Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá

De repente nos pegamos a pensar em coisas que jamais imaginaríamos pensar. Hoje me peguei pensando na Morte. Mas não no morrer. Sei que soa estranho desatrelar uma coisa da outra, mas quando penso na Morte, penso em sua parceira, a Vida. E não penso no morrer. Ou no viver. Penso nela, com suas propriedades e suas consequências; daí sim o viver ou o morrer.

Será que apenas pessoas de certa idade têm estes pensamentos ou isso é algo comum aos humanos que desenvolvem certas preocupações diante da Vida? Será que isso acontece quando temos uma consciência espiritualizada ou o mais desencanados dos mortais se deparam com este estado de reflexão? É preciso ter perdido alguém para entender o significado da Morte ou assim como se tem a Vida se tem a Morte e basta?

Isso me intriga e minha curiosidade me faz perambular por todos os atalhos possíveis em busca de compreensão e discernimento; entretanto, parece que entro no campo da Filosofia e este espaço não é palpável o suficiente. Quero respostas objetivas, mais concretas, porque vivo na concretude das coisas e devaneios, por mais sérios que sejam, neste momento, me atrapalham as escolhas e as condutas.

Daí que, quando penso na Morte, penso no desalojamento que ela causa em nossas Vidas; não sinto firmeza nas atitudes que tomamos diante da eminência da Morte, nem na lucidez de escolhas que fazemos, ao perder alguém. Isso é mentira. Mente quem diz que tomou a atitude pensada, a atitude adequada; tomamos a atitude que cabia para o momento. Assumimos o caminho que se apresentava mais conveniente para a ocasião. Mas não o mais centrado. Não o mais coerente. Porque esta filha da puta desta Morte desconcerta a Vida de qualquer um.

Quer reconheçamos, quer não reconheçamos, a Morte é paralisante. Mesmo que eu acredite na Vida pós-morte, ela me rouba um alguém querido que deixa um buraco em meu peito e que borbulha em meu pensamento, com uma incontinência feroz. Mesmo que as lembranças sejam as melhores, no momento são doloridas e cheias de sofrimentos ímpares, pois são apenas imagens. Nada real, pois já se rompeu o vínculo carnal. Restou a ideação e a afetividade, no momento bastante comprometida, por sinal.

Entendam, com a maior das espiritualidades que consigo dispor e empenhar, não é coisa fácil de fazer ou sentir ou viver. Não consigo olhar para isso com olhar amoroso, com percepções de paz, com ternura: ainda me sinto lesado, me sinto roubado de um bem afetivo, sinto-me estraçalhado por este incomodo que chamam de luto e que eu chamaria de puta que pariu. É muita dor. É muita angústia. É muita agonia.

A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá

Na faculdade de Psicologia não tive aulas que me ensinassem a viver o luto. Não aprendi a trabalha-lo em mim. Em meu processoterapêutico busco desvencilhar e compreender o processo, de modo a mudar pensamento e humor, mas não estou dando conta, ainda, de cumprir com minhas tarefas, com exatidão. Dias excelentes seguidos de dias não tão excelentes têm sido minha marcha; ainda não atingi meu prumo e ainda não me dei conta de como fazer, apesar de buscar incessantemente este equilíbrio.

Noto que estou me fortalecendo, que já tenho entendimento de muitas coisas que rolaram nesse evento, meu humor está tomando caminhos seguros e adequados porém não sou mais o mesmo: a experiência foi um ritual de passagem que me desestabilizou, acredite eu ou não. Até me pergunto: cara, você passou por tantas, você enfrentou tanta coisa sozinho, como foi cair assim? Então…porque nas outras vezes eu não estava sozinho, sozinho….tinha, no mínimo, a Vitória para me acompanhar. Agora é diferente; agora é sozinho mesmo, de fato. É o zero absoluto. E eu me assustei com isso.

Curto a vida solo. Mas curto a vida solo numa sociedade que me acolhe e me reconhece. A Vida solo não é sinônimo de solidão: é traçar seus planos e edificá-los, com sua energia e intenção, sem depender de aprovação ou ajuda ou olhares externos. Portanto, isso não me assusta. Assusta-me saber só. Assusta-me sentir o vácuo que sobrou. Assusta-me não dividir minhas conquistas e derrotas com ela. Mas sou capaz de compreender a finitude, esta terrível lei da vida.

O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a saudade pra lá

Indo para outro espaço e tempo, numa de minhas passagens pelo elevador do prédio ouvi um diálogo que quase me endoideceu: ele diz para ela que o feriado era justo e apropriado. Ela olha com aqueles olhinhos meigos dizendo “fala mais more…” e o sábio diz que se a Princesa Isabel não tivesse libertado os escravos, eles ainda seriam encarcerados nas senzalas. Sai do elevador com a nítida certeza que não sou brasileiro e que não conheço esta parte da história, pois a República é uma coisa e a Libertação dos Escravos outra. No entanto, eu sou da turma dos velhos. Vai saber se a História do Brasil não mudou e eu não me atualizei, não é?

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Afonso Antonio Machado é docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology. Aluno da FATI.


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