Na área ambiental ainda perdura uma frase de efeito que pode ser empregada em qualquer situação, pois que sempre estará dentro do contexto ambiental, seja qual for a intenção do autor, qual seja, a necessidade de se proteger a fauna e a flora e se apelarmos para o eufemismo fica ainda pior: “vamos dar proteção aos bichinhos e a plantinhas”.

Essa ideologia ambiental, ainda que positiva para a efetiva proteção do meio ambiente como um todo, carece de análise mais profunda, visto que a demanda de produtos, bens, serviços em geral para atender uma sociedade consumista é cada vez maior e isso gera por consequência reflexos no meio ambiente, produzindo transformações, alterando ecossistemas dos mais simples aos mais complexos, entre outras. A necessidade de moradia, transporte, eletricidade, água, esgoto, enfim, é uma crescente para acomodar e atender a todos. O ganho de algumas classes sociais até meados de 2012, segundo empresas e institutos de pesquisa – ABEP – IBGE, etc., demonstram que é necessário aumentar a produtividade em todos os setores para se possa atender a todos. O Brasil tem uma população estimada em mais de 200 milhões de habitantes e ainda que a taxa de crescimento dessa população esteja em torno de 0,91% ao ano, contra uma taxa de 3.04% na década de 60, segundo dados do IBGE, é preciso buscar soluções para todos os problemas promover a qualidade de vida desse povo.

As mudanças e consequentes impactos ambientais decorrentes de atividades antrópicas ocorrem nos municípios, dos quais somente um pouco mais de 30% têm Plano Diretor, dos cerca de 5570 municípios com mais de 20 mil habitantes existentes no Brasil, segundo dados do IBGE – 2013, publicada em 2014. A questão que se levanta, portanto, é como buscar soluções para atender as demandas sociais sem que isso represente perigo de dano irreversível para o meio ambiente?

O Brasil tem um histórico ambiental de pouco se interessar pelas questões jurídicas de preservação, conservação, proteção e fiscalização ambiental. Quando em 1972 participa da Conferência das Nações Unidas para o meio Ambiente Humano, em Estocolmo, Suécia, adota postura de discordância dos termos propostos para a redução da poluição, uma vez que era um país em desenvolvimento e que os países desenvolvidos é que tinham essa obrigação. Ainda assim, a legislação ambiental brasileira foi se firmando ao longo da história, de forma fragmentada mas direcionada a esse ou aquele bem ou interesse ambiental.

Pode-se considerar que as primeiras manifestações em prol do meio ambiente ocorreram ainda no Brasil colônia de Portugal, através da Ordenações Afonsinas, que tipificavam crime de injúria contra a majestade o corte de árvores frutíferas, entre outras situações. Em seguida, as Ordenações Manuelinas também consideravam crimes ambientais a não preservação das abelhas na produção do mel, o abate de animais de forma a causar-lhes sofrimento, causar danos ou sujar as nascentes ao longo das estradas, enfim, algumas primeiras regras que passam a dar a ideia de proteção de alguns bens ambientais.

Para alguns doutrinadores, até a década de 30 o Brasil não demonstrava nenhum interesse em proteger o meio ambiente. Segundo o mestre Édis Milaré, o Código Civil de 1916, foi um dos primeiros diplomas legais a trazer valiosa contribuição ambiental, quando dispôs sobre algumas situações pioneiras envolvendo bens e recursos naturais, principalmente no quesito direito de vizinhança, além de algumas primeiras noções voltadas à ecologia. Os primeiros diplomas legais de caráter ambiental passam a surgir no início da década de 40, com a promulgação do Código das Águas, focando questões hídricas, regulando o uso de recursos hídricos; o Código de Pesca instituído pelo Decreto-Lei nº 794/38; o Código de Caça criado pelo Decreto-lei nº 5.894/43, dispondo sobre as primeiras regras de como deveriam ocorrer as atividades de caça de animais silvestres, portanto autorizada pelo Estado, somente regrada na sua forma de executar tais ações; o Código Florestal criado pelo Decreto nº 23.793/34, trazendo as primeiras regras sobre a exploração de recursos vegetais. Dessa forma, surgem os primeiros diplomas legais que passam a regular atividades envolvendo recursos naturais.

Com o advento da Política Nacional do Meio Ambiente, estatuída pela Lei nº 6.938/81, é deixada a visão fragmentária sobre meio ambiental e passa-se para uma mais complexa, geral na sua essência, abrangendo tudo o que se refere ao meio ambiente. Com a Lei da Ação Civil Pública em 1985, materializando a aplicação da política de meio ambiente estabelecida, a questão ambiental toma outros rumos e fica ainda mais abrangente o emprego da norma, atingindo tudo o que relaciona a responsabilização nas questões ambientais, sejam elas de natureza objetivas ou mesmo subjetivas, inclusive contra pessoas jurídicas de direito público ou privado. O Estado (União, Estados e Municípios), através de seus agentes, tem o dever e a responsabilidade de fiscalizar e proteger o meio ambiente em geral de forma séria.

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Com a Constituição Federal de 1988, dedicando um capítulo à parte somente para tratar das questões ambientais, praticamente quebra o paradigma de que o Brasil não se interessava pelo meio ambiente pois que agora esse tema estando inserido na Carta Maior do país, exige tudo o que se relaciona às questões ambientais devam ser respeitadas. Nesse sentido, a CF/88 traz uma possível solução para o questionamento inicial, ou seja, como atender as necessidades presentes e garantir as futuras, sem gerar danos ambientais? A resposta constitucional é a sustentabilidade, onde é preciso buscar soluções para atender as demandas presentes e futuras sem que isso represente perigo de degradação irreversível ao meio ambiente. A evolução, o crescimento, a transformação oriunda da utilização do bens e recursos ambientais é uma realidade e não se pode fugir disso. As demandas por qualidade de vida das pessoas é uma realidade. Proteger o bichinho e a plantinha, ainda que eufemístico, deve ser atendido e respeitado, mas sem a ingenuidade ambiental de que tudo será preservado e mantido intocado pelo homem.

DR. FERRAZJOSÉ ROBERTO FERRAZ

Ex-comandante da Guarda Municipal de Jundiaí; delegado aposentado da Polícia Civil; especialista e professor de Direito Ambiental.