O MILAGRE do Direito

estagiário

No início da década retrasada, era estagiário no Escritório Pinheiro Neto Advogados e meu então chefe, hoje amigo, Dr. Werner Grau, mandou-me elaborar uma defesa em favor de um grande cliente. Era daqueles casos difíceis, em que o advogado deve se esmerar para obter êxito. Por isso estudei muito, até ter uma ideia que – com a falta de modéstia própria da idade – eu achei brilhante.

Empolgado como todo estagiário, fui contá-la a meu pai(o desembargador Cláudio Levada, recentemente falecido/foto). “Pai, tenho um caso impossível mas tive uma ideia brilhante!”. Ao que ele me respondeu: “está errada”. “Mas pai…”. “Está errada, a ideia está errada”. Indignado, retruquei: “mas pai, você nem ouviu a ideia ainda! Como você pode dizer que está errada uma ideia que nem sabe qual é? Deixe pelo menos dizer qual é!”. Ele consentiu e então a expliquei – com orgulho, inclusive. “Meu filho, a tese é correta do começo ao fim, mas está errada. E está errada porque, apesar de não conter erros, o Direito não pode conduzir ao absurdo. No Direito não há milagres”.

Nessa conversa, ele daria uma grande lição a mim, um estagiário em começo de carreira. Não podemos buscar vantagens onde elas não existem. Tudo deve ser resolvido com parcimônia e buscando o meio termo. Sem ideias mirabolantes. No Direito não há milagres – e como seria bom se todos lembrassem disso!

Eu, admirado com a sabedoria, disse então: “pai, você tem que ser Ministro!”. Ao que ele respondeu: “não serei Ministro”. “Mas pai, você não quer ser Ministro?”. “Não quero, meu filho, não quero. Não quero porque, para ser Ministro, nesse momento eu teria que estar em Brasília bajulando alguém. E eu prefiro estar aqui com você”.

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Nessa segunda parte da conversa, ele me daria outra grande lição. Que o grande milagre está nesses pequenos momentos da vida. Na admiração do filho pelo pai, na vontade do pai de ver seu filho crescer. Está num sorriso, na primavera, nos netos, na amizade, na música e em tudo o que é belo. Em tanta coisa que vivemos sem nem perceber.

Em nossa última conversa, horas antes da morte dele, discutíamos qual afinal seria o sentido da vida. E ele então lembrou uma frase de Contardo Calligares: “o sentido da vida é a própria vida”.

Obrigado, Cláudio Antônio Soares Levava, pelo privilégio de termos trilhado juntos o caminho da vida. Esse milagre. O verdadeiro milagre. Feliz Natal!

FILIPE LEVADA

É juiz de Direito

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