POETA NEGRO

poeta

Triste foi João da Cruz e Souza, o Poeta Negro, introdutor do Simbolismo na literatura brasileira. Mas também foi luminoso, musical, introspectivo, social. Nasceu filho de escravizados, em Nossa Senhora do Desterro, hoje Florianópolis. Criado pelos senhores da Casa onde nasceu, teve educação refinada e destacou-se como crítico da escola romântica então dominante no país. Em sua produção, um mundo de luzes e sombras delineia impressões. Sugere sensações e emoções profundas, ultrapassando o lirismo amoroso e épico que marcou o Romantismo.

A arte poética de João da Cruz e Souza pertence à escola simbolista que começou a se manifestar entre nós no decênio de 1880, mas que se instaurou decisivamente em 1893, quando o poeta publicou ‘Missal’, poemas em prosa e ‘Broquéis’, em versos. Usando os mesmos recursos de estilo, o Poeta Negro enfocou problemas sociais(como a escravatura) e o problema do negro, mas sempre calcado em suas vivências pessoais. 

O professor Aguinaldo José Gonçalves, de Literatura Brasileira e mestre em Teoria Literária, disse que a filosofia de composição no Simbolismo de Cruz e Souza, foram utilizados num caminho proposto pelo próprio poeta, por julgarmos ser o mais leal e também o mais condizente com o próprio mecanismo de criação. 

Arte foi o poema ‘Dispersas’, da obra ‘O livro Derradeiro”, publicado no dia 1º de janeiro de 1891, possuindo inúmeras variantes, a lição aqui reproduzido é a do autógrafo do Poeta Negro:

Como eu vibro este verbo, esgrimo e torço, tu. Artista sereno, esgrima e torce; emprega apenas um pequeno esforço mas sem que a estrofe a pura ideia force.

Para que surja claramente o verso, livre organismo que palpita e vibra, é mister um sistema altivo e terso de nervos, sangue e músculos, e fibra.

Que o verso parta e gire – como flecha que do alto do ar, aves, além derruba.

E como os leões, rua feroz na brecha da Estrofe, alvoroçados a cauda e a juba. 

Para que tenhas toda a envergadura de asa e o teu verso, de ampla cimitarra turca, apresente a lâmina segura, poeta, é mister, como os leões, ter garra.

Essa bravura atlética é leonina só podem ser artistas deslumbrados que souberam sorver pela rotina a luz eterna dos glorificados.

Busca palavras límpidas e castas, novas e raras, de clarões radiosos, dentre as ondas mais prodigas, mais vastas dos sentimentos mais maravilhosos. 

Busca também palavras velhas, busca, limpa-as, dá-lhes o brilho necessário, e então verás que cada qual corusca com dobrado fulgor extraordinário. 

Que as frases velhas são como as espadas, cheias de nódoa, de ferrugem, velhas, mas que assim mesmo estando enferrujadas tu, grande Artista, as brunes e as espelhas.

Faz dos teus pensamentos, argonautas rasgando as largas amplidões marinhas, soprando, à lua, peregrinas flautas, louros pagãos sob o dossel das vinhas.

Assim, pois, saberás tudo o que sabe quem anda por alturas mais serenas e aprenderas então como é que cabe a Natureza numa Estrofe apenas. 

Assim terás o culto pela Forma, culto que prende os belos gregos da Arte e levará no teu ginete, a norma dessa transformação, por toda a parte.

Enche de estranhas vibrações sonoras, a tua Estrofe, majestosamente. Põe nela todo o incêndio das auroras para torná-la emocional e ardente.

Derrama luz e cânticos e poemas no verso e torna-o musical e doce como o coração nessas supremas Estrofes, puro e diluído fosse.

Que as águas nobres do teu verso esvoacem alto, no Azul, por entre os sóis e as galãs, cantem sonoras e cantando passem, dos Anjos brancos através das alas.

E canta o amor, o sol, o mar e as rosas, e da mulher a graça Diamantina e das altas colheitas luminosas a lua, Juno branca e peregrina.

Vibra toda essa luz que do ar transborda toda vez essa luz nos versos vai vibrando e na na harpa do teu Sonho, corda a corda, deixa que as ilusões passem cantando.

Na alma do artista, alma que trina e agulha que adora e anseia, que deseja é que ama gera-se muita vez uma fagulha, que se transforma numa grande chama.

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O Poeta Negro fez estrofes! E após, na chama do amor, de fecundá-las e acendê-las, derramou lágrimas em cima delas. Lágrimas com as eflorescências das estrelas. Ele foi um mestre, o maior representante do Simbolismo, uma das fases da melhor escrita preta neste país que pouco reconhece o valor do pretagonismo, sem necessidade de clareamento. (Foto: Curta Arte & Educação no Facebook/Youtube)

LUIZ ALBERTO CARLOS

Natural de Jundiaí, é poeta e escritor. Contribui literariamente aos jornais e revistas locais. Possui livros publicados e é participante habitual das antologias poéticas da cidade.

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