Ano que vem, escolha o que NÃO FAZER

não fazer

Chegamos em dezembro, nos aproximamos da passagem do ano e, como é muito comum de ocorrer, traçamos planos para o ano seguinte. Lembro-me que, no mesmo período do ano passado, percebi que havia extrapolado na quantidade de trabalho e estudo que escolhi me submeter, terminando o ano esgotado e adoecido. Assim, no lugar de planejar coisas para eu fazer em 2024, meu movimento foi inverso: decidi escolher o que não iria fazer. Atordoado pelo cansaço, convicto de que precisava fazer boas escolhas se quisesse melhorar a minha saúde mental, escolhi coisas para não fazer.

E olha que eu estava cheio de planos. Por exemplo, queria iniciar outra pós-graduação, participar de dois grupos de estudos simultaneamente, produzir conteúdo para minhas redes sociais, ampliar o meu trabalho na clínica, seguir com o trabalho voluntário etc. O fato é que eu não fiz outra pós, não participei de dois grupos de estudo ao mesmo tempo, não produzi todo o conteúdo que imaginava criar, enfim, deixei de fazer muita coisa em 2024.

Por outro lado, pude fazer coisas que não tinha tempo ou disponibilidade emocional. Cozinhei mais para a minha família, retomei as atividades físicas, li mais, fui mais contemplativo e dormi sonos reparadores. Isso prova que, por mais que haja um sistema que nos condiciona fortemente a sermos produtivos e competitivos o tempo todo, ainda assim é possível escapar à corrente.

Não é uma tarefa fácil nesses tempos de ciberespaço, hiperconectividade e compromissos sobrepostos. Estamos sobrecarregados e atravessados por demandas que nem sequer escolhemos. Elas simplesmente se impõem quase como a cena do passageiro de metrô, que no horário de pico entra no vagão sem perceber. Quando se dá conta já está dentro, apertado, sufocado.

Escolher o que não fazer envolve privilégio e coragem. Privilégio uma vez que, em um país tão desigual, a grande maioria das pessoas simplesmente não tem escolha, que não a pura sobrevivência. E coragem, pois em tempos de hiperprodutividade e competitividade exacerbada, mesmo quem pode escolher fazer menos, também opta por fazer mais e mais.

A escolha de coisas para não fazer permite deixar um espaço vazio, não deve ser preenchido por outro compromisso ou tarefa. Não se trata de uma troca, mas simplesmente de proporcionar espaços vagos, gerando tempo livre para a contemplação. Se for preenchido por algo, que seja pelo silêncio, pela percepção do momento presente, nada de passado, nem tampouco de futuro. O sociólogo italiano Domênico De Masi chamou esses momentos de “ócio criativo”. O pediatra e psicanalista inglês Donald Winnicott, de “espaço potencial”.

O maior ganho ao escolher o que não fazer vem das trocas entre “Chronos” e “Kairós”. Na mitologia grega, são deuses que personificam o tempo, representando duas formas diferentes de vivê-lo. Chronos significa o tempo cronometrado do relógio, do passar das horas, dos minutos, enquanto Kairós é a qualidade do tempo de vida, através dos anos, das décadas. Em psicologia, o tempo Chronos está relacionado com o nosso ciclo circadiano, que dura 24 horas, já o tempo Kairós relaciona-se com o ciclo vital, que vai do nascimento à morte.

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A relação é a seguinte: quanto mais coisas escolhemos fazer dentro do dia (reduzindo horas de sono ou fazendo duas coisas ao mesmo tempo), pior será nosso ciclo vital. Operar nesse registro empobrece a experiência, acomete a saúde mental e subtrai anos de vida.

Dessa forma, se não der para começar o tão desejado curso de violão porque trabalha e estuda (tempo Chronos), quem sabe dará certo quando a faculdade terminar (tempo Kairós). Enquanto isso, aquela horinha que você pretendia “encaixar” o violão, melhor abrir mão, relaxar e manter a saúde.

Então é isso, você já pode começar o exercício: que tal uma lista de coisas que você pretende não fazer em 2025?(Foto: Cottonbro Studio/Pexels)

MARCELO LIMÃO

Sociólogo, psicólogo clínico, especialista em “Adolescência” (Unifesp) e “Saúde mental no trabalho” (IPq-USP). Colaborador no “Espaço Transcender – Programa de Atenção à Infância, Adolescência e Diversidade de Gênero”, da Faculdade de Medicina da USP.  Instagram: @marcelo.limao/Whatsapp: (11) 99996-7042

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