada e falta de infraestrutura básica, resultando em má qualidade de vida, inclusive de saúde, afetada pelos resíduos inerentes às atividades de extração do minério.
Vemos que esta atividade, por um lado altamente lucrativa, é também altamente geradora de impactos em todo o seu entorno. Temas que estão na ordem do dia das políticas ambientais mundiais tangenciam a indústria cimenteira devido à alta emissão de gás carbônico da sua cadeia produtiva, contribuindo para o aquecimento global.Neste quesito o Brasil toma à frente no uso de tecnologias modernas para a redução das emissões, hoje em torno de 610 kg CO2/tonelada de cimento, abaixo por exemplo da Espanha (698 kg CO2/ton), Inglaterra (839 kg Co2/ton) e China (848 kg CO2/ton).
Mas não é só: pesquisa brasileira, de ponta, acende luz verde para viabilizar a produção sustentável do concreto. É o que aponta Prof. Damineli, do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP (São Carlos/SP), que no seu estudo usou técnicas diferentes para diminuir os vazios entre os agregados que vão na mistura do cimento – quanto menos vazios, menos cimento é necessário.
Seus resultados apontaram uma redução de 75% da quantidade normalmente utilizada. “Nos testes de laboratório, esta redução fica bem alta, pois o controle sobre os testes e materiais utilizados é maior. Mesmo assim, na prática, pensamos que seja possível reduzir 50% sem diminuir a resistência do concreto”, afirma. Sua pesquisa tão exitosa e promissora renderam ao cientista o 1º lugar no Starkast Betong, em 2012, além do Prêmio Tese Destaque USP 2015.
Quem sabe daqui para frente possamos acreditar que é possível combinarmos o melhor dos dois mundos, do concreto e das flores?
Para saber mais: https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-exatas-e-da-terra/producao-de-concreto-sustentavel-avanca-em-sao-carlos/
ELIANA CORRÊA AGUIRRE DE MATTOS
Engenheira agrônoma e advogada, com mestrado e doutorado na área de análise ambiental e dinâmica territorial (IG – UNICAMP). Atuou na coordenação de curso superior de Gestão Ambiental, consultoria e certificação em Sistemas de Gestão da qualidade, ambiental e em normas de produção orgânica agrícola.
Créditos
Foto principal: https://bit.ly/2SSr9Vc
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