Nunca gostei muito do termo parceiro. Sempre fui de usar e curtir mais a palavra amigo ou colega. Apostei, por um longo tempo, que colegas eram os parceiros, aqueles que não agregam nada, que não modificam nada e que pouco fazem para que sejamos felizes. Enquanto o amigo, ah… esse sim, mereceria nossa Vida, nossa atenção, nossa dedicação.
Por um tempo lecionei numa instituição que tinha vários parceiros, porém, era ela quem sempre apresentava o produto, quem propunha a ideia, quem fornecia a mão de obra e quem sempre ficava com nada, dos méritos advindos da parceria. Lembro-me que insistia em dizer que a parceria exigia um contrato de interação, em que cada parte doava e cada parte recebia os méritos. Porém, minha insistência foi vã.
E isso era motivo suficiente por eu duvidar do poder desta palavra. Relutava em adotá-la em meu vocabulário porque ela era descontextualizada. Entretanto quem sou eu para buscar contextualizar algo, cujos participantes pouco se preocupavam com os significados das coisas? E o tempo foi passando, fortalecendo moral, solidificando amizades, cumprindo com seu papel de higienista e tirando de nossa vida, algumas coisas e trazendo outras.
Esse, sim, é parceiro: o Tempo, senhor de tudo, sábio, forte, operante e hábil no trato das nossas alegrias e tristezas. Ele dá conta de nossos negócios, cuida da nossa vida, aponta-nos verdades que não queremos saber e explicita coisas que ocultamos de todos, menos do Tempo, o senhor do segredo. Poderoso, detentor de lógicas que não temos poder do conhecimento. O Tempo sabe. O tempo sempre sabe.
Mas, e os demais parceiros? Aqueles que encontramos no decorrer de nossa caminhada? O que surge de repente e nos assegura o acolhimento, a amizade, a tranquilidade? Como será que esta escolha é feita? Não, não é o destino, porque este não existe, mas são nossas escolhas, num determinado contexto e numa determinada lógica. Acredito que estas parcerias são oportunidades que temos e nos damos, para que possamos dividir um pouco de nós e receber um pouco do outro.
Ninguém vem completo, nem parte pleno: sempre temos e teremos algo a acrescentar, seja uma característica, uma ação, um pensamento. Às vezes trocamos de parceria, às vezes abandonamos algumas delas e outras vezes buscamos encontrar um par perto do perfeito, entretanto estes detalhes são contextuais: nem sempre dependem apenas de nossas escolhas, visto que um conjunto de situações circundam nossas ações e nossa imersão nestas ações faz com que tenhamos companheiros de trajeto. Então…
Muitas vezes encontramos quem nos acompanhe por um longo período da Vida; outras vezes, temos parcerias fugazes, mas o que conta é o valor destes relacionamentos, de modo que determinadas pessoas nos marcam para a Vida, ainda que o contato seja instantâneo, enquanto outras não deixam marcas, passam, apenas. O valor do parceiro é atribuído por questões cognitivas e afetivas. E até espirituais. Não basta um rostinho bonito ou um sorriso simpático, é preciso ter sintonia.
Tenho alguns parceiros desta natureza. Posso garantir que alguns estão perdidos no ciberespaço, só os encontro nas redes sociais, em momentos de festas, datas especiais ou troca de informações. Estes, também, são significativos. São importantes para mim, pelo seu valor pessoal e sua postura em minha vida; permanecem, mesmo que longe fisicamente, dentro de um espaço reservado aos queridos, ainda que on-line.
Outros me agregam valores a cada proximidade. Fazem-me feliz com suas presenças, seus cheiros, seus toques. Tratam da Vida, das relações interpessoais, das circunstancias com muita familiaridade, porque têm o poder de entrar em meu interior, visitar minhas memórias, compor minhas histórias e projetar novas rotas, juntas. Asseguram que nunca estou/estarei só. Arquitetam e edificam os sonhos e amenizam os pesadelos.
Tenho aqueles que me fazem viver num filme do Hitchcock, levam-me às raias da tensão, soltam-me do alto da mais alta montanha russa e assistem minha queda livre. Alguns destes já ocuparam uma das duas posições enunciadas anteriormente e, num vacilo meu, mostraram-se diferente daquilo que a aparência insinuava. Porém, asseguro: vacilo meu. Ninguém invade nossa Vida sem nossa permissão e a permissividade chega a destruir muitos de nossos espaços e sonhos, com nosso consentimento. Aliás, apenas com nosso consentimento.
Como disse, em crônica anterior, sou responsável pela minha depressão, porque vacilei e deixei o inimigo fazer morada em meus pensamentos, ainda que tenha lutado na expulsão do invasor e relutado para sofrer o mínimo, fiquei refém de situações inusitadas e doloridas, das quais não me alegro em pensar. Quando olho para isso, lembro-me da diferença entre o parceiro e o rato.
O parceiro divide espaço, organiza, cria, sonha junto. O rato se aninha em um canto, só sai no escuro, para sugar, deixa sujeira e restos em seu caminho e pode transmitir pestes indesejáveis. Parceiro é parceiro; rato é rato. E quantos ratos encontramos em nossa Vida! De maneira sorrateira eles chegam a povoar muitos momentos daquilo que nós acreditávamos ser ideal ou ser pontualmente aceitável. Sua lábia, sua ardilosidade, seu enredo maléfico não me deu pistas iniciais do grau de periculosidade com a qual estava me envolvendo
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Dizem que inhambu conhece inhambu. Não sei, mas minha intuição me sintoniza bem, apesar de vacilar as vezes diante do canto das sereias. Isso me faz enredar para a banda dos ratos, de maneira inadvertida; mas, ao reconhecer o vacilo, zarpo para longe deles e, de maneira bem defensiva, fortaleço-me para não me perder ou não facilitar outra abordagem inconveniente.
Diferencio assim, as relações interpessoais a que me associo ou vivo. Mas não posso me sentir o “alecrim dourado, que nasceu no campo sem ser semeado”. Vai saber quantas foram as vezes em que eu fui o rato? Quantas vezes eu estraguei projetos e sonhos? Ou que danifiquei e fui ácido na Vida de outros? Pois é…conversa para outro dia…..dia de analisar as transmutações.(Foto: blog.catclub.com.br)
AFONSO ANTÔNIO MACHADO
É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport
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